Eu não planejava fazer nenhuma retrospectiva do segundo ano da pandemia de covid-19. No entanto, na semana anterior àquela em que escrevo esta nota, surgiram vários tópicos no Twitter (uma rede social, é bom lembrar, de notável insociabilidade) sobre os duvidosos procedimentos dessa rede em relação à pandemia, especialmente a manutenção de mensagens e perfis de desinformação (sempre, nada coincidentemente, em apoio não só ao vírus, mas ao governo federal).
Entre eles, destaco #TwitterApoiaFakeNews, #TwitterCumplice, #TwitterOmisso, #TwitterVergonhoso, #TwitterApoiaMentira e #DerrubaMalafaia. O ano de 2022 começou com conflitos dentro do governo, com Jair Bolsonaro em disputa com a Anvisa por conta de vacinação de crianças (o que suscitou ameaças à vida dos servidores da Agência por parte de apoiadores do governo), com deputada federal bolsonarista divulgando dados pessoais, obtidos junto ao Ministério da Saúde, de médicos que defendem a vacinação infantil, entre outras questões que se refletiram na rede social.
Campanhas que contaram com a participação de perfis críticos ao ocupante da presidência da república, como Desmentindo Bolsonaro, Tesoureiros, Sleeping Giants Brasil, A boca de lobo, Jairmearrependi, Bolsominions arrependidos. Elas levaram o Twitter a aplicar suas próprias regras e a suspender temporariamente os perfis dos bolsonaristas Luciano Hang e Silas Malafaia, o empresário e o pastor (ou o contrário, tendo em vista a intercambialidade entre foi e crédit, já vista por Heine) em 13 de janeiro de 2022.
Essas mobilizações deram-se por causa da enorme presença de desinformação no Twitter no ano de 2021. Ela ocorre também em outras redes, e a Agência Aos Fatos sintetizou em gráficos os dados que ela checou sobre o coronavírus em 2021 em várias redes.
O Twitter afirmou que apagou uma média de 7 tweets por hora de desinformação em relação ao covid-19 (segundo a versão brasileira da BBC News). Escrevo esta breve nota para apenas lembrar de alguns desses momentos do ano, que provavelmente ajudaram no prolongamento da pandemia, com ênfase na atuação de políticos.
As campanhas contra as informações falsas sobre covid-19 acabaram levando à criação de um mecanismo de denúncia em 17 de janeiro de 2022, com a pandemia prestes a completar dois anos.
Notem a falta de urgência da rede social em fazê-lo e o baixo e redondo número de 10% de denúncias acatadas. Talvez isso se devesse à benevolência com que poderosos são tratados. Donald Trump, é verdade, acabou sendo banido em 8 de janeiro de 2021, mas é incerto que isso teria acontecido se ele tivesse se reelegido, ou se alguma outra forma de permanecer no poder tivesse prosperado.
A desinformação sobre "tratamento" precoce de covid-19 tinha por base esse vídeo com Alexandre Garcia. No dia 24 de setembro, o jornalista, por sinal, seria demitido de sua emissora de televisão por insistir na indicação desse tratamento.
Bolsonaro, no entanto, poderia ter simplesmente usado como fundamento as orientações do próprio Ministério da Saúde, que havia defendido a mesma posição em 12 de janeiro, que também acabou sendo sinalizado pelo Twitter:
Note-se que, no momento em que escrevo esta nota, o Ministério da Saúde aprovou nota técnica de crítica à vacinação e elogio à hidroxicloroquina.
O Twitter, contudo, não marcou nem retirou tweets como estes, que vieram do filho deputado federal:
Escolhi apenas dois, de 19 de março e 6 de abril. Mais complexos foram os tweets que combinaram a advocacia do "tratamento" com algum outro tipo de informação falsa. Em 31 de janeiro, vimos esta deputada federal fabular sobre o imaginário reconhecimento pelo Facebook da suposta efetividade do remédio que Jair Bolsonaro oferece a emas:
O filho deputado federal repetiu esse tweet com o nome dele no dia seguinte, acrescentando frases aleatórias com seu português alternativo ("Quantas vidas não foram perdida?").
