Vendo as consequências atuais da cabeça pequena dos governantes, toda dedicada a grandes lucros de empresários do setor e aos ainda maiores prejuízos da população em doença, mutilação e morte, lembrei de um pequeno poema que fiz, o inicial da primeira parte dos Cinco lugares da fúria, que saiu pela Hedra em 2008.
A maior parte das pessoas que escreveram sobre esse livro (como Fábio de Souza Andrade, Gustavo Dumas, Marcelo Coelho) destacaram um poema que era uma fala de um cupim, mas o livro começa com os mosquitos e a doença, ou seja, sob o signo da peste. Ou seja, aquele sob o qual vivemos.
A imagem da capa, parte de um impressionante quadro de Isaumir Nascimento, parece encarnar esses tempos. Deixo-a para o fim, como se faz com a melhor parte.
Ventre seco dos calendários
de que
futuro é este
país
ignoro, mas
também o mosquito
em seu voo ignora qual
pele
vai picar;
este é o país, de que futuro
ignoro, mas
também a malária
no ventre
do inseto não
sabe onde
brotará;
não sei a quem pertence o país,
ao futuro?
como a epidemia
às drogas
das corporações trans-
nacionais?
(de onde
vem a cidade? da febre
ou da picada? apenas do vírus
ou da decomposição?
quem dela
nascerá?
ou do cruzamento entre a infecção
e a artéria
nascerá novo sangue
que sairá do corpo
para o fluxo
do final?)
de fato,
este país
não pertence
ao futuro:
os mosquitos agora
cobrem a cidade,
mas o sangue
já secou.
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