O livro mais recente de Amartya Sen, The idea of justice (Cambridge: Belknap Press, 2009), tem como um de seus traços notáveis - presentes em outras obras do autor - o conhecimento e a leitura de autores europeus e dos EUA, porém a partir de uma visão externa à desses grandes centros. O pensamento clássico indiano sobre a justiça, tal como problematizado no Bhagavadgita, alia-se à filosofia moral de Adam Smith, na interessante síntese operada por Sen.
Senti-me especialmente feliz ao lê-lo por:
- Sua recusa a uma visão paroquial da justiça (nesse ponto, Sen recorda de Kant, e vê, como outros, até, bem mais modestamente, eu mesmo no meu último livro, as grandes limitações de Rawls na tentativa de pensar a justiça internacional);
- Sua compreensão a respeito do valor moral dos direitos humanos (ele muito perspicazmente vê que, algumas vezes, para melhor defendê-los, não deve haver uma legislação coercitiva);
- A postura metodológica de pensar a sociedade de baixo para cima, e não de cima para baixo; a ênfase nas regras oficiais e nas instituições seria um dos problemas do pensamento de Rawls.
O livro todo, em verdade, foi escrito contra a teoria da justiça de Rawls, de quem Amartya Sen foi aluno. No entanto, as discordâncias teóricas, mesmo quando frontais, são expressas neste livro com uma profunda cortesia intelectual. Um exemplo é a divergência com Dworkin no tocante à justiça distributiva; nesse ponto, verificamos que é o jurista Dworkin, e não o economista Sen, quem concebe uma teoria submissa aos ditames do mercado.
Escrevi uma breve resenha sobre o livro, que pode ser lida aqui:
http://www4.uninove.br/ojs/index.php/prisma/article/viewFile/2347/1762
Espero que o traduzam logo para o português. The idea of justice já está disponível em francês; contra essa tradução, pude ver manifestação mais ou menos furiosa, bem etnocêntrica, de leitor que condenou a obra por nela não serem muito discutidos os autores da pátria que está agora a banir os ciganos.
Nota: Há mais pátrias do banimento, como alerta Eduardo Pitta: http://daliteratura.blogspot.com/2010/08/o-absurdo.html
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