A informação falsa veio do portal R7 e foi desmentida pela agência Aos Fatos ("Facebook não admitiu erro nem disse que hidroxicloroquina é eficaz contra Covid-19") em 4 de fevereiro.
Os tweets continuam lá, sem sinalização alguma.
Em 4 de abril, o tópico "Fraudemia" foi a primeiro lugar, reunindo perfis que negavam a existência de uma pandemia - uma das formas pelas quais o negacionismo da ciência tem se manifestado.
Embora os números oficiais estejam provavelmente subestimados, seja por falta de notificações, seja por causa dos mortos por sequelas do covid-19 que não contaram entre as vítimas oficiais da doença, um dos motes da direita é pretender que estejam exagerados. Trata-se de outra forma de lutar contra a memória, além de apagar os registros e impedir não só o acesso, mas a própria existência de dados oficiais, neste complexo de ações e omissões que correspondem a uma das políticas de amnésia do atual governo militar.
Para atender à visão conspiratória que a direita precisa alimentar para inflamar seus seguidores e afastá-los do mundo, a pandemia foi atribuída à esquerda e à grande mídia:
Muitos também a atribuem à China, aos comunistas, aos globalistas etc. É claro que o governo federal não possui responsabilidade alguma para esses perfis de propaganda.
Em abril, a abertura da CPI da Pandemia, autorizada pelo Supremo Tribunal Federal depois de o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, ter tentado inconstitucionalmente impedi-la, gerou desespero nas hordas bolsonaristas, que se expressou em tweets que morreram dentro da bolha dos apoiadores do governo federal. Vejam o comentário de Pedro Barciela:
Como é usual nas redes sociais da direita no poder, inúmeros tweets que configuram crime contra a honra, tentando enlamear Ministros do Supremo Tribunal Federal, foram escritos e retransmitidos, o que não configura novidade. O rebaixamento do debate público, seja por estratégia, seja por necessidade, é uma das táticas mais próprias da direita, tentando impedir que ideias mais complexas, mais próximas da realidade, possam ser ouvidas ou até mesmo concebidas.
A quantidade de crimes contra a honra e de ameaça à vida dos Ministros foi tão grande que o Tribunal resolveu publicar esta nota em 9 de abril:
Entendo. "Constituição" e "leis", palavras presentes na curta nota do Tribunal, sobre os quais milhares e milhares de páginas já foram escritas na Teoria do Direito e na Teoria Política, devem ser realmente termos de difícil compreensão nesta era pós-golpe de 2016, ou até mesmo em qualquer tempo, se pensamos nos apoiadores do bolsonarismo.
Como o Twitter reagiu? É esta a questão da minha nota, e motivo pelo qual relembro . Pois bem: a rede social manteve no ar as mensagens que chamavam o STF de organização criminosa, cúmplice de bandidos e outras de teor análogo, como as que atacavam pessoalmente os Ministros; não as indico aqui, pois a fala do bolsonarismo é a do esgoto não tratado e a céu aberto. Lembro também o uso da retórica cristã, por alguma razão muito apreciada pelos fascistas, para demonizar o Tribunal e seus Ministros.
O Twitter, ao longo dos trabalhos da CPI, também manteve os incontáveis ataques aos membros oposicionistas da CPI da Pandemia, que incluíram, já que, como sempre digo, a homofobia é porta de entrada do fascismo, insultos homofóbicos e, uma vez que havia senadoras na oposição, misóginos, pois a misoginia é o pão diário dos perfis bolsonaristas.
