O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras. Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem".

sábado, 3 de dezembro de 2011

Desbloqueando a cidade V: Eleição adiada para o CMH de São Paulo


Em outra nota, expliquei como a Prefeitura de Kassab resolveu cercear a participação popular no Conselho Municipal de Habitação com um cadastramento express dos eleitores do Município. Quem não correu, ou não percebeu a manipulação da prefeitura, ou não conseguiu ter acesso à internet nos três dias do cadastramento, simplesmente não poderia votar.
O PT, por solicitação da Central de Movimentos Populares, fez uma comunicação ao Ministério Público, que conseguiu liminar contra a eleição por chapa - a chapa que ganhasse levaria todas as dezesseis vagas da representação popular: http://cmp-sp.blogspot.com/2011/12/democracia-venceu-arrogancia-eleicao-do.html. Não ocorrerá a eleição agora, e a ela deverá ser dada ampla publicidade.
A Prefeitura, tentando manter a manipulação do processo eleitoral, recorreu ao Tribunal de Justiça. No entanto, o relator do processo, Rubens Rihl, manteve a decisão da 2a. Vara de Fazenda Pública, que foi dada neste sentido:

Trata-se de agravo de instrumento tirado em face da r.
decisão reproduzida às fls. 62, nos autos da ação civil pública
proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO
PAULO contra o MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, que deferiu
parcialmente a liminar, a fim de que sejam eleitos os
representantes individualmente e não por meio de chapas.
Além disso afirmou que deverá ser amplamente divulgado,
pela imprensa oficial, jornal de grande circulação na Cidade e
na página principal do site do Município.


Tal havia sido a decisão de primeiro grau. A Prefeitura recorreu, alegando que a decisão impediria a eleição do dia quatro (e até inviabilizaria o processo, pois o eleitor teria que votar em 16 candidatos, o que seria impossível para o eleitor...), e pediu o efeito suspensivo do recurso,. Isto é, a Prefeitura solicitou que a decisão tomada em primeiro lugar tivesse seus efeitos suspensos, o que permitiria a realização da eleição no dia quatro. O relator não concedeu o efeito que a Prefeitura solicitou (trata-se do Processo nº 0293662-54.2011.8.26.0000):

Assim, diante da indefinição legal quanto à sistemática de
votação, e considerando que o objetivo precípuo do Conselho
Municipal de Habitação, dentre outros, é estimular a
participação e o controle popular sobre a
implementação das políticas públicas habitacionais e
desenvolvimento urbano e possibilitar ampla informação
à população e às instituições públicas e privadas sobre
temas e questões atinentes à política habitacional (Lei
13.425/02, art. 3º, incisos VII e VIII), há indícios de que as
ações tomadas no sentido de disciplinar o processo eleitoral
em comento, e não apenas a questão da votação por chapas,
maculam o espírito democrático da Legislação Municipal, da
Constituição Federal e também do Código Eleitoral Brasileiro.
Sendo assim, ausentes os requisitos legais para sua
concessão, notadamente o perigo da demora, uma vez que
esse sistema de votação não é a única alternativa existente
para a definição do processo eleitoral, indefiro o pedido de
concessão de efeito suspensivo.


No sábado à noite poderia a Prefeitura alterar essa decisão? Pelo sim, pelo não, aconselho verificar o movimento nas Subprefeituras amanhã. A lista dos eleitores cadastrados com o local foi publicada no Diário Oficial, basta procurar pelo nome do eleitor na ferramente de busca: http://www.docidadesp.imprensaoficial.com.br/
Aqui está a lista das Subprefeituras: http://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/subprefeituras/subprefeituras/index.php?p=8978.
O Conselho foi previsto pelo artigo 168 da Lei Orgânica do Município de São Paulo. Poderia ter tido uma existência meramente virtual, se não tivesse sido regulamentado, o que aconteceu no governo de Marta Suplicy, por meio da lei 13425 de 2002. Esta lei municipal, que partiu de um projeto do então vereador e atual deputado estadual Adriano Diogo, do PT, confere-lhe diversas competências relevantes:

Art. 2º - O Conselho Municipal de Habitação tem caráter deliberativo, fiscalizador e consultivo e como objetivos básicos o estabelecimento, acompanhamento, controle e avaliação da política municipal de habitação.
Art. 3º - Compete ao Conselho Municipal de Habitação:
I - participar da elaboração e fiscalizar a implementação dos planos e programas da política habitacional de interesse social, deliberando sobre suas diretrizes, estratégias e prioridades;
II - acompanhar e avaliar a gestão econômica, social e financeira dos recursos e o desempenho dos programas e projetos aprovados;
III - participar da elaboração de plano de aplicação dos recursos oriundos dos Governos Federal, Estadual, Municipal ou repassados por meio de convênios internacionais e consignados na SEHAB;
IV - fiscalizar a movimentação dos recursos financeiros consignados para os programas habitacionais;
V - constituir grupos técnicos, comissões especiais, temporárias ou permanentes, quando julgar necessário para o desempenho de suas funções;
VI - constituir comissão especial para organização de Conselhos Regionais de Habitação;
VII - estimular a participação e o controle popular sobre a implementação das políticas públicas habitacionais e de desenvolvimento urbano;
VIII - possibilitar ampla informação à população e às instituições públicas e privadas sobre temas e questões atinentes à política habitacional;
IX - convocar a Conferência Municipal de Habitação;
X - estabelecer relações com os órgãos, conselhos e fóruns municipais afectos à elaboração do Orçamento Municipal e à definição da política urbana;
XI - elaborar, aprovar e emendar o seu Regimento Interno;
XII - articular-se com as demais instâncias de participação popular do Município;
XIII - definir os critérios de atendimento de acordo com base nas diferentes realidades e problemas que envolvam a questão habitacional no Município.

Sua competência não é somente consultiva, como costuma acontecer com os órgãos da administração pública em que há participação popular, mas também deliberativa. Por isso, interessa a Prefeitura um Conselho dócil e útil para os interesses dos governantes - e dos setores imobiliários. Lembremos que José Serra, em 2005, escolheu um corretor de imóveis para secretário de habitação, Orlando de Almeida Filho, que foi herdado por Kassab quando Serra abandonou a Prefeitura para concorrer ao governo do Estado. Hoje, ele é secretário especial de controle urbano (sim, a necessidade de abrigar aliados e pessedistas levou à explosão de secretarias no governo de Kassab, inclusive "especiais").
O nome da secretaria vem bem a calhar; embora a cidade esteja obviamente desgovernada, com carências e buracos por toda parte, a tentativa de controle é evidente: apropriar-se dos recursos comuns para manter administrado o caos administrável.

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