Ruth Escobar (Porto, 1936), além de todos os méritos artísticos, teve um papel importante na luta pela volta dos exilados durante a ditadura militar. Nesta nota, trato apenas desse momento, e não de seus mandatos na política partidária, que foram um pouco posteriores.
No seu teatro, na Rua dos Ingleses, faziam-se reuniões do Comitê Brasileiro pela Anistia. No acervo do DEOPS/SP, que hoje está aqui no Arquivo Público do Estado de São Paulo, há diversos relatórios de espiões que assistiam aos trabalhos. Em certo relatório de 29 de abril de 1979, o agente anota que os Comitês tinham como atribuições:
1 Divulgar toda prisão e quaisquer arbitrariedades que viessem a ocorrer nos diversos setores da população;
2 Divulgar o número e a condição dos presos políticos no Brasil;
3 Promover Assistência Jurídica às pessoas presas e familiares de presos políticos;
4 Promover amparo material e financeiro aos familiares dos presos políticos
Havia uma preocupação com a resistência contra o projeto do Executivo de lei de anistia, que acabou sendo imposto pelo governo. Nesse mesmo relatório, vejam, na página que escolhi, como Ruth Escobar é descrita como responsável pela criação do Comitê Brasileiro, depois de manter contatos com vários movimentos congêneres no estrangeiro e com a Anistia Internacional, bem como com exilados e banidos brasileiros (incluindo Prestes, Arraes e Brizola).
RUTH ESCOBAR, veio orientada pela Esquerda Internacional, a criar no Brasil um COMITÊ BRASILEIRO PELA ANISTIA, que perseguissem os objetivos das congêneres em outros países, exercendo crescente pressão sobre o Governo para forçá-lo a conceder "ABERTURAS POLÍTICAS", como primeira "deixa" para entrarem em cena, seguindo-se após, intensa mobilização, utilizando-se de todos os artifícios possíveis, tentando sempre colocar em "xeque" a autoridade do regime, e inevitavelmente, o primeiro passo a ser dado seria a libertação de todos os "presos políticos", a Anistia para os banidos e exilados a devolução dos direitos dos cassados, e da liberdade para, retornando ao país poderem atuar - como sempre o fizeram em outras épocas - mas agora sob a legalidade, abertamente, sem os temores da clandestinidade.
O uso da expressão "entrar em cena" pelo agente foi uma boa escolha, eis que se tratava de um teatro e de uma atriz a congregar familiares e advogados de presos políticos e exilados naquelas reuniões.
O uso das aspas pelos espiões merece um estudo à parte: como, oficialmente, o regime era democrático, a expressão presos políticos deveria vir entre aspas. A Anistia, tal como o movimento a reivindicava, era considerada como perigosa, pois abriria as portas para a legalização da contestação do regime, isto é, à subversão.
De fato, o projeto oficial do governo, como já escrevi, não previa uma anistia ampla, e bem representava a lentidão calculada da abertura política.
Ruth Escobar teve em 2000 diagnosticado o mal de Alzheimer. Ela não poderá ler esta nota, mas segue esta pequena homenagem no Dia Internacional da Mulher.
Olá:
ResponderExcluirRuth não poderá ler este documento,é verdade, mas lembro-me dela,num evento,no seu teatro,dicursando inflamada, e sendo interrompida por palmas quando disse algo sobre o Falcão(o então Ministro Armando Falcão,da Justiça) que ameaçava a liberdade,ou algo assim.
Cybelle
Olá, Cybelle.
ResponderExcluirDe fato, Falcão ameaçava-nos, o que não o impediu de continuar a carreira política após a ditadura. Quanto a Escobar, ontem mesmo eu estava vendo a ficha dela, que era mais longa do que a de Gianfrancesco Guarnieri...
Abraços, Pádua
Interessante que o texto diz que "...Ruth veio orientada pela Esquerda Internacional...", como se ela fosse um alienígena manipulado desde outro sistema solar.
ResponderExcluirCybelle
Sim, eles chamavam de MCI (Movimento Comunista Internacional), que, de fato, pregava outro sistema.
ResponderExcluirAbraços, Pádua