O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras e instauram a desordem entre os dois campos.
Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem"; próximas, sempre.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Desarquivando o Brasil CLI: Um dossiê sobre justiça de transição e ditadura em tempos de exílio político

Saiu no fim de 2018 o número da revista InSURgência com o dossiê sobre Direito, Memória e Justiça de Transição, que organizei com Diogo Justino em nome do Instituto de Pesquisa Direitos e Movimentos Sociais [se a ligação estiver fora do ar, pode-se ler a enquete aqui:  https://t.co/LXWvwYjlfd]:


O dossiê com os artigos científicos sobre o tema contou com pesquisadores da Argentina, Brasil, Colômbia e Espanha: Aitor Bolaños de Miguel, Reyes Mate, José Antonio Zamora, Amanda Evelyn Cavalcanti de Lima, Luana Rosário, Amanda Salles da Silva, Amanda Cataldo de Souza Tilio dos Santos, Walkyria Chagas da Silva Santos, Camila Gomes de Lima, Janaína de Almeida Teles, Julián Axat, Angela Navia López e Sebastian Alejandro Garcia.
As resenhas, abrigadas na seção "Caderno de retorno", trataram de obras recentes sobre justiça de transição: "Entre os restos da ditadura e da democracia, de Edson Teles", por Renan Quinalha; "Como será o passado? História, historiadores e a Comissão Nacional da Verdade, de Caroline Silveira Bauer", por Lucas Pedretti.
A InSURgência compõe-se também de uma seção de documentos. Foram escolhidos alguns relativos aos crimes da ditadura, mas também aos crimes da democracia, com a manifestação do Coletivo RJ Memória, Verdade e Justiça, da Campanha Ocupa Dops e do Grupo de Filhos e Netos por Memória, Verdade e Justiça contra a "intervenção civil-militar decretada na segurança pública do Rio de Janeiro pelo governo golpista e ilegítimo", de 20 de fevereiro de 2018. De lá para cá, a situação piorou: o governo golpista não só chegou ao fim do mandato como se prolongou em setores do governo federal e do governo estadual de São Paulo. A intervenção serviu de palco para mais violências e para o crime político do assassinato de Marielle Franco, além de ter mantido o poder das milícias do Rio, mais poderosas do que nunca depois da temporada de intervenção.
Em 2018, a Constituição de 1988 comemorou tristemente 30 anos com a eleição de uma chapa que prometeu não a cumprir em vários pontos importantes; por isso, não poderia faltar uma proposta para a Constituinte: o "Projeto contra a tortura e a repressão política para a Assembleia Nacional Constituinte" foi elaborado em 1987 pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos. Não foi aprovado, infelizmente. Hoje, depois de a apologia aos crimes contra a humanidades ter sido premiada com o governo federal e outros cargos políticos, ele seria considerado subversivo. Esse documento, que não estava mais disponível, foi cedido por Crimeia Schmidt de Almeida.
Também da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, temos o "Comunicado ao Grupo de Trabalho de Perus (GTP) e ao CAAF", com o Grupo Tortura Nunca Mais-RJ e pesquisadores e militantes, de 17 de março de 2018, escrito por conta da identificação de um dos desaparecidos políticos que havia sido ocultado na Vala de Perus, Dimas Antônio Casemiro, e da falta de estrutura que estavam a sofrer as equipes de antropologia forense nesse trabalho de identificação. A situação possivelmente piorará, com a eleição para o governo federal de alguém que comete a indignidade de comparar familiares de desaparecidos (um problema que se mede em milhares todos os anos ainda hoje) com cachorros.
Da mesma Comissão e de diversas entidades, pesquisadores, militantes (sou um dos signatários, por sinal), do Brasil e do exterior, o "Manifesto onde estão os desaparecidos políticos? Estado de exceção ontem e hoje", lido em 31 de março de 2017 em ato realizado na faculdade de Direito da USP. O professor Gilberto Bercovici conseguiu o salão nobre para o ato, que cobrou esta dívida do Estado brasileiro. Abaixo, uma foto que fiz na ocasião: o público ergueu as fotos de mortos e desaparecidos políticos.


Também publicado pela primeira vez foi este "Ofício da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva” à Comissão Nacional da Verdade sobre os desaparecidos políticos", de 2014, assinado pelo presidente da Comissão, o deputado Adriano Diogo. Ele estava, bem como Amelinha Teles, na organização do ato do Manifesto lido na USP e na preparação do Comunicado antes citado. A Comissão Nacional da Verdade ameaçava deixar de fora, no relatório final que publicaria em dezembro daquele mesmo ano, desaparecidos políticos cujo estatuto já havia sido reconhecido. Foi um momento de tensão entre a Comissão Nacional e os movimentos e militantes que atuavam no campo da justiça de transição.
A Insurgência possui uma seção para textos literários relativos ao tema do dossiê, "Poéticas políticas". Os autores que atenderam ao chamado foram Fernanda Telha Ferreira de Castro, Priscila Figueiredo, Guilherme Gontijo Flores, Armison Rodrigues Pereira, Veronica Stigger e Micheliny Verunschk.
As  seções "Em defesa da pesquisa" e "Temas geradores" publicaram artigos e relatos de temas variados, e não foram editadas por mim e por Justino.
A revista conta com uma seção de entrevistas. Quero agradecer aos pesquisadores que responderam à enquete que organizei: "Direito, memória e justiça de transição: enquete com pesquisadores das comissões da verdade brasileiras". Nomeio-os aqui, separando-os por Comissão (alguns deles trabalharam em mais de uma, indico aquela sobre que responderam):