Em 22 de maio, a conjugação entre a nefasta política de saúde e a danosa política exterior gerou uma observação irônica do Embaixador chinês. O Ministério da Saúde propagandeou que "insumos do exterior" para a produção da vacina AstraZeneca/Fiocruz haviam chegado.
Talvez a referência geograficamente vaga decorra do fato de que o governo e seus apoiadores ostentam um discurso antichinês. Yang Wanming comentou que o envio era "feito para amigos":
O Ministro da Saúde viu-se obrigado a agradecer publicamente ao Embaixador. A omissão da informação no tweet original, porém, não configura motivo para removê-lo ou sinalizá-lo. Lembro dele aqui somente porque ele provocou nova onda de mensagens racistas contra os chineses, escritas pelos perfis defensores do governo. Não as reproduzo aqui. Desde 2020 acusam a China de ter criado a pandemia (que, no entanto, não existiria, segundo esses mesmo perfis...) para matar o Ocidente (embora, segundo os mesmos, a doença não mate...), em alianças fantasiosas com Soros, o MST, Hollywood e Cuba.
As ofensas à China e aos chineses manifestam-se também no tocante à vacina Coronavac. Cito este porque veio de um assessor deste governo que, com muito tirocínio, costuma escolher pessoas incompatíveis com as áreas em que irão atuar.
Esse tweet hostil a esse Estado estrangeiro acabou sendo citado na CPI da Pandemia. O assessor , que acabou apagando esse escrito (resgatado nesse momento, 28 de março, pelo perfil do Twitter Jairmearrependi), trabalha mais ou menos na área de Relações Internacionais. No caso, ele estava "trabalhando" em atacar um adversário político de Jair Bolsonaro, João Doria, um presidenciável do PSDB. Para esse fim eleitoreiro, usou um insulto ofensivo aos chineses... To add insult to injury...Parecem ridículas, mas as narrativas do bolsonarismo dariam o roteiro de um filme C. As crises políticas e sociais nele implicadas vivem de braços dados com a crise estética. Daí, talvez, o combate à arte seja tão importante para correntes políticas desse tipo.
Outro ponto importante: não há bolsonarismo sem cu; trata-se, porém, para a direita, de um órgão infeliz, infausto, enfezado. A referência a esse termo central do bolsonarismo, escrito de diversas formas para burlar, talvez, os mecanismos automáticos da rede social (cool, coll, cú, c, kú etc.), gerou um número enorme de tópicos e discussões. Creio que se trata do principal termo gerador de discursos dessa corrente política, mais importante ainda do que "arma", ou melhor, o cu é uma arma verbal mais usada pelos bolsonaristas do que o significante "arma".
A CPI desconcertou os bolsonaristas, que soltaram os discursos do cu, que se acoplaram à pandemia. Em 10 de maio, o filho vereador brindou-nos com seu talento para os apelidos:
Em 28 de maio, o filho senador, fazendo coro a tentativa de Jair Bolsonaro escapar das investigações corajosamente invocando líderes evangélicos para defendê-lo:
Em 30 de maio, o filho vereador soltou mais esta:
O mesmo filho, em 9 de junho, voltou a acoplar à pandemia este significante central do bolsonarismo, o cu, desta vez referindo-se a Lula. Percebe-se que os bolsonaristas já o entronizaram como presidente paralelo em exercício, ao ponto de Jair Bolsonaro tê-lo obedecido e usado máscara em 10 de março, depois do discurso, de repercussão mundial, em que o estadista tratou da recuperação dos direitos políticos após a anulação da persecução judicial que sofreu.
Além do óbvio medo da CPI e de Lula, a mensagem é notável por confirmar o reiterado deboche em relação a esta doença, embora não se compare à crueldade do ocupante da presidência da república imitando algumas vezes pessoas morrendo com falta de ar. Jair Bolsonaro fez isso pela primeira vez em 18 de março de 2021, o que deveria ser o suficiente para o impeachment, se não houvesse a cumplicidade do Poder Legislativo. Aliás, a falta de oxigênio em Manaus no fim de 2021 confirmou que o sufoco não é mais metáfora: tudo é literal no bolsonarismo, e agride. Sei, porém, que quem votou nele quer isso mesmo (é um dos tópicos reiterados dos bolsonaristas), admirador das práticas de desejar a morte dos adversários políticos, seja por doença, seja por fuzilamento, ou simplesmente massacres.
