O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras e instauram a desordem entre os dois campos.
Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem"; próximas, sempre.

domingo, 30 de abril de 2017

Direitos humanos do cassetete





Não o de ser rompido
na cabeça intransigente
de transeuntes que sem licença
andam pela cidade
como se as ruas não imitassem minha forma

Não o de ser quebrado
no corpo de militantes
como se eu também não tivesse um corpo
mais homogêneo, sem divisões
pois ele é todo repressão
perfeito, sem divergências,
tudo em mim
serve para a ordem

Não o de ser partido
na testa que ostenta vaidosa a si mesma
como se eu também não tivesse partido, o da ordem
e a ordem de hoje é partir

Não o de ser dividido em dois
no crânio de militantes
ao contrário deles
não tenho aberturas
como boca e olhos
portas de entrada para mim
ao contrário dos crânios
não sou oco por dentro
não sirvo de esconderijo para pensamentos
e outros instrumentos da desordem

Tampouco o direito de respirar por aparelhos
eu o dispenso, mesmo na minha atmosfera preferida,
a do gás lacrimogêneo
nunca me falta fôlego
é o Estado que não consegue respirar sem mim

Eu, o cassetete,
sou o verdadeiro titular de direitos humanos
porém nenhum daqueles

E sim, embora rompido por testas intransigentes,
detenho o direito humano da integridade
física pessoal política

Meu direito nunca foi cassado

Garantido
por
fardas
jornais
togas
e outros acessórios
menos íntegros do cassetete

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