O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras. Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem".

sexta-feira, 5 de dezembro de 2025

Metano bovino na cabeça

 




I

Metano bovino na cabeça,
Jesus na conta do banco,
um soldador na mão
e ele se convenceu:
seria presidente de novo.

O latifúndio colhera
metano bovino no banco,
Jesus ligado na tomada 
eletrocutara a democracia,
o soldador na cabeça 
incendiara as ideias
e ele se convenceu:
era presidente de novo.

Sua tornozeleira chutaria longe
as cabeças cortadas da democracia
se conseguisse levantar as pernas
sem o metano ter enxaqueca.

"Nunca deixei de ser presidente,
a lama continua sendo curral."

Acordou para a troca de fralda.


II

A tornozeleira eletrônica 
e o eletroencefalograma da fuga.

De madrugada, ele queria escapulir.

De manhã, pela madrugada ele só teve curiosidade.

No dia seguinte, ele ontem ouviu vozes.

Dois dias depois, na antevéspera se medicara.

Forma branda de alienação,
vozes na tornozeleira sussurraram
que ainda era presidente.

Quatro anos antes,
espécie genocida de alienação,
milhões de sussurros gritaram
que ele era presidente.

Agora
liberais rugem
projetos de anistia premonitória 
para crimes de lesa-humanidade 
porque ensurdeceram
e o único ruído que recordam
são os arrotos 
de que ele voltará a ser presidente.


III

Cascas de camarão entupindo
tumores intestinais, esposa e filhos 
competindo pela diverticulite
institucional, a inflamação do país
ou o regime da política 
disputando a digestão do atraso.

Nada disso mais o tocava.

Dentro da cela,
finalmente estava cercado 
apenas de si mesmo.