Em 16 de junho, o irmão vereador falou de discurso do irmão senador sobre a CPI desta forma:
Seria o caso de a rede social apagar esses tweets ou sinalizá-los? Provavelmente não, penso agora, embora devessem ser um problema em termos de decoro público para as casas parlamentares desses nobres legisladores. No Twitter, seria possível que eles postassem imagens do próprio órgão; caso o façam, pode-se sinalizar a imagem para que a rede social a marque com uma advertência de que se trata de imagem para "adultos". Em revanche, devemos notar que, curiosamente, o trocadilho usado não é coisa de adultos.
As medidas de distanciamento social muitas vezes são alvo dos apoiadores do governo federal. Em 25 de maio, o deputado federal filho publicou isto, em contraponto à CPI da Pandemia:
A mensagem desinformativa sobre lockdown só faltou incluir o elogio supostamente sanitário às aglomerações com apoiadores promovidas pelo pai dele.
Em 6 de junho, tivemos um dos momentos mais constrangedores da comunicação oficial do governo brasileiro, que já mostrou dificuldade em compreender textos jornalísticos. Desta vez, graças a uma tradução errada, o governo chegou a conclusão ridiculamente irreal e insultuosa de que a revista liberal The Economist queria "eliminar" Bolsonaro. A Secretaria aproveitou para propagandear que "milhões de vidas" foram salvas:
Nessa dificuldade de leitura e de interpretação, o governo segue fielmente seu líder. Bolsonaro, como se sabe, não sabe nem identificar o título de um jornal numa página. Para mencionar um exemplo, em julho de 2018, o então candidato fez a ridícula confusão do Tribune de Genève com o Le Monde, só porque a seção internacional desse jornal suíço chamava-se, adequadamente, "Mundo", ou "Monde", em francês - nem era "O Mundo"...
O eleitor dele votou nisto aqui:
Novamente, o amálgama de vitimismo e ignorância, em uma curiosa retroalimentação tóxica de que vive a comunicação bolsonarista. O Twitter não marcou como desinformação esses tweets do governo.
Em 9 de junho, os tweets de ataque ao Supremo Tribunal Federal, que, em geral, são mantidos pelo Twitter, levaram a Corte a fazer este pequeno fio:
Uma das desinformações recorrentes que os perfis (muitos aparentemente automatizados) é a de que o STF impediu "Bolsonaro" de "agir" na pandemia. Na verdade, ele apenas impediu o governo federal de impedir os Estados e Municípios de tomarem suas medidas de prevenção, uma vez que a Constituição de 1988 determina que a saúde é uma área de competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Poder-se-ia pensar que mesmo o bolsonarista mais idiota já teria notado que não existem apenas hospitais públicos federais, mas também estaduais e municipais; ou que até o bolsonarista mais raso tenha alguma noção de que não é a União que comanda o serviço de saúde do Município onde ele mora, ou do Estado, já que existe a autonomia desses entes. Depois que vi uma bióloga doutoranda em certa universidade federal, que, ademais, trabalha na área de saúde pública, repetir essa desinformação bolsonarista, percebi que esse tipo de estupidez pode acometer até pessoas que trabalham nessa área e deveriam saber mais do que os outros. Quando expliquei, parece que entendeu, e até acabou percebendo que o financiamento da ciência (ela recebe bolsa) diminuiu drasticamente (e piorará) com o obscurantismo deste novo governo militar.
