30 livros em um mês
Dia 02: Um livro do qual não gosta.
Uma ex-amiga (era óbvio que o relacionamento acabaria) deu-me, na graduação, um exemplar de O alquimista porque ela havia ganhado dois no fim do ano, e um deles parecia-lhe especialmente vazio; talvez, comigo, ele ganhasse algum significado... Li o presente; já conhecia a história, que vinha de tradições orientais. O problema era a fraqueza do estilo coelhiano.
O livro, porém, não é tão ridículo assim para merecer destaque na nota de hoje. O autor pioraria em seguida, quando tentou criar histórias próprias - ele não tem estilo, e fabulação tampouco. Veronika decide morrer comprova-o, e é o livro que escolho.
Meu irmão o comprou, na época do lançamento. Estava empilhado em um supermercado. Como sou curioso, pedi para ler. Minha irmã olhou uma página e desistiu, achando idiota; meu pai tentou um pouco mais e também largou a obra. Eu consegui chegar até o fim.
O livro, na verdade, é muito curto: trata-se de uma redação esticada e mal escrita. Não tem fôlego, o que o torna perfeito para leitores com letramento asmático (que não podem chegar perto de Proust); não tem profundidade, feito à medida de leitores diminutos (que sucumbiriam a Swift). É realmente uma literatura para quem não sabe ler.
Nunca esqueci a história, que é de um inverossímil descuidado. Veronika acorda e decide morrer – nunca saberemos a razão, pois o personagem não tem sentido, embora se trate de uma ficção de personagens. O livro inclui uma tentativa canhestra de transformar o próprio autor em personagem, lembrando que o escritor brasileiro Paulo Coelho foi internado como louco pelos pais somente porque consumia maconha.
Ela é salva, acorda em um asilo, onde aprende que, devido às sequelas da tentativa de suicídio, tem que tomar um remédio experimental até o fim da vida. No asilo, um louco que não fala, lindíssimo, a atrai especialmente. E ele toca piano de madrugada... Ela vai ouvi-lo...
Ficou nesses dois livros a minha experiência coelhesca. Em certo almoço, em que se comemorava que uma amiga havia passado para um concurso de letras na USP, resolvi contar a história (era um momento de trash literário). Quando cheguei à parte da masturbação da protagonista no asilo, totalmente nua, ao lado e ao som do piano do lindo louco afásico por quem ela se apaixonara e que gostava de tocar de madrugada (é um instrumento quase sem projeção sonora, bom de tocar a essas horas...), uma professora da FFLCH – não revelo nomes – não aguentou de rir e uma uva voou de sua boca direto para uma taça no centro da mesa.
No final da obra, problema nenhum, redenção total: os sintomas sofridos no asilo eram causados pelo remédio, e os amantes, livres, viveriam cada dia como se fosse o último. Grau 9,7 na escala clichê, que é oposta à richter; nesta, que é a dos terremotos, quando mais alto o número, maior a movimentação da terra. Na outra escala, quando mais alto o grau, maior o marasmo literário e a paralisia mental.
O que impressiona é que as feitiçarias coelhíssimas (somente um mago poderia ser tão bem sucedido com tão pouco talento), embora capazes de lhe conferir milhões de leitores pelo mundo, não lhe permitiram dominar a língua portuguesa – que tem magias que a própria Magia desconhece.
Sobre elas, ver um iniciado superior, Fernando Pessoa...
P.S. Bolaño, referindo-se à Real Academia Espanhola como "una cueva de cráneos privilegiados", lembra que "Coelho también está en la Academia brasileña."
O palco e o mundo
Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras. Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem".
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Coelho se reproduz velozmente, n'est-ce pas? Pelo menos neste meme tem batido recordes de rejeição...de qualquer forma, acho que Veronika decide morrer encontrou justificativa pra existir só pelo evento da uva voadora. ;-)
ResponderExcluirNada, nada, nada, absolutamente nenhuma "obra" coelhística (prefiro!) se compara a "As Valkírias"... Quando passa a raiva por causa da ruindade, o sujeito humano se esbragalha de rir da tosquice... simplesmente imperdível...
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