O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras e instauram a desordem entre os dois campos.
Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem"; próximas, sempre.

quinta-feira, 9 de novembro de 2023

Relançamento de Memória e sociedade, de Ecléa Bosi

 


Em 11 de novembro de 2023, às 16 horas, em São Paulo, ocorrerá o relançamento do clássico de Ecléa Bosi Memória e sociedade: lembranças de velhos. Nele falarão Amelinha Teles, Fabio Weintraub, Luciana Araújo, Paulo de Salles Oliveira, com mediação do historiador Tiago Bosi, neto da autora, falecida em 2017. O evento ocorrerá na Livraria Simples (Rua Rocha, 416).

Em 16 de agosto de 2023, ocorreu outro evento de relançamento, mas de cunho acadêmico, no Instituto de Psicologia da USP. Felizmente, ele foi filmado: começou a ser transmitido com som (embora fraco) depois de uma hora e vinte minutos, o que impediu o registro sonoro da apresentação do CoralUSP, mas não das falas da mesa, que podem ser vistas e ouvidas por meio desta ligação: https://www.youtube.com/live/GImAxTK4N6U?si=2gk0TUKYTSSg-Sm4&t=4832

Destaco na interessante mesa a fala da deputada federal Luiza Erundina, que conheceu e militou com Bosi (e se apresentou não como deputada, mas na condição de antiga amiga da autora), começa a falar perto de 1 hora e 33 minutos. Ela observou que o lema "não há democracia sem o poder popular" é a "perspectiva" da obra de Ecléa Bosi, o que é muito acertado. Mencionando a militância contra a ditadura militar de ambas, evocou, Aurora Maria Nascimento Furtado, estudante de Psicologia da USP e militante da ALN que, lembrou Erundina, "deu a vida pela liberdade": ela foi executada em 1972, depois de torturas que incluíram a "coroa de Cristo", uma fita de aço usada para esmagar o crânio.

Comento que, em outros espaços, a lembrança de um morto político suscitaria gritos de "presente"; isso não ocorre nesse ambiente da USP.

O livro traz as mencionadas lembranças de velhos com as análises da autora, configurando uma pioneira obra (no Brasil e no mundo) de memória social. Em outro momento de destaque da mesa, Fabio Weintraub, a partir de duas horas e 9 minutos do vídeo, fala da "comunidade de destino" estabelecida entre os depoentes e a autora: trata-se de um método da pesquisa, que significa, citando Bosi, "sofrer de maneira irreversível, sem possibilidade de retorno à antiga condição, o destino dos sujeitos observados". Daí, a "argúcia política" da análise que Ecléa Bosi faz da memória social, diz Fabio Weintraub.

A partir de 2 horas e 39 minutos, Luís Galeão destaca em Memória e sociedade a lembrança de Iara Iavelberg, que foi aluna do Instituto e nomeia o seu centro acadêmico. Ela foi amiga de Bosi. Guerrilheira da Vanguarda Popular Revolucionária, Iavelberg foi outra morta política da ditadura militar, para quem o governo forjou uma versão oficial de morte por "suicídio", desmentida posteriormente por laudos.

Com efeito, é inegável o caráter político desta obra, editada pela primeira vez em 1979, no início da gestão do general ditador João Figueiredo. Esse caráter reflete, devo lembrar, a própria trajetória pessoal da autora. Ecléa e seu marido, falecido em 2020, Alfredo Bosi, engajaram-se na oposição à ditadura militar, mas isso é pouco falado, até por causa da discrição dos dois intelectuais a respeito de sua própria militância. Entre outras ações, eles esconderam militantes procurados pela polícia. Espero que essas histórias - e as memórias dos que os conheceram - ainda sejam resgatadas e contadas. Ela mesma resgatou tantas histórias alheias.


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