Em 28 de julho, após outra série de ataques, o STF voltou a defender-se:
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É de se perguntar quem está a financiar essas campanhas massivas de desinformação, tendo em vista os perfis automatizados, em mais um milésimo exemplo do capital conspirando contra a democracia no país.
Também são mantidos pela rede social tweets que chamam a pandemia de fraude, ou "fraudemia", e atacar não só a vacinação como as máscaras, em geral chamadas de "focinheiras". Um exemplo é esta síntese pró-pandemia de 11 de junho:
Quando lecionava Direito Internacional Público, gostava de lembrar que os grandes problemas da humanidade passavam por esse ramo do Direito. Como, no campo jurídico, o bolsonarismo é isolacionista, em uma afetação de nacionalismo (num patriotismo que só chega até a página 2, até visitar a CIA, bater continência para a bandeira com estrelinhas e gastar todo o inglês dizendo "I love you" para o chefe de Estado estrangeiro que ele chamava de "noivo"), a recusa ao Direito Internacional e a tribunais internacionais conjuga-se à cegueira provinciana de negar a dimensão global de questões como a saúde pública.
O tweet também foi mantido pela rede social, assim como outros da categoria "fraudemia".
Araraquara foi a primeira grande cidade brasileira a impor um lockdown contra a pandemia. O prefeito, Edinho Silva, é do PT. Uma rádio bolsonarista divulgou um áudio de whatsapp de autenticidade jamais confirmada afirmando que as pessoas, em consequência, estavam a passar fome e a devorar os animais domésticos.
Cito o Congresso em Foco sobre o imbróglio. O coronel da PM Ricardo Mello Araújo, estava no programa e preside a Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais do Estado de São Paulo (Ceagesp) e acusou o prefeito de ser responsável pelo "caos na cidade":
Ele já coordenou ações de envio de alimentos à cidade de Araraquara durante a pandemia em um evento aproveitado politicamente pelo presidente da República Jair Bolsonaro.
Mello é um dos nomes mais próximos a Bolsonaro no estado e foi colocado pelo presidente da República no comando do entreposto, que é responsável por uma parte significativa do abastecimento de alimentos da principal cidade do país. Ele concedeu a entrevista à Jovem Pan (rádio que também é alinhada ao discurso conservador do presidente da República), mas não indicou se investigou a procedência do áudio.
A Prefeitura negou a história, mas a desinformação propagada pela rádio governista permaneceu e serviu para alimentar diversos tweets, que a rede social manteve, como este de 21 de junho:
Para ressaltar a postura do Twitter em termos de incentivo à desinformação, esse perfil bolsonarista foi recentemente "verificado" pela rede social com o selo azul após o nome, o que significa que a conta é de "interesse público" e autêntica. No caso, o interesse público foi negado, desvirtuado, pois convertido em mero interesse do governo.
Tratou-se de mais um dos casos em que o jornalismo "funcionou" renunciando ao próprio trabalho, pois não checou fontes e não tentou ouvir outras partes. E mais uma prova de que esses serviços de mensagem, que é aquilo que a maior parte da população conhece como internet, assim como algumas redes sociais cujos aplicativos podem ser baixados no celular, não configuram uma esfera pública.
No plano federal, a CPI da Pandemia prosseguiu seus trabalhos, encontrando indícios de tentativa de corrupção bilionária Ministério da Saúde militarizado, o que gerou uma nota corporativista do Ministério da Defesa atacando o Senado Federal. Celso Rocha de Barros ironizou o episódio assim:
Era o que dizíamos que ocorreria com a volta explícita dos militares ao poder. No Twitter, veio sem nenhum impedimento da rede social nova onda de ataques à CPI e seus membros e, especialmente, ao Senador Omar Aziz, alvo da nota dos militares.
Em 7 de setembro, irrompeu a tentativa de golpe via apoiadores do governo federal, que felizmente falhou de forma grotesca. Porém, simultaneamente ele deu certo, pois o governo prossegue. A direita tem um habeas-corpus informal para ameaçar a democracia.
Desde junho eu lia tuítes que conseguiam usar a transfobia como poética de mensagens contra a vacinação. Alguns vídeos chegaram a combinar essas duas linhas execráveis, que a direita tomou para combate contra os brasileiros. Em 26 de setembro, um vereador mineiro resolveu pegar carona na palavra-insulto "transvacinado":
Nesse momento de pequeneza ética e política, além da campanha contra a saúde pública (que fere o decoro mínimo que se deveria esperar de um "homem público"), nota-se a "transfobia recreativa" (faço uma analogia ao "Racismo recreativo", de Adilson José Moreira). Esses tuítes, assim como outros que vi que juntavam campanha contra a vacinação com transfobia, não foram apagados pela rede social.
O tuíte ocorreu depois de a pessoa em questão ter sido barrada no Trem do Corcovado, o que gerou estes, com bom humor e mau português (nota: parece que as pessoas não suportam a voz passiva sintética do "vacinou-se', "vacinei-me", com os efeitos de apagar o trabalho do profissional de saúde e de colocar-se sempre como o sujeito ativo da ação; exemplo típico, bem neoliberal, dos nefastos usos da língua em redes sociais, a charanga propagandística de chamar os holofotes para si):
Outro alvo da direita na campanha contra a saúde pública foi o controle de vacinação. A única espécie (quase viva) que a direita resolveu proteger, em meio a campanhas, projetos de lei, propagandas em prol da devastação ambiental, da invasão de terras indígenas e quilombolas, da destruição de rios e cavernas, foi o vírus. Transforma-se o amador na cousa amada, ou a cousa foi amada por ser o reflexo de si mesmo no lago? Difícil determinar o que gerou o amor da direita pelo vírus.
O tratamento precoce (os remédios para malária, para piolho etc.) continuou sendo advogado pelos defensores do governo durante os trabalhos da CPI da Pandemia. Neste tweet do senador filho do ocupante da presidência, em 29 de setembro, vemos esta tentativa de didatismo:
Outro tweet que foi mantido, e sem sinalização.Em alguma medida, esse Mal em um nível intelectual foi visto aqui. Brasileiros e brasileiras formados em excelentes universidades, muitos com estudos realizados em outros países.É preciso procurar muito na história do Brasil para encontrar algo similar ao que aconteceu nos corredores da Prevent Senior. Talvez apenas seja comparável aquilo que se deu no Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena, episódio tenebroso da história Brasileira.É preciso distinguir entre a empresa e os seus dirigentes. Isso me parece importante em razão da quantidade de beneficiários que são atendidos. Milhares, milhões, de brasileiros dependem dos serviços privados de saúde.Além disso, parece fundamental que os Conselho Regionais de Medicina, Ministérios Públicos Estaduais e ANS façam uma grande devassa, pois outras operadoras de planos de saúde e hospitais públicos e privados podem ter abraçado a insânia comandada pelo Presidente da República.Olhamos com mais atenção o caso da Prevent Senior, empresa que fez parte do Pacto, a associação sinistra na cúpula do governo brasileiro que, sob o lema “O Brasil não pode parar”, resultou na morte de milhares de brasileiros. (p. 986)
III.1 - A eticidade da pesquisa implica em:a) respeito ao participante da pesquisa em sua dignidade e autonomia, reconhecendo sua vulnerabilidade, assegurando sua vontade de contribuir e permanecer, ou não, na pesquisa, por intermédio de manifestação expressa, livre e esclarecida;b) ponderação entre riscos e benefícios, tanto conhecidos como potenciais, individuais ou coletivos, comprometendo-se com o máximo de benefícios e o mínimo de danos e riscos;c) garantia de que danos previsíveis serão evitados; ed) relevância social da pesquisa, o que garante a igual consideração dos interesses envolvidos, não perdendo o sentido de sua destinação sócio-humanitária.
O consentimento voluntário do ser humano é absolutamente essencial. Isso significa que as pessoas que serão submetidas ao experimento devem ser legalmente capazes de dar consentimento; essas pessoas devem exercer o livre direito de escolha sem qualquer intervenção de elementos de força, fraude, mentira, coação, astúcia ou outra forma de restrição posterior; devem ter conhecimento suficiente do assunto em estudo para tomarem uma decisão.
Em 10 de dezembro, destacou-se o tópico #SomosTodosNãoVacinados, uma espécie de grito de orgulho antivacinação. O Ministério da Saúde havia sido invadido no dia anterior por um "hacker interno", com login e senha do próprio ministério, o que gerou este tipo de comentário debochado, uma vez que os dados federais de vacinação ficariam dias fora do ar, inviabilizando em muitos Estados (não em São Paulo, que tem seu aplicativo próprio) a possibilidade de efetivar o controle da vacinação na entrada de locais e eventos;
Chama a atenção como a extrema-direita, em mais um nível de deboche (metalinguístico), apropria-se ou inspira-se em um slogan da esquerda (como o "somos todos judeus alemães", de 1968).
O hacker veio impedir o acesso aos dados do Ministério, que coincidentemente o governo não queria realmente divulgar. O apagão das informações compromete seriamente a saúde pública e corresponde a mais um capítulo da destruição do Estado brasileiro operada pelos bolsonaristas. Quatro deputados federais do PT (Alexandre Padilha, Bohn Gass, Gleisi Hoffmann e Reginaldo Lopes) propuseram ação no Supremo Tribunal Federal denunciando o Ministro Marcelo Queiroga por prevaricação. A incúria do governo brasileiro tem impacto global. Cito a matéria de Jamil Chade sobre as preocupações da Organização Mundial da Saúde: "sem um mapeamento eficaz da pandemia no Brasil, o temor é de que países da região possam ficar ainda mais vulneráveis".
Em 11 de dezembro, esta deputada federal governista, que censura os discursos dos colegas que caracterizam o ocupante da presidência de "genocida", foi bastante franca:
Este tweet, evidentemente, deve ser preservado. Serviria como um elemento a ser discutido em um improvável julgamento sobre crimes de lesa-humanidade do atual governo.
A deputada insistiu na posição, em 30 de dezembro, ao afirmar que os passes sanitários são "inúteis", elogiando o ministro da educação por sua participação na campanha oficial contra a vacinação:
A medida do ministro caiu no Supremo Tribunal Federal, mas a informação da "inutilidade" dos passes continua no Twitter, sem sinalização alguma.
Esse trabalho conjunto continua: no primeiro mês de 2022, tanto a Ministra Damares Alves, de Direitos Humanos, quanto o Ministro Marcelo Queiroga, que continua à frente da Saúde (e que contraiu, memoravelmente, covid-19 durante a estadia em Nova Iorque durante a abertura dos trabalhos da Assembleia-Geral da ONU), espalharam desinformação sobre covid-19. Aqui abaixo, a propósito da vacinação infantil, combatida pelos ministros, copio um desmentido do Centro de Vigilância Epidemiológica do Estado de São Paulo que várias pessoas postaram, algumas em resposta a tweets da Ministra; destaco o tweet deste médico, Gerson Salvador, para destacar que mensagens como esta também foram bastante veiculadas, e não apenas as de desinformação:
A Câmara Técnica também recomenda a vacinação contra covid para crianças e faz sugestões de que as tratativas para essa recomendação e aquisição de vacinas pelo Ministério da Saúde sejam implementadas. A maioria não concorda com a realização de fóruns que envolvam não especialistas em imunizações, uma vez que esse grupo consultivo já é formado amplamente por especialistas, cientistas, representantes de entidades médicas, CONASS e CONASEMS. Reforçam que a CTAI é contra consulta pública sobre o assunto em questão.
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