O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras. Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem".

terça-feira, 30 de agosto de 2011

Heine, orador público

Eu havia escrito que sairia uma tradução de excertos do livro Situações Francesas que Heinrich Heine publicou em 1832. Pois está nesta ligação.
Pensei originalmente em um certo filósofo suíço, mas achei que Heine era muito mais interessante para a revista, pois é muito menos traduzido no Brasil. Uma exceção recente é a antologia Heine, hein? Poeta dos contrários, que André Vallias traduziu e organizou.
O ideal seria traduzir o livro inteiro; fica a ideia para alguma editora de qualidade.
O livro tem uma de suas linhas de força na defesa do exercício público da razão pelos intelectuais e escritores em favor dos direitos humanos - isso teria sido feito na França, e foi muito importante para a Revolução. Já na Prússia, algo de bem diverso acontecia:

Hegel teve que justificar como racional a servidão, a ordem existente. Schleiermacher teve que protestar contra a liberdade e aconselhar a resignação cristã diante da vontade da autoridade. Revoltante e infame é esse uso de filósofos e teólogos, por intermédio de quem se quer influenciar as pessoas comuns, e que foram coagidos, por meio da traição à razão e a Deus, a se desonrar publicamente.

Heine, reagindo contra o influxo reacionário da repressão ao liberalismo alemão, da interdição de reuniões públicas, do cerceamento do direito de associação e do recrudescimento da censura, assume ele mesmo essa voz:

Por força de meu diploma acadêmico como doutor,[...] por força de meu dever como cidadão, [...] por força de minha autoridade como orador público, proponho minha queixa contra quem elaborou essa ordem, queixo-me em nome da majestade ofendida do povo, queixo-me pela alta traição contra o povo alemão.

Ele se queixa como diplomado em direito, como orador público e também como cidadão. Creio que esse ponto é fundamental: o intelectual não tem procuração para falar em nome dos cidadãos; ele fala nessa mesma condição dos outros.
O intelectual, dentro de sua especialidade, trará a contribuição do seu olhar e do seu saber. Os outros cidadãos também deverão fazê-lo.

Um comentário:

  1. isso é muito bonito. faz parte daquelas coisas que emocionam a gente, reavivando um senso de dignidade humana que às vezes está um pouco diluído.

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