  • Comissão Nacional da Verdade (2012-2014): James Green, Orlando Calheiros, Pedro Benetti, Rafael Pacheco Marinho.
  • Comissão da Verdade do Estado de São Paulo "Rubens Paiva" (2012-2015): Maria Amélia de Almeida Teles, Maria Carolina Bissoto, Renan Quinalha.
  • Comissão Estadual da Memória e Verdade Dom Helder Câmara (comissão estadual de Pernambuco; 2012-2016): Joelma Gusmão.
  • Comissão Camponesa da Verdade (2012-2014): Eduardo Fernandes de Araújo, Sérgio Sauer,  Leonilde Servolo Medeiros, Regina Coelly Fernandes Saraiva.
  • Comissão da Verdade da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2012-2015): José Willington Germano.
  • Comissão Estadual da Verdade e da Preservação da Memória do Estado da Paraíba (2013-2017): Dmitri Bichara Sobreira, Yann Gomes dos Santos.
  • Comissão Estadual da Verdade do Paraná - Teresa Urban (2013-2016): Samara Feitosa.
  • Comissão da Verdade do Rio (2013-2015): Lorena Lucas Regattieri, Lucas Pedretti Lima.
  • Comissão da Verdade em Minas Gerais (2013-2017): Fernanda Nalon Sanglard, Marina Camisasca, Thelma Yanagisawa Shimomura.
  • Comissão da Verdade da UFES (2013-2016): Ayala Ayala Rodrigues Oliveira Pelegrine.
  • Grupo de Trabalho Juscelino Kubitschek - GT-JK (2014): Marina Ruzzi.
  • Comissão Municipal da Verdade de Juiz de Fora (2014): Fernando Perlatto.
  • Comissão da Verdade sobre a Escravidão no Distrito Federal e no Entorno (2016-2017): Júlia Conceição Berto.

Eu mesmo trabalhei para três comissões diferentes, sempre como pesquisador. Quando me apresentam, seja em meio jornalístico ou em acadêmico, as pessoas tendem a confundir-se e acham que fui "membro" de alguma delas. Nada disso. Em regra, aconteceu nas comissões uma divisão de trabalho bem clara: havia os membros das comissões, que eram indicados politicamente e que respondiam nessa condição pelas atividades; e havia os pesquisadores e assessores, que eram aqueles que faziam funcionar administrativamente essas organizações, órgãos ou entidades, e que realizavam as pesquisas documentais, de campo, as entrevistas, tomadas de depoimento.
Essa confusão habitual, uma entre tantas deste processo de construção social da justiça de transição no Brasil, inspirou-me a ideia da enquete. Em algumas comissões, podiam-se achar membros que também eram pesquisadores. Não era a regra, no entanto; houve até comissões sem pesquisadores, bem como aquelas em que alguns ou muitos membros, de tão ausentes, nem mesmo participavam dos atos públicos.
De qualquer forma, como a opinião dos membros dessas comissões foi documentada pela imprensa, quis ouvir esse lado que ficou na sombra, que é o dos trabalhadores da pesquisa. Mandei as questões para mais de cem pessoas, responderam-me vinte e cinco, de 13 comissões diferentes.
Perguntei sobre a principal dificuldade para a elaboração do relatório final e sobre o cumprimento das recomendações. Pois, se as comissões na pesquisa tiveram um olhar para o passado, elas também, no tocante à punição dos crimes, à reparação dos danos e à não repetição das graves violações de direitos humanos, bem como às reformas institucionais necessárias, fizeram recomendações para o futuro da sociedade brasileira.
É interessante ler as respostas pensando em como o Brasil optou pelo passado em 2018. O presidente eleito é arcaico até mesmo nas referências retóricas que faz em suas modestas falas, como a referência a área destinada a crimes contra a humanidade durante a ditadura militar (a "Ponta da Praia"), que se tornam o projeto mais discernível de um governo que começa, no primeiro mês, com um exilado político. Ele é Jean Wyllys, do PSOL-RJ, deputado federal que reagiu à inédita violência de Bolsonaro ter dedicado o voto pelo impeachment de Dilma Rousseff ao único torturador da ditadura que foi assim declarado pela Justiça brasileira.
Este episódio do exílio, bem como aquele de apologia à tortura envergonham o Brasil e ratificam a importância do tema da memória e da justiça de transição, tristemente atual e irresolvido, tanto para a pesquisa teórica quanto para a ação política.

