O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras. Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem".

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quarta-feira, 26 de maio de 2021

O fechamento da Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, mais um capítulo da devastação bolsonarista

O governo federal conseguiu fechar a revista Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea (ELBC), uma das principais do país, por meio da estratégia tipicamente liberal de gestão: retirar o financiamento para que a instituição pública entre em colapso e, dessa forma, feche as portas ou, caso haja interesse do mercado, seja "concedida" a preço vil a empresários.

Parece que essa estratégia tem sido mais eficiente do que as iniciativas de mordaça do que se chama falsamente de "escola sem partido" (ou seja, com o "partido" neoliberal-teocrático-militarista) para calar professores e pesquisadores. 

A revista enviou correio eletrônico comunicando o encerramento. A editora-chefe, professora Regina Dalcastagnè, publicou-o em suas redes sociais. A acelerada destruição do CNPq e da CAPES por Bolsonaro foi um dos fatores que levou ao resultado:

Com o desaparecimento dos editais de apoio a publicações no Brasil e sem suporte institucional (ainda que a Estudos tenha sido um dos únicos três periódicos da UnB a receber nota máxima na última rodada de avaliação da Capes), não há como dar continuidade ao trabalho. 

Cito mais estes dois parágrafos:

A inviabilização de uma revista como a Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea, que comunga dos ideais da ciência aberta, não é uma situação isolada. Em nome da “sustentabilidade”, há uma pressão imensa para que os periódicos acadêmicos cobrem dos autores a publicação de seus artigos. Caso contrário, na ausência de outras formas de apoio, teriam que repassar os custos aos leitores. Existem revistas estrangeiras cobrando o equivalente a R$ 15.000,00 ou até mais para um brasileiro publicar seu texto; revistas nacionais que já se submeteram à ideia cobram valores também na casa dos milhares de reais. Uma vez que a publicação em periódicos acadêmicos, além de garantir a circulação do conhecimento, é importante para a formação do currículo do pesquisador e para a qualificação dos programas de pós-graduação, cabe perguntar: quem pagará por isso?

Certamente não serão os pesquisadores sem dinheiro ou as instituições mais periféricas. Recursos de universidades públicas, que poderiam ser utilizados para financiar as revistas brasileiras, já estão sendo empregados para pagar editoras acadêmicas comerciais que, na outra ponta, cobram valores exorbitantes para que as bibliotecas universitárias possam disponibilizá-las a seus professores e alunos (comprometendo o orçamento das bibliotecas e, portanto, a atualização dos acervos de livros). Trata-se de um negócio muito lucrativo. Não por acaso, nos últimos anos a Estudos de Literatura Brasileira Contemporânea recebeu – e rechaçou, evidentemente – várias propostas de venda de sua “marca” para editoras predatórias.

Trata-se de um adversário perigoso e sem escrúpulos. A indústria da publicação científica, com as armas letais da legislação de direitos autorais, levou à prisão e à morte um ativista como Aaron Swartz. Trata-se da batalha pelo controle da circulação de ideias e informações, na qual costumam se unir corporações e Estados. Lembro aqui do artigo de artigo do jurista Rafael Zanatta sobre a ideia swartziana de que "a ação colaborativa pode modificar as instituições existentes em uma perspectiva pós-capitalista". A fundadora do Sci-HubAlexandra Elbakyan, é basicamente uma asilada política pela indústria editorial, com o FBI em seu encalço.

É óbvio que o governo federal trabalha com outra perspectiva, não a de Swartz ou a de Elbakyan... Pois o sistema de editoração gratuita, bombardeado por Bolsonaro, atende a esse espírito de ação colaborativa, importante tanto para o conhecimento quanto para a democracia.

No twitter, comentei que é claro que OUTRAS revistas serão destruídas pelo governo federal e pelas demais autoridades bolsonaristas em diversas esferas do poder. A política de devastar as instituições científicas no Brasil inclui inviabilizar a divulgação de sua produção e atende ao projeto de privatização da educação pública.

Talvez seja útil relembrar que são as instituições públicas que respondem pela maior parte da pesquisa no Brasil. Acabar com elas não melhorará a ciência no Brasil, muito pelo contrário. Ou alguém está contando com a pesquisa de vacinas contra covid-17 (errei o número?) produzida por alguma uniesquina?

