"[...] quando se aposenta o &%&%¨% está se retirando o **%&*¨do local que lhe propiciava a prática de atos irregulares. Isso não é pouco." Um funcionário público, criminoso, é condenado a simplesmente se aposentar, recebendo seus belos proventos. Isso não é pouco? Se a lógica fosse uma atmosfera, a frase mataria de sufocação. Isso é a impunidade, nada menos.
Imagine que os funcionários envolvidos fossem de alguma forma relacionados à justiça e à ordem pública. Se a lógica fosse um continente, a frase condenaria ao desterro universal. Como pensar em retribuir dessa forma os ilícitos praticados por essa categoria que deveria zelar pela lei?
Pode-se pensar em algo pior: a primeira palavra omitida poderia ser juiz, e a segunda, magistrado. Teríamos então a declaração de Gilson Dipp, Corregedor Nacional de Justiça, responsável pelas fiscalizações do Conselho Nacional de Justiça, dada a Frederico Vasconcelos na Folha de S. Paulo de 23 de agosto de 2010.
A ordem jurídica do Antigo Regime, o Absolutismo, marcava-se pela desigualdade: os estamentos recebiam normas diferenciadas, isto é, o direito aplicável aos nobres não era o mesmo a que se submetiam os homens do povo, as normas para o clero também eram especiais... O mesmo ocorria com os bacharéis (uma elite ainda no século XIX) e com os magistrados.
Exemplo do direito dessa época, as Ordenações Filipinas, de 1603, eram aplicáveis na maior parte do período colonial no Brasil e ainda após a independência.
Muito já foi escrito sobre a herança dessa ordem colonial (por exemplo, Raízes do Brasil de Sérgio Buarque de Holanda).
Algo dessa lógica estamental sobrevive em normas tais como o Estatuto da Magistaratura e o princípio constitucional da vitaliciedade, da forma como é previsto hoje. A proposta de emenda constitucional (PEC) 89/2003 tem por objetivo permitir a demissão de juízes condenados, mesmo que já tenham adquirido a vitaliciedade. De autoria da senadora Ideli Salvatti, a PEC foi, em julho de 2010, para a Câmara dos Deputados.
Que essa lógica se fundamenta na desigualdade, é fácil demonstrar. Imagine que se afirmasse: transferimos o traficante de drogas da favela onde atuava para um apartamento da avenida Atlântica (onde, de acordo com lógica parecida, só há pessoas de bem e ninguém ligado ao tráfico). Nós o tiramos do local onde auferia lucros irregulares. Isso não é pouco?
O palco e o mundo
Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras. Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem".
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