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

Retrospectiva 2018: A tuitosfera bolsonarista e o fake news ontológico

No fim de 2017 escrevi aquela nota, "Filosofia política e robôs na internet: uma nota sobre democracia, notícias falsas, ilusões e políticas grosseiras", e infelizmente 2018 confirmou o que escrevi sobre a reação do Judiciário e o uso desses instrumentos na campanha eleitoral. As eleições deram também a resposta para o final da nota, em que perguntei, retoricamente, que tipo de político se beneficiaria disso.
Pensei em dizer que minha retrospectiva de 2018 já estava escrita lá, mas fazê-lo seria preguiçoso e pretensioso. Não repetirei nada do que escrevi antes, apenas compartilho o que eu, entre vários outros, observei na tuitosfera bolsonarista. Não pretendo que ela seja homogênea, porém, nos seus grandes momentos de atuação coletiva, ela age como um só; ademais, seu repertório de memes e lemas é muito pouco variado, o que achei que justificaria essa forma de tratamento.
Aconteceram muitos incidentes em outros espaços da internet; em julho de 2018 ocorreu uma das retiradas de páginas que violavam os termos do facebook; por alguma razão que me escapa, elas eram em grande parte da direita e apoiavam Bolsonaro, o que fez a campanha desse pré-candidato reclamar já nessa vez de "censura"; em outubro, falou-se muito do whatsapp, em razão do envio automático e maciço de mensagens, e da matéria da Folha de S.Paulo sobre as empresas que estariam financiando "por fora" a campanha de J. Bolsonaro na internet: "Empresários bancam campanha contra o PT pelo whatsapp".
Sei que há esses outros espaços. Não falarei deles por falta de fôlego. Contudo, eles foram refletidos pelo twitter; por exemplo, em 18 de outubro, os tópicos #caixa2dobolsonaro e #bolsolão, em razão do escândalo do whatsapp,  conseguiram ficar entre os dez mais discutidos do twitter no mundo; o primeiro deles chegou a liderar no Brasil e no mundo.


A tuitosfera de apoio a Bolsonaro reagiu com tópicos do tipo "sou caixa 2 do bolsonaro", e alguns deixaram fotografar-se dentro de caixas com o número 2 escrito. Nesses momento, via-se uma massa agindo como uma unidade. Não afirmo, obviamente, que essa tuitosfera seja controlada e/ou criada pelo presidente eleito, pois isso teria sido criminoso. Apenas observo as características comuns de pessoas e perfis com grau maior ou menor de automatismo quando estes agem como um só ator.
Não faço uma análise científica de nada disto, pois me faltam os instrumentos, tampouco repasso os acontecimentos mais marcantes, o que várias retrospectivas jornalísticas fizeram tão bem. Tendo em vista que o twitter foi importante antes, durante e depois da campanha, quando se tornou "canal oficial" de comunicação (o bloqueio que o presidente eleito fez de jornalistas do Intercept, escolhidos como inimigos do novo governo, comprova-o), creio que indicar algumas das características dos tuítes dos perfis engajados, e exemplificá-los durante o ano, poderia ser relevante.
Afora a família do presidente eleito, não citarei outros políticos eleitos. Eles demandariam notas próprias porque suas pautas não se resumem, em geral, a reproduzir o "programa" de J. Bolsonaro e, ademais, não sabemos por quanto tempo permanecerão aliados. Estavam realmente a apoiar, ou apenas pegaram carona na onda que acabou vitoriosa? Este ano de 2019 poderá revelar falsos aliados.

Um dos traços interessantes de 2018 foi o da internacionalização da direita e da extrema-direita. O apelo à união dos proletários de todo mundo foi copiada por este polo oposto do espectro político e deu alguns passos neste ano: o "Movement" de Steve Bannon na Europa ganhou adesão de Matteo Salvini em setembro de 2018. Perguntei sobre o assunto a Antonio Luiz M. C. Costa, que era o melhor especialista desses assuntos na Carta Capital, até que foi lamentavelmente despedido neste ano, e ele respondeu: "O fascismo atual é menos sobre nacionalismo, que é peculiar a cada nação, do que sobre racismo e xenofobia comuns a todos os países brancos e ricos". Daí fazer sentido uma "internacional" dessa corrente política entre esses países.
No entanto, ela faria sentido na América Latina? Imagino que apenas faria se representasse um movimento subordinado, creio, àqueles países "brancos e ricos"; no continente, a figura mais óbvia que tutelaria essa movimentação seria Trump. A realização da Cúpula Conservadora das Américas em dezembro de 2018, com participação de E. Bolsonaro, foi um sinal desse tipo de internacionalização que, de fato, não tem nada que ver com a ONU. Não há nada de incoerente em manifestar-se contra o Conselho de Direitos Humanos da ONU (neste tuíte de agosto, ele foi atacado por causa da decisão em prol da candidatura de Lula) e participar de uma mobilização internacional contra os direitos humanos sob a bandeira ou pretexto de combate à esquerda:


Esta é a agenda de Trump também, em que J. Bolsonaro assumidamente se espelha. Na tuitosfera bolsonarista, houve diversos gestos de genuflexão diante dos Estados Unidos. No ano em que esse país criou campos de concentração para crianças imigrantes, e houve quem morresse em custódia, tivemos, em junho, algo deste tipo: "Passei pela imigração hoje. Documentação toda correta. Trump "malvadão" não me separou dos meus filhos."
Já falei, naquela nota de 2017, sobre a aproximação com Trump e o Partido Republicano dos EUA. Aqui faço algo mais simples, quero lembrar das redes que os perfis bolsonaristas do twitter construíram entre si. Não tenho os instrumentos científicos para medi-las, porém posso notar sua variedade linguística. Os seguidores das arrobas de apoio a Bolsonaro incluem perfis que escrevem em árabe:


E outros idiomas orientais:




Vejam, já em maio, a diversidade linguística dos seguidores deste perfil de apoio a Bolsonaro que, no entanto, tuitava em português:


Apesar de todos os gritos contra o cosmopolitismo, o globalismo etc., inclusive oriundos da pena do futuro ministro das relações exteriores, vejam que a direita e a extrema-direita internacionalizaram-se tanto que até teriam aprendido português!
Infelizmente, o mesmo não se pode afirmar de grande parte dos tuiteiros brasileiros pró-bolsonaro, que tantas vezes demonstraram um fraco domínio do idioma, às vezes mesmo em tuítes que duvidavam da capacidade de leitura de Lula ou de Haddad... O antigo perfil de Queiroz, braço direito e depoistante de cheques da família Bolsonaro, já apagado (quem o quiser procurar nos arquivos da internet: @fjcqueiroz), era um exemplo disso, pródigo em grafias alternativas como "corrupito" e "concurço". Não dou exemplos porque ele só o alimentou até 2013 e foge ao escopo temporal desta nota.
Também perfis em outras línguas manifestaram apoio a Bolsonaro e suas promessas contra as minorias. Por exemplo, este, em francês, da extrema-direita:


Em espanhol, este com a promessa de erradicação da esquerda latino-americana:


Trata-se de tuítes de outubro. Não são mensagens do centro político, que, por sinal, esvaziou-se no Congresso Nacional com as eleições de 2018. O trabalho da grande imprensa de normalização dos discursos da extrema-direita contribuiu para este resultado, e figuras mais obviamente armadas tomaram o espaço da direita moderada.

A internacionalização dessa tuitosfera acompanhou-se de uma grande dinamização da direita e da extrema-direita em termos de militância virtual. Há diversos perfis capazes de tuitar 60 vezes por minuto, o que é de um engajamento formidável.



No minuto seguinte:


Em janeiro já se observava o fenômeno:


Um minuto depois, mais 60 tweets:


Mas não começou aí. Isso já ocorria pelo menos desde o ano passado, como eu escrevi naquela nota de 2017. Dou outros exemplos:


Um minuto depois:


Eu indaguei, pouco mais de anos atrás, se alguns desses perfis podiam ser automatizados. No entanto, mais interessante do que isso é notar que cada vez mais perfis humanos são parecidos com os autômatos, não exatamente por causa da melhor tecnologia de bots (o que inclui a criação digital de fotos e imagens), mas por causa do estreitamento do repertório linguístico dos humanos.
Aquela pergunta, no entanto, mantém atualidade especialmente em um ano eleitoral, tendo em vista as suspeitas de fraude e manipulação da opinião pública.

Essa tuitosfera foi tão dinâmica que até mesmo instituições oficiais seguiram perfis que fizeram campanha para Bolsonaro, como o Tribunal Regional Federal da 4a. Região, que, noto, condenou o primeiro candidato do PT à presidência da república - uma decisão que, sem dúvida, foi importante para os resultados das eleições de 2018:



Houve diversas denúncias de empresas, como a Havan, coagindo os empregados a votarem no presidente eleito. Muitas empresas, de fato, participaram dessa tuitosfera. Destaco aqui apenas este caso, por pitoresco, de este curso oferecer desconto de acordo com o número do candidato: https://twitter.com/ALuizCosta/status/1048598539893399552. O número do candidato do PSL daria um desconto do que o do PT...

Lamentável que uma tuitosfera tão grande, dinâmica e cheia de apoios se marcasse pelo rebaixamento intelectual e infantilização do debate público, como se a inteligência tivesse sido expulsa pela direita. Em janeiro, por exemplo, foi criado este, entre os incontáveis perfis pró-Bolsonaro que o apresentavam como super-herói:


Se a iconografia da direita foi diversas vezes lamentável, o texto, em geral, foi pior, com a repetição dos mesmos chavões para não importa que situação: "chola mais", "Lula está preso, babaca" (este, meramente copiado de manifestação de Cid Gomes), "e o PT?", "aceita que dói menos", "vai para Cuba Venezuela", "esquerdopata" e "quem mandou matar Bolsonaro?" etc.
Nisso, sua rede espelhava exatamente o candidato, com sua evidente dificuldade de leitura de discursos e a incapacidade de encadear ideias e, por vezes, de entender perguntas de entrevistadores. Nesse sentido, o atentado que lamentavelmente sofreu foi mesmo providencial, pois lhe deu o pretexto para não comparecer a debates, embora não se furtasse a falar com os meios de comunicação amigos (a Record, principalmente).
Como passou três décadas fazendo política sem ter conseguido aprender muita coisas, não creio que isso mudará no exercício do mandato. É claro que furtar-se ao debate público é antidemocrático, e que as redes sociais atendem a essa estratégia antidemocrática, pois se tornam principalmente bolhas. No whatsapp, em que se resume a itnernet para tantos no Brasil, a experiência pode ser simplesmente familiar ou doméstica. Sugiro a leitura do texto de Letícia Cesarino sobre populismo digital, que lembra que, segundo a simplificação do mundo nessas bolhas, "basta votar no presidente certo e esperar sossegadamente para que todos os problemas do país sejam resolvidos dentro de quatro anos". A decepção promete ser grande.
Vários perfis aparentemente não tinham nada a fazer senão reproduzir as mensagens de campanha. Este, aparentemente, começou a tuitar em janeiro de 2018, simplesmente encaminhando as mensagens do pré-candidato Jair Bolsonaro:


Quando ele começa finalmente a escrever, saíram balbucios e hashtags, tão só:


Talvez sejam códigos, fórmulas mágicas ou falhas de programação. De qualquer forma, escapa-se do debate público. Esse perfil não mais funcionou depois de 20 de outubro.
Se a pobreza lexical e a aridez da retórica denunciam claramente o rebaixamento do debate, as comparações descabidas, as falsas simetrias e os "argumentos" completamente impertinentes também tiveram seu lugar nos discursos da direita. Vejam que um deputado federal, decerto por completo desconhecimento da situação da segurança pública no Rio de Janeiro, acha que traficantes, quando matam negros, é por racismo, da mesma forma quando policiais tratam como suspeitos atletas que andam de táxi simplesmente por serem negras. Um tuíte de fevereiro:

No caso, esse político equivocado e, ainda por cima, reeleito em 2018, tentou diminuir o protesto da grande judoca brasileira, campeã olímpica e campeã mundial, Rafaela Silva. Trata-se de uma experiência de discriminação que vários negros no Brasil podem contar, ademais.
Não se podia esperar, de fato, nada a não ser nonsense quando um intelecto desse porte, em junho, tentou não naufragar nas águas tempestuosas da Teoria do Direito.


Não sei se Luigi Ferrajoli soube desse novo exegeta de sua obra, ou que ganhou o epíteto de "pai dos direitos humanos". Ele está muito bem conservado, faço notar, para alguém que deveria ter séculos de idade!
Este rebaixamento intelectual é a forma que restou para "fundamentar" as pautas da direita. O negacionismo climático, se não gerasse lucros para ninguém, certamente não existiria nem encontraria defensores na política defendendo-o a base do menosprezo a 99% da comunidade científica:


O ataque ao saber científico atinge diversas áreas, como a Antropologia, que se opõe aos interesses do agrobanditismo e da mineração no tocante às terras indígenas, a Ecologia, certamente, em razão desses mesmos interesses, e a Psicologia, especialmente no tocante à ideologia de gênero, homofóbica, transfóbica e machista, que é defendida pelos setores teocráticos. O absurdo deste tweet de fevereiro nasce da falsa simetria:


Imagino que o Conselho Federal de Psicologia, assim como a Associação Brasileira de Antropologia, sofrerão ataques do Executivo e do Legislativo. Mas a comunidade científica, como um todo, não será bem servida por esse governo, ao que parece.
O rebaixamento do debate também foi realizado pela direita por meio da estratégia de trocar os argumentos por xingamentos. Como esta referência ao cu por F. Bolsonaro, na época da denúncia ao Supremo Tribunal Federal do J. Bolsonaro por declarações racistas na Hebraica do Rio de Janeiro:


O STF rejeitou a denúncia, considerando que J. Bolsonaro estava protegido pela imunidade parlamentar. Na esfera cível, no entanto, ele foi condenado. O ano de 2018 acabou por trazer-nos mais uma prova irrefutável do racismo da cultura brasileira: alguém condenado judicialmente por declarações racistas encontrou votos em quantidade suficiente para vencer uma eleição nacional em segundo turno.
Não cito os candidatos da direita que fizeram da injúria uma grande arma eleitoral e que, agora, eleitos, estão fazendo o mesmo com seus eleitores, alguns dos quais já meio arrependidos (que ingênuos, no mínimo). Vejam que beleza já ficou esta busca no twitter: https://twitter.com/search?l=&q=cu%20from%3Aalefrotabrasil&src=typd [Ver nota abaixo]
Trata-se de outra modalidade de infantilização, mas, desta vez, por crianças mal educadas.
Lembro deste momento tão irônico, lembrando do que apareceria depois sobre Queiroz e outros assessores, de chamar o PT de "criminoso" por supostamente usar Fernando Haddad de "laranja":



Nesse campo, talvez o exemplo mais indigno tenha sido este, que reverberou por toda tuitosfera bolsonarista. O candidato referia-se a seu adversário fazendo uso da homofobia:


Até compreendo, tendo em vista um comum desprezo ao Brasil, que haja pessoas que sonhem que o país seja governado por pessoas desse tipo. O que me é incompreensível é pretender que o PT deveria ter aparecido nessa posse (ou "possession", segundo o inglês alternativo dos bolsonaristas).
Momento semelhante de indignidade, com a variação de chamar o candidato do PT de "prostituta", gerou uma discussão que leva a outra característica da tuitosfera bolsonarista:


Diversos vídeos e mensagens falsos ou equivocados (no caso dos distraídos e/ou analfabetos que tentaram votar em Bolsonaro no momento do voto em governador, por exemplo) de "fraude eleitoral" foram divulgados pelos bolsonaristas para tentar justificar por que a eleição não foi vencida no primeiro turno. Neste caso, um perfil de boa-fé tenta alertar outro de que está a divulgar um boletim de urna adulterado. O outro retruca que não vê problema nenhum em passar adiante a adulteração... O que nos leva a um dos pontos mais discutidos do ano, até porque se trata de uma das causas previstas em lei para anulação das eleições.

propagação de notícias falsas, ou uso estratégico de fake news, aconteceu em incontáveis momentos. Um dos mais absurdos aconteceu em março, quando milhares de notícias falsas foram veiculadas para caluniar Marielle Franco, recém-assassinada, no mais clássico estilo de culpabilizar as vítimas e de enlamear quem não pode mais se defender.
Alguns perfis de apoio a Bolsonaro (que não quis comentar o assassinato; aparentemente pensa que atentados políticos apenas são graves quando ele é a vítima) colheram a ocasião como estratégia eleitoral de combate à esquerda:


As notícias falsas da direita, além de difamar os mortos da esquerda, marcaram-se pela criminalização de movimentos sociais (tentando, por exemplo, igualar terroristas e pessoas em situação de rua) e de partidos políticos de esquerda. Vejam este deputado federal em maio, fazendo campanha a partir de desastres:


Em agosto, a fantasia infantil da URSAL, divulgada por Daciolo em um dos momentos de insanidade política que caracterizou 2018, acabou sendo também divulgada pela família B, talvez para não ficar atrás do outro candidato, como "plano de poder do PT":


Lembro agora da reação de Ciro Gomes ao candidato Daciolo quando este mencionou tal alucinação geopolítica, fantasma usado para atiçar a militância da direita. Depois, veio esta resposta da campanha de Ciro.
O assunto chegou em primeiro lugar no Brasil e chegou à lista dos dez mais discutidos no mundo pelos usuários do twitter em 10 de agosto:


Fernando Haddad foi alvo de diversas notícias falsas, a mais constante a do inexistente "kit-gay", jamais visto em escola alguma e presente quase que em todas as manifestações da campanha vitoriosa. Parece-me que algo tão absurdo somente pareceu crível porque se trata de uma fantasia alimentada pelo machismo e pela homofobia estruturais da sociedade brasileira. Para vários, o combate às minorias (uma promessa reiterada de J. Bolsonaro) misturou-se às promessas de linha dura no campo da segurança pública (mas delegando ao cidadão a própria proteção com o rearmamento...) no mesmo horizonte da promessa do extermínio.
Esses eleitores foram assim inspirados a realizar discursos e atos de ódio; vejam esta matéria da Pública sobre atentados cometidos por bolsonaristas, "Apoiadores de Bolsonaro realizaram ao menos 50 ataques por todo o país". Era o começo do segundo turno, mas a tendência não acabou nesse momento, pois a promessa da execução não deixa de ser reiterada, nem mesmo no ato simbólico da posse.
Voltando às notícias: as mulheres da esquerda que participaram das eleições foram vítimas preferenciais, como Manuela d'Ávila, naquele momento pré-candidata do PCdoB à presidência da república. Várias notícias falsas e montagens infames foram feitas com ela e sua filha, uma criança, que não reproduzirei aqui. Quero lembrar apenas de um dos momentos baixos do jornalismo nessas eleições, o programa "Roda Viva", na ocasião em que a sabatinou. Ela foi interrompida diversas vezes, e o programa decidiu chamar um colaborador da campanha de J. Bolsonaro como se fosse um entrevistador neutro. A pré-candidata manteve a calma todo o tempo, o que me impressionou. Um ponto que me pareceu particularmente baixo, e que se relaciona com esta nota, foi o da acusação feita por um jovem colunista de que ela fazia discursos de ódio nas redes (evidente caso de fake news). Ela lhe pede para ele apontar um exemplo de ela ter praticado "ódio nas redes". Obviamente ele não sabe dizer nenhum (tal é a qualidade desse jornalismo) e passa a interrompê-la para tentar impedir que ela responda (a ética jornalística também impressiona).
Entre as notícias falsas misóginas e machistas, vimos os tuítes com fotos absurdas para denegrir a campanha #EleNão, mobilizada especialmente pelas mulheres. Também não os reproduzirei; tampouco os da "mamadeira com piroca".
As notícias falsas não terminaram com a campanha. A tuitosfera bolsonarista parece ter percebido que sua mobilização terá que se manter. O método de campanha tentará tornar-se o método de governo, ao menos é o que o presidente eleito indicou em seus discursos de posse. Sua "fala foi um resumo de todos os tuítes postados por Jair Messias Bolsonaro (PSL)", como bem escreveu Igor Gielow na Folha de S.Paulo, "Discursos de Bolsonaro são coleção de tuítes temperada com messianismo".
Em dezembro, depois de Marco Aurélio ter decidido monocraticamente sobre a questão da prisão em segunda instância (teve a decisão revista pelo atual presidente do STF), esta foi uma das notícias falsas sobre ele divulgada:


A foto é de Ricardo Noblat, como se sabe. Esse é mais um dos perfis que nasceram em 2018. Este outro também teve uma intensa militância pró-Bolsonaro, por exemplo:


Ele foi um dos divulgadores de notícias falsas contra Miriam Leitão em outubro, depois de ela ter criticado, com razão, a ignorância econômica de Bolsonaro, que ela julgou impressionante (como presidente, deverá impressionar mais):



Em outubro, pulularam notícias falsas contra Amelinha Teles, que havia dado um testemunho da tortura que sofreu com o marido e os filhos, nas mãos daquele militar declarado torturador pelo Judiciário brasileiro, e autor preferido do presidente eleito. Aqui, fake news de um perfil que nasceu em setembro:




Nesses dois casos, vemos uma outra característica da tuitosfera bolsonarista, que é o de culto à ditadura militar, o negacionismo histórico e, certas vezes, a apologia de crimes contra a humanidade.
Isso gerou muitos perfis que adotaram o lema da ditadura militar, "Brasil, ame-o ou deixe-o", ressuscitado pelo SBT pouco depois do segundo turno das eleições, em 6 de novembro. A rede de televisão recuou nessa divulgação, mas seu esforço pró-ditadura rendeu frutos nas redes sociais até hoje: vários adotaram o lema, que foi criado em prol do banimento de opositores políticos, que havia sido "legalizado" por meio de ato institucional. O lema vem sendo empregado ao lado desta fórmula mágica que os bolsonaristas usam em debates: "Ustra neles", "Ustra vive" e variações, às vezes escritas desta forma: "Ulstra".
Como exemplo, um dos seguidores deste perfil que, para ilustrar o nacionalismo de ocasião da tuitosfera bolsonarista, faz parte de uma rede formada por arrobas em diversas línguas:


Alguns são perfis recentes, seguidos por arrobas semelhantes:


Ustra, o autor preferido de Bolsonaro, um dos maiores torturadores da ditadura militar, chegou a ser comparado, surpreendentemente por um membro da família B., com o ex-juiz que condenou o candidato original do PT, o presidente Lula. A condenação, todos lembramos, facilitou a campanha de seus adversários, especialmente a do antipetista Bolsonaro. Não adotando os critérios para ser cônjuge de César, o ex-juiz aceitou o convite, feito durante a campanha mas só revelado depois das eleições, de ser ministro da justiça do governo eleito com ajuda daquela decisão. O tuíte:


Trata-se de uma advertência do deputado federal reeleito? O futuro dirá. No presente, a alguns ele parece já estar desmorolizado, como antecipara em 2017 o próprio deputado reeleito, escrevendo o óbvio: se o então juiz abraçasse Bolsonaro seriam confirmadas as suspeitas da imprensa de que "agia com cunho político" e não jurídico:


O culto àquele torturador declarado pelo Judiciário brasileiro norteou diversos perfis:


A apologia aos crimes contra a humanidade é acompanhada, neste caso, do deboche sobre Marielle Franco, a falecida vereadora do Rio de Janeiro, eleita pelo PSOL, vítima de um dos assassinatos políticos mais chocantes da década. Os candidatos nas eleições de 2018 no ato da direita de quebra da placa com o nome dela, retratado pelo perfil, foram eleitos, entre eles o governador do Estado do Rio de Janeiro, que simultaneamente escarnece de vítimas de assassinato e promete ser linha-dura com criminosos. Não faz sentido, mas rendeu votos.
Há alguma coerência, no entanto, se se desejar que essa linha-dura atue de forma criminosa, violando garantias individuais, e, dessa forma, ela necessitaria de algo que poderia talvez ser chamado de "excludente de ilicitude", quase como se se presumisse a má-fé dos agentes públicos, temerosos de uma eventual comissão da verdade que os investigasse. Em um país em que tantos crimes são cometidos por agentes públicos, certamente essa ideia destina-se a criar mais conflitos e mortes.
No Rio de Janeiro, onde houve algo diferente, intervenção militar, e os militares temeram algo como esse tipo de comissão (pelo menos até o assassinato de Marielle Franco, que fez mudar ordem do dia), os crimes contra a vida aumentaram.

Daí segue uma característica que se cruza com diversas outras: boa parte da tuitosfera bolsonarista funciona com fundamento na violência, buscando intimidar os adversários políticos. Vejam o que este nostálgico da ditadura respondeu à Mídia Ninja:


São exemplos em número incalculável, à imagem de fungos brotando em madeira carcomida após a inundação. Instituições brasileiras também foram alvo dessa prática. Antes do episódio do cabo e do soldado, tivemos isto em junho a respeito do Supremo Tribunal Federal:

Os ataques à imprensa foram diversos, com hashtags chamando a Folha de papel higiênico, por exemplo, depois da matéria sobre o caixa 2 de empresas que financiaram o envio de mensagens pró-Bolsonaro pelo whatsapp. O perfil provinciano e não muito cultivado dessa direita, no entanto, às vezes fez com que ela errasse de alvo:



O Tribune de Genève é realmente de Genebra, ou seja, da Suíça. Ter uma seção dedicada ao "mundo", como fazem todos os grandes jornais, mesmo no Brasil, não o torna parte do jornal francês Le Monde (que é de direita aliás; nessa ocasião, ele foi chamado de esquerdista por seguidores do candidato).
No curioso evento da posse, jornalistas não só tiveram de sentar no mármore sem acesso a água e banheiro. Conta Monica Bergamo que eles foram ameaçados de morte: "Fotógrafos não deveriam erguer suas máquinas. Qualquer movimento suspeito poderia levar um sniper [atirador de elite] a abater o 'alvo'.". Evidentemente, não se trata de mero acaso ou ameaça, trata-se de um traço definidor deste modo antidemocrático de fazer política, que nega a esfera pública.

Outro forma de sabotar a esfera pública, como escrevi lá em 2017, e acho que todo mundo também, dá-se na presença de perfis falsos (uma espécie de fake news ontológico, talvez). Daquela vez, mencionei o significativo o fenômeno de uma petição pela candidatura de Bolsonaro cujo número de signatários superava o de eleitores do Brasil:


As condições do anonimato nas redes sociais tornam a situação mais difícil de discernir. Vejam este perfil criado em janeiro deste ano eleitoral; a quem se refere?



Este perfil que pretendia passar que Alvaro Dias fazia campanha para o Bolsonaro. Neste caso, usou-se o truque de trocar o "l" do nome por um "I". Continua no ar, mas não logrou muito entusiasmo:



Os perfis e notícias falsos terão importância para a "governabilidade" de uma chapa para cuja eleição eles foram tão relevantes? Não sei. Muitos bots foram silenciados depois das eleições: https://twitter.com/Lu_Marandes/status/1079334538751459328
No entanto, já em novembro nasceram perfis cujo objeto de atuação na rede é o elogio às escolhas ministeriais e aos demais atos do futuro governo, alguns deles tentando se fazer passar pelo presidente eleito:


Era previsível, de acordo com a internacionalização da direita, que um perfil desse tipo fosse seguido por perfis que tuítam em outras línguas, inclusive trumpistas:


Talvez, em alguns casos, já que tantos houve, tenha havido ilegalidades no campo do direito eleitoral. O PT está tentando cassar a chapa de Bolsonaro. Se conjecturarmos, pelo singelo amor à especulação, de que houve crime eleitoral e caixas de diversos números, e que isso fosse fartamente provado, apesar de a Justiça Eleitoral ter-se mantido inerme nesse campo durante a campanha, nada nos permitiria concluir qual seria a decisão do Judiciário. Lembremos que a chapa Rousseff/Temer não foi cassada pelo TSE em 2017 apesar de todas as provas, com votos dos Ministros indicados por Temer e de Gilmar Mendes, que venceram a posição do Ministro Herman Benjamin. Na situação minoritária de querer aplicar a lei, ele celebremente afirmou:"eu, como juiz, recuso o papel de coveiro de prova viva. Posso até participar do velório, mas não carrego o caixão".

Seria crível que um governo tentasse funcionar da mesma forma como a eleição foi vencida? A retrospectiva de 2019, portanto, será parecida com a da campanha de 2018?  A mobilização que logrou despertar se manterá no apoio ao presidente, ou se dissipará com as decepções que virão?
Questões difíceis. Mas algo inquieta: o fato de o discurso de posse ter escolhido problemas imaginários (combate ao socialismo, impedir que a bandeira se torne vermelha etc., estratégia eleitoral que encontrou êxito), talvez seja final de que não se pode, ou não se quer, enfrentar as questões reais.


P.S. em 2 de janeiro de 2019: Leiam esta fascinante história que Mari Messias conta sobre fake news e explica por que o perfil do deputado desapareceu (tal como o antigo do Queiroz). Por essa razão, a busca que indiquei não dá mais resultado. No entanto, salvei as diversas mensagens da nova retórica política antes de essa exclusão ocorrer. Esta foi só a primeira página daquela busca:



Depois da retórica da extrema-direita, o que dizer de igual grandeza e elevação? Completamente falto de palavras próprias, que sempre seriam demasiado pequenas, só me resta encerrar esta nota com a Bíblia cristã: Evangelho segundo São Mateus, capítulo 12, versículo 34: "[...] a boca fala do que está cheio o coração."