Organizado pela jornalista Niara de Oliveira, ocorrerá mais um tuitaço #DesarquivandoBR, desta vez com a exigência do cumprimento das recomendações da Comissão Nacional da Verdade (CNV), cujo relatório foi publicado em dezembro de 2014 (quase totalmente; o volume III só foi formatado no ano seguinte). Para mais informações, sigam o perfil https://twitter.com/desarquivandoBR e o blogue Desarquivando o Brasil.
Quem quiser colaborar, poderá:
- Escrever textos sobre temas das recomendações da CNV; quem não tiver um blogue ou portal próprio, poderá mandá-lo para o Desarquivando o Brasil; e/ou
- Tuitar com os tópicos do cartaz acima; e/ou
- Trocar a foto do avatar pela de um desaparecido.
Creio que o silenciamento dessas recomendações mostra que o problema, a discriminação, persiste. E o posterior silenciamento de todas elas, inclusive as do volume I, revela a persistência do legado da ditadura, eis que elas se referem ao enfrentamento do entulho autoritário por meio de, em sua maior parte, reformas legais e administrativas, medidas de verdade e memória, implantação de políticas públicas, em geral medidas de justiça reparativa, mas também de justiça corretiva, com a interpretação da lei de anistia de 1979 segundo a determinação do caso Gomes Lund e outros vs. Brasil, o caso Araguaia.
Trata-se, no seu conjunto, de um programa de "aperfeiçoamento" da democracia no Brasil, ou uma forma de torná-la mais efetiva. Menciono alguns exemplos, para que os leitores dessa nota percebam a variedade de assuntos que podem ser abordados no tuitaço (e, claro, na prática militante e política de todos os dias) e o seu alcance.
Como implantação de políticas públicas para justiça reparativa:
- "Fortalecimento das políticas públicas de atenção à saúde dos povos indígenas, no âmbito do Subsistema de Atenção à Saúde Indígena do Sistema Único de Saúde (Sasi-SUS), enquanto um mecanismo de reparação coletiva.";
- "Regularização e desintrusão das terras indígenas como a mais fundamental forma de reparação coletiva pelas graves violações sofridas pelos povos indígenas no período investigado pela CNV, sobretudo considerando-se os casos de esbulho e subtração territorial aqui relatados, assim como o determinado na Constituição de 1988".
No campo das reformas institucionais:
- "Fortalecimento das Defensorias Públicas";
- "Desvinculação dos institutos médicos legais, bem como dos órgãos de perícia criminal, das secretarias de segurança pública e das polícias civis";
- "Desmilitarização das polícias militares estaduais".
Medidas essencialmente legislativas, como
- "Aprovação de lei garantindo a livre identidade de gênero",
- "criminalização da homolesbotransfobia";
- "exclusão de civis da jurisdição da Justiça Militar federal".
Entre as que envolvem diretamente o Poder Judiciário, esta pode ser a mais importante:
- "Determinação, pelos órgãos competentes, da responsabilidade jurídica – criminal, civil e administrativa – dos agentes públicos que deram causa às graves violações de direitos humanos ocorridas no período investigado pela CNV, afastando-se, em relação a esses agentes, a aplicação dos dispositivos concessivos de anistia inscritos nos artigos da Lei no 6.683, de 28 de agosto de 1979, e em outras disposições constitucionais e legais".
Medidas de educação e de memória (o que inclui não homenagear os autores de graves violações de direitos humanos):
- "Revogação da denominação de “Dr. José Wilson Richetti” dada à Delegacia Seccional de Polícia Centro, do departamento das Delegacias Regionais de Polícia da Grande São Paulo pela Lei 7.076 de 30 de abril de 1991";
- "Promoção dos valores democráticos e dos direitos humanos na educação";
- "Preservação da memória das graves violações de direitos humanos".
Trata-se de medidas que seguem produzindo resistência, e encontram todo tipo de dificuldade em um país que sabota a educação, a ponto de partidos contrários terem se servido do mesmo secretário de educação, notório por sua nulidade técnica e fraqueza teórica. Como fazer educação para direitos humanos em um país em que não se quer que a educação ocorra?
Prosseguimento das investigações, tendo em vista que a CNV somente arranhou algumas das temáticas:
- "Instalação de uma Comissão Nacional Indígena da Verdade, exclusiva para o estudo das graves violações de direitos humanos contra os povos indígenas, visando aprofundar os casos não detalhados no presente estudo.";
- "Estabelecimento de órgão permanente com atribuição de dar seguimento às ações e recomendações da CNV";
- "Prosseguimento e fortalecimento da política de localização e abertura dos arquivos da ditadura militar".
Algumas Comissões da Verdade não fizeram recomendações, outras criaram diversas. Vale também reivindicar recomendações de outras Comissões. Lembro de algumas da Comissão da Verdade do Estado de São Paulo "Rubens Paiva", não presentes no relatório da CNV:
- "Que as empresas que contribuíram com a prática de violações aos direitos humanos sejam responsabilizadas como cúmplices de acordo com as leis internacionais";
- "Pedido oficial de desculpas aos Estados da Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Uruguai pela cooperação da ditadura militar brasileira com as ditaduras desses Estados, à margem do Direito Internacional";
- "Que seja valorizada a memória da resistência da população negra contra a ditadura e que sejam homenageados seus militantes";
- "Responsabilização penal, civil e administrativa, inclusive com perda de cargo, de todos os agentes públicos que, por ação ou omissão, contribuíram para as violações perpetradas pela Ditadura Militar, como juízes, promotores de justiça, agentes policiais e outros, que apesar de cientes das denúncias não se empenharam em garantir a segurança e a vida dos presos, ao não tomar as devidas providências, não solicitando investigação das denúncias";
- "Revogação do atual Estatuto do Índio e instituição de novo Estatuto, que reconheça a autonomia dos povos indígenas como sujeitos coletivos e sua diversidade cultural" ;
- "Reformulação do Sistema de Segurança segundo a diretriz da garantia das liberdades políticas, para que cessem a criminalização dos movimentos sociais e as prisões por motivo político";
- "Recomendamos que a grande imprensa brasileira, a partir das informações contidas neste relatório e no relatório da CNV, faça uma retratação pública, retificando as informações mentirosas oriundas das versões da ditadura sobre os diversos episódios, principalmente a versão dos assassinatos dos mortos e desaparecidos políticos".
Para o tuitaço, inspirados na recomendação 27 do primeiro volume da CNV, isto é, o "Prosseguimento das atividades voltadas à localização, identificação e entrega aos familiares ou pessoas legitimadas, para sepultamento digno, dos restos mortais dos desaparecidos políticos", substituiremos as fotos de nossos avatares pelas imagens de desaparecidos. O capítulo 12 do volume I do Relatório lista os desaparecidos confirmados pela CNV; não são todos, claro, mas estes nomes devem servir: http://www.cnv.gov.br/images/documentos/Capitulo12/Capitulo%2012.pdf
Os desaparecidos da democracia, como Amarildo, podem também ser evocados, ressaltando a atualidade desta campanha.
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