O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras. Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem".

sábado, 19 de abril de 2014

O 19 de abril e os eventos da campanha Índio é nós





Neste sábado, dia 19 de abril, participarei em São Paulo da Caminhada Índio é nós em prol dos direitos e terras indígenas: não se trata de uma ocasião de festa, e sim de reivindicação:

Dando seguimento à campanha pela mobilização nacional em prol dos direitos e das terras indígenas, o coletivo ÍNDIO É NÓS se une ao TEATRO OFICINA e ao MOVIMENTO PARQUE AUGUSTA em evento no Dia do Índio.
Convidamos a população de São Paulo para uma caminhada contra o ataque (genocídio, etnocídio, espoliação) aos índios patrocinado pelo agronegócio, pelas hidrelétricas, pelas empreiteiras e por novas encarnações do bandeirantismo desenvolvimentista, que destrói a terra como local de práticas simbólicas.
Além disso, dançaremos para celebrar nossos tekohás (termo guarani para designar não apenas o espaço físico da aldeia, mas o lugar onde se mantêm vivas as tradições, o modo de ser de um grupo), espaços da cidade prenhes de significação e ameaçados pela especulação imobiliária, pela segregação socioeconômica, pela paranoia securitária.
O cortejo sairá às 15h00 (concentração a partir das 14h00) do Museu de Arte de São Paulo (Masp), instituição em crise financeira cujo vão livre, tekohá de manifestações cívicas, a direção do museu já cogitou fechar.


Índio é nós (http://www.indio-eh-nos.eco.br/) não é uma organização, mas um ponto de articulação e de reverberação das pessoas e entidades comprometidas com os direitos e terras indígenas. Ela nasceu entre não índios, mas aberta para os povos originários (como se diz em espanhol) fazerem uso dessa campanha para dar mais visibilidade às suas demandas.
Esses povos já estão bem atuantes, e ocuparam o Congresso antes das Jornadas de Junho, mostrando o caminho de ação política. Em outubro, os diversos eventos da Mobilização Nacional Indígena, em prol da Constituição de 1988, foram também exemplares; em São Paulo, houve a histórica ocupação do Monumento às Bandeiras, que tive a alegria de testemunhar.
Lembro do ridículo de certo jornalismo, que noticiou o evento para dizer o quanto seria gasto para remover a tinta vermelha que os índios jogaram sobre o monumento...

Eventos Índio é nós ocorrerão neste dia também no Rio de Janeiro (o Dia Internacional de Combate ao Genocídio Indígena), no Pará (a Cia Balagan com a peça Recusa em Altamira), em Minas Gerais (a Chuva de Poesia com o "Tótem" de André Vallias), em Goiás (o começo da Semana dos Povos Indígenas e da IV Jornada de Arqueologia do Cerrado), em Brasília (estreia de Índio cidadão?, filme de Rodrigo Siqueira).
Participei de outro deles nesta semana. Estive na UFSC na última quarta-feira, 16 de abril, convidado pelo PET da faculdade de Direito, que tem a professora Jeanine Philippi como tutora, para falar em um colóquio sobre a ditadura militar. Lá, tratei do genocídio dos índios nesse período, tema que sugeri (pois foram as maiores vítimas da ditadura) e que foi prontamente aceito. Citei Shalton Davis e Manuela Carneiro da Cunha, Marcelo Zelic e Maria Rita Kehl, além de alguns documentos que encontrei a respeito.



Tive o prazer de rever o jovem (e brilhante) jurista Marcel Soares de Souza, que foi o debatedor na ocasião, e que havia ajudado a coordenar o Seminário Direito e Ditadura na UFSC em 2010.
Em Florianópolis, tive outra alegria, a de ver que duas apoiadoras da Resistência Guarani naquele Estado aproveitaram a palestra para falar sobre a homologação da Terra Indígena Morro dos Cavalos, no Município de Palhoça. Elas distribuíram panfletos e este cartão, para ser enviado à Presidenta Rousseff. Cliquem sobre a imagens para imprimi-las e enviá-las.

De fato, os eventos de Índio é nós (que podem ser vistos neste mapa) são para isto: tentar dar mais visibilidade ao trabalho das organizações indígenas e das que trabalham com esse universo. Não por acaso, a campanha nasceu entre não índios e não especialistas na questão, que não pode ficar restrita a esses povos e aos antropólogos. Ela deve ser tratada como uma causa de toda a sociedade brasileira.
Eu mesmo, que não sou nenhum especialista no assunto, no dia 17 de abril último fui ao ato dos Guarani de São Paulo de lançamento da Campanha para demarcação de suas terras.

Aconselho que vejam o belo vídeo feito pela Comissão Guarani Yvyrupa (https://www.youtube.com/watch?v=ShzMhVgna-g&feature=youtu.be) e apoiem a petição dos Guarani para o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, assinar a homologação de suas terras.
O Ministro, convidado, não compareceu... Mas a Justiça estava lá, na própria causa dos Guarani.
Para lançar a campanha, eles ocuparam o Pátio do Colégio (ver o site da Resistência Guarani: http://campanhaguaranisp.yvyrupa.org.br/) no dia 16. Vejam também a matéria do Repórter Brasil, que inclui vídeos desse momento: http://reporterbrasil.org.br/2014/04/indios-guarani-ocupam-patio-do-colegio-por-demarcacao-de-terras-em-sao-paulo/
Eles ficaram lá até o dia seguinte, quando cantaram e dançaram, e apoiadores discursaram com as lideranças indígenas: representantes do Índio é nós, do Movimento Passe Livre, da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, da Luta Popular, do Comitê Popular da Copa. Até mesmo o padre Carlos Contieri, diretor do museu, que havia chamado a polícia quando houve a ocupação, falou e agradeceu aos Guarani: "a surpresa de Deus sempre abre o olhar da gente".
Estavam lá também, pelo que pude reconhecer, membros do Centro de Trabalho Indigenista (CTI), do Instituto Socioambiental (ISA), Marcelo Zelic do Tortura Nunca Mais-SP... Esses também trabalham para abrir os olhares.

Em panfleto que foi distribuído no ato, os Guarani explicaram por que ocuparam o Pátio do Colégio, marco histórico da colonização de São Paulo e da apropriação das terras que foram dos índios: "Ocupando pacificamente esse lugar simbólico, não estamos nos vingando, nem estamos enganando vocês, como vocês fizeram. Queremos apenas surpreendê-los para anunciar que precisamos da demarcação das nossas terras."
A Terra Indígena Jaraguá, por sinal, além de ser a menor do país (com 1,7 hectare), insuficiente para os índios que vivem lá, também sofre por o rio estar poluído.
No panfleto, os Guarani convocam para um ato que farão no Vão do Masp no dia 24 de abril, com concentração às 17 horas.

Para somar a essa iniciativa dos índios de São Paulo, Índio é nós chamou para a Caminhada, com o Teatro Oficina, neste sábado, dia 19, para luta contra as violações dos direitos dos índios, que continuam ainda a ocorrer.
Não podemos perder a oportunidade de lutar contra o etnocídio (e, em algumas regiões, o genocídio) em curso, apoiado por governos comprometidos com os interesses econômicos que cobiçam as terras indígenas e destroem o meio ambiente. Como disse Manuela Carneiro da Cunha no lançamento paulista da campanha, e também nesta reportagem de Guilherme Freitas no caderno Prosa e Verso de O Globo, "O cerco aos índios na ditadura e na democracia":
Os índios que foram, como outros resistentes, enquadrados pelo regime militar como casos de segurança nacional, hoje, no regime democrático, continuam perseguidos. A Constituição de 1988, que proclama seus direitos, está sob constante ameaça de uma fortíssima bancada do agronegócio no Congresso.
Trata-se, pois, de uma defesa também da democracia. Participe dos atos que ocorrerão em sua cidade, ou os organize, caso não haja nenhum previsto. E assine as petições virtuais em prol da demarcação das terras indígenas, tarefa que o governo federal deveria, por obrigação constitucional, ter encerrado em 1993, e que continua a protelar, em desrespeito a esses povos e ao direito brasileiro.

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