Sobre o projeto bolsonarista de destruição da ciência brasileira, quero lembrar, já no primeiro ano deste governo, da nota de esclarecimento da Associação Brasileira de Editores Científicos sobre a Chamada CNPq Nº 19/2019 – Programa Editorial, que deveria ter servido para apoio das publicações:

O recurso destinado à esta chamada manteve-se o mesmo por anos e caiu drasticamente passando de R$ 4.000.000 em 2018 para apenas R$ 1.000.000 em 2019, ou seja, redução de 75%. Cabe salientar o fato de que parte do recurso era dotado pela CAPES para esta chamada, o que não ocorreu, e portanto, o CNPq manteve de forma unilateral o Edital.

[...]

Foram apresentadas 222 propostas ao edital, distribuídas pelas Grandes Áreas do Conhecimento, as quais demandaram recursos no valor de R$ R$ 12.777.453,43. Portanto, os recursos disponibilizados pelo presente edital foram de R$ 1.000.000,00, equivalentes a 7,8% da demanda de recursos.

Após o trabalho de julgamento, o Comitê recomendou a aprovação de 162 propostas, no entanto, diante da apresentação do relatório final, a presidência do CNPq decidiu por não pulverizar o recurso e manter a série histórica de apoio a periódicos (quanto ao montante médio recebido por periódico nos últimos anos).

Desta maneira, inúmeros periódicos ficaram sem apoio, já que não alcançaram a linha de corte adotada pela Presidência do CNPq, que entendeu a necessidade de se manter o apoio a determinados periódicos apontados como estratégicos.

A redução de 75%, claro, era apenas a preparação abrupta para a extinção, como aconteceu também com as bolsas de pós-graduação dos programas. 

A ELBC tinha conceito A1, o mais alto. A qualidade das instituições públicas, porém, tem servido não para a sua preservação, mas para atiçar a sanha de devastação dos privatistas. Eu era leitor da revista, claro. Em maio de 2019, enviei um artigo para a revista no qual me referi ao "difícil andamento do próprio processo de justiça de transição no Brasil (e que permitiu em 2018 a eleição de um governo que nega o caráter criminoso da ditadura militar e elogia torturadores)."

Como todos os artigos que publiquei desde então (apesar de poucos), critiquei o atual governo (um dever de todo pesquisador, creio). Ele foi publicado no número 58 da revista. Eu não imaginava, porém, que o governo Bolsonaro a destruiria tão rápido.

Para essa destruição, é certo que houve a colaboração de colegas dos campos da ciência, da cultura e da pesquisa que traíram suas próprias áreas e apoiaram a eleição disso em 2018, apesar do discurso eleitoral já francamente obscurantista (bem como plano de governo, frontalmente hostil àqueles campos: Bolsonaro está cumprindo suas promessas). 

Continuam existindo esses apoios, embora, em regra, venham de figuras de estatura equivalente à do atual ministro da educação (ou à do impreCionante titular anterior) e à do secretário nacional de cultura. A essa estatura o Brasil vem sendo reduzido, pois é a única compatível com a ideologia neoliberal-teocrática-militarista.

Vi gente tratar como farsa o recentíssimo projeto de destruição da UERJ elaborado por um deputado estadual bolsonarista (parece que não seguirá adiante, informou Carlos Minc), porém na farsa também se revela o espírito da época. Trata-se da ideologia que vem presidindo eventos aparentemente díspares como o fechamento programado das universidades públicas ("Hoje, as 69 instituições têm a mesma verba que as 51 existentes em 2004. Só que 17 anos atrás elas tinham 574 mil alunos, hoje são 1,3 milhão de estudantes."), o genocídio dos povos indígenas ("“Estamos diante de uma política de extermínio indígena no Brasil”, denuncia assessor jurídico da Apib na ONU"), a premiação do crime ambiental com o desmonte da fiscalização e da legislação ("Delegado detalha denúncias de crime ambiental contra Ricardo Salles; deputados governistas criticam investigação") e à resposta genocida à pandemia. 

Enquanto este governo continuar, a devastação prosseguirá. Já é tarde para desfazer vários de seus efeitos, como a morte de quase meio milhão de pessoas.

Assinaram a dolorosa nota de extinção da ELBC os responsáveis pela revista; cito seus nomes não só para ressaltar sua excelência, mas para que as pessoas que não conhecem os periódicos científicos percebam, tendo em vista a diversidade das seções e das afiliações institucionais, como é difícil editá-los e como o espírito colaborativo, a que aludi antes (contrário, claro, à ideologia deste governo), é fundamental:


Regina Dalcastagnè, Universidade de Brasília (editora-chefe)
Patrícia Trindade Nakagome, Universidade de Brasília (editora científica)
Laeticia Jensen Eble, Universidade de Brasília (editora-executiva)
Leocádia Aparecida Chaves (secretária executiva)
Paula Dutra, Instituto Federal de Brasília (editora da seção temática)
Paulo César Thomaz, Universidade de Brasília (editor da seção temática)
Sandra Assunção, Université Paris Nanterre (editora da seção temática)
Anderson da Mata, Universidade de Brasília (editor da seção de tema livre)
Igor Ximenes Graciano, Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (editor da seção de tema livre)
Leila Lehnen, Brown University (editora da seção de tema livre)
Milton Collonetti, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (editor da seção de resenhas)
Edma Cristina Alencar de Góis, Universidade do Estado da Bahia (editora da seção de resenhas)

quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Desarquivando o Brasil CLXXIII: Araguaia e massacre em tempos de pandemia

Em 2016, o então deputado federal que hoje ocupa a presidência da república selou o caráter ilegítimo do processo de soi-disant impeachment da presidenta Dilma Rousseff dedicando seu voto a um criminoso, que fora declarado torturador pelo Judiciário brasileiro. A decisão tinha sido confirmada pelo Superior Tribunal de Justiça.
Agora, em dezembro de 2020, para manter acesa a chama golpista e misógina de seus admiradores e/ou cúmplices, voltou a atacar Rousseff, o que gerou seu protesto em 28 de dezembro, "Índole de torturador", que destaca a dimensão coletiva da ofensa: "Bolsonaro não insulta apenas a mim, mas a milhares de vítimas da ditadura militar, torturadas e mortas, assim como aos seus parentes, muitos dos quais sequer tiveram o direito de enterrar seus entes queridos."
Insulta e rebaixa o país inteiro, evidentemente. No dia seguinte, 29, vinte e três ex-presas políticas, entre elas Amelinha Teles e Crimeia Schmidt de Almeida, publicaram sua carta de apoio a Dilma Rousseff. Destaco este trecho:
O Estado foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 2010, pelos crimes de tortura e desaparecimento forçado de militantes políticos que ousaram defender as liberdades políticas e a democracia durante a ditadura militar (1964-1985).
Nós mulheres, ex-presas políticas, que nos rebelamos e resistimos  contra o autoritarismo da Ditadura Civil Militar que impuseram à sociedade brasileira naquele período, vimos repudiar estes atos e demandar que as instituições democráticas do Estado Brasileiro tomem as providências cabíveis.
Não permitiremos  que nosso país mergulhe de novo no fascismo e no obscurantismo.
Em defesa da democracia, das liberdades políticas e pelo fim da tortura e dos desaparecimentos forçados! 
A carta chama a atenção para a condenação em caso movido pelos Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, um exemplo de ativismo judicial dos movimentos sociais. Neste ano, a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos no caso Gomes Lund e outros, sobre a Guerrilha do Araguaia, completou dez anos. No entanto, ela continua largamente descumprida pelo Estado brasileiro, que não investigou nem responsabilizou os agentes dos atos da repressão, tampouco encontrou os restos mortais dos desaparecidos, com pouquíssimas exceções.
As militantes também chamam atenção para a continuidade dos crimes de tortura e desaparecimento forçado. Trata-se de um dado crucial, pois eles continuam a ser praticados por agentes do Estado ou por seus colaboradores e parceiros (como as milícias urbanas ou rurais que compartilham a "gestão" de territórios no país), e parecem necessários para a manutenção de uma sociedade tão desigual quanto a brasileira.
Creio que algumas das razões para a invocação persistente, em chave negacionista, da ditadura militar pelos poderes instituídos decorrem dessa necessidade operacional da gestão policial do Estado, e da exigência ideológica do culto à morte ou ao extermínio. Falei disso em agosto deste ano com apoio em Hannah Arendt em uma "live" que o Centro de Estudos Hannah Arendt da USP apagou.
Esse negacionismo apoia-se, como se viu na época da ditadura militar, em uma visão conspiracional, paranoica da realidade, que alimenta ideologicamente a extrema-direita. Citei naquele momento Leônidas Xausa por intermédio do livro Universidade e repressão: os expurgos na UFRGS, que a L&PM e a ADUFRGS lançaram em 1979:


A farsa da extrema-direita de hoje acentua-se no fato de buscar os mesmos bodes expiatórios daquela dos anos 1950 e 1960, os comunistas, hoje, como antes, amalgamados a outros grupos indesejáveis de natureza diversa, como feministas, negros, ecologistas, indígenas, LGBT etc. O impulso de negação da realidade fundamental para este processo, neste ano de 2020, chegou aos requintes de produção milionária e estocagem de remédios não eficazes pelas Forças Armadas para uma pandemia que, alegadamente, não existe ("gripezinha") e que, embora inexistente, teria sido criada por um país oriental para a dominação mundial pelos... comunistas.
Em mais de uma vez, inclusive em dezembro, Bolsonaro homenageou ou mencionou Ustra, judicialmente declarado torturador. Como se sabe, ele morreu em 2015, antes de ver um fã tornar-se presidente da república. Em maio de 2020, o chefe de governo reuniu-se e elogiou outro agente de graves violações de direitos humanos da ditadura militar, Sebastião Curió. Criminoso confesso, confirmou à imprensa em 2009 a execução extrajudicial de 41 pessoas durante a Guerrilha do Araguaia, época em que era major. Depois, ele fez carreira com a exploração de Serra Pelada e do trabalho dos garimpeiros, com a correspondente devastação ambiental. Em coluna publicada em 2020, "Fogo no Pantanal e na Amazônia mostram a verdadeira política econômica de Bolsonaro", Celso Rocha de Barros bem viu na devastação uma das convergências entre Curió e Bolsonaro.
O Ministério Público Federal tentou processá-lo em 2012, mas a ação não foi acolhida por causa da interpretação que o Supremo Tribunal Federal impôs à Lei de Anistia. Destaco dois trechos:







A violência foi infligida não só aos guerrilheiros, mas à população local, inclusive os povos indígenas. Como as operações violaram até mesmo o próprio direito da ditadura (para não falar das normas internacionais sobre combatentes, também descumpridas), o efeito da impunidade somente seria atingido com a extensão inconstitucional da anistia aos agentes graves violações de direitos humanos. 
Essa extensão indevida foi realizada pelo Judiciário brasileiro em 2010, em julgamento cujos recursos dormem atualmente nas gavetas do Ministro Luiz Fux. A Constituição de 1988, no Ato da Disposições Constitucionais Transitórias, havia expressamente limitado a anistia às vítimas da ditadura.
Como virou moda, ao menos desde aquela ocasião, ignorar o texto constitucional para decidir (a Lava-[a-]Jato confirmaria esse método), cito-o aqui:
Art. 8º. É concedida anistia aos que, no período de 18 de setembro de 1946 até a data da promulgação da Constituição, foram atingidos, em decorrência de motivação exclusivamente política, por atos de exceção, institucionais ou complementares, aos que foram abrangidos pelo Decreto Legislativo nº 18, de 15 de dezembro de 1961, e aos atingidos pelo Decreto-Lei nº 864, de 12 de setembro de 1969, asseguradas as promoções, na inatividade, ao cargo, emprego, posto ou graduação a que teriam direito se estivessem em serviço ativo, obedecidos os prazos de permanência em atividade previstos nas leis e regulamentos vigentes, respeitadas as características e peculiaridades das carreiras dos servidores públicos civis e militares e observados os respectivos regimes jurídicos.
A falta de responsabilização de Curió e outros, pois, repousa na negação judicial da Constituição da transição democrática, bem como do Direito Internacional dos Direitos Humanos. No entanto, como a imprescritibilidade da responsabilidade do Estado nesses casos foi reconhecida até mesmo pelo Judiciário brasileiro (Recurso Especial nº 1.815.870 - RJ), por causa desses agentes da repressão, o Estado é obrigado a pagar indenizações.
O PSOL informou a Corte Interamericana de