O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras e instauram a desordem entre os dois campos.
Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem"; próximas, sempre.

domingo, 2 de outubro de 2011

Ato e massacre: 20 anos do Carandiru


Sugiro que leiam sobre o ato de hoje no blogue do Movimento Mães de Maio.
O massacre no Carandiru foi retribuído pela aclamação de milhares de eleitores paulistas, que concederam ao coronel responsável o mandato de deputado estadual, e pela absolvição no Tribunal de Justiça de São Paulo. Tal foi a justiça corretiva empregada.
A justiça artística agiu diferente e aproximou-se da considerações do júri, que o condenou a 632 anos. Esse representante político do Estado de São Paulo, por causa do filme Carandiru, de Hector Babenco, chegou a se considerar "o maior condenado deste país", declaração bastante despropositada.
Não sei se o deputado-coronel discursou a respeito de outras obras realizadas a partir do massacre. Pude ver, no Centro Cultural Hélio Oiticica, a instalação de Lygia Pape. Ela relacionou o Carandiru com o extermínio sofrido pelos Tupinambás - preocupação que perpassou décadas de sua obra, segundo Fábio Lopes de Souza Santos e Vanessa Rosa Machado. Lembro também da instalação de Nuno Ramos, que buscou devolver o nome aos mortos.
A questão da memória é fundamental, o que é um fatores da importância do Ato de hoje; também o justifica a questão histórica das continuidades - esse tipo de terror de Estado tem permanecido a despeito das mudanças de regime político.
Mais modestamente, eu mesmo, em poema de Cinco lugares da fúria, aludi ao massacre na terceira estrofe; este é um trecho sobre a forma como foram torturados antes de morrer: "acertai na nuca os cem e dez e um covardes/ ajoelhados, amarrados, ou desacordados, mas antes/ deixai que os seus sexos copulem pela última vez com a boca agora humana dos cães;".
O curioso é que ninguém foi preso pela morte do coronel-deputado, o que é um curioso paralelo com a absolvição pelas mortes que causou. O paralelo termina aí; ele só tinha uma vida a oferecer, e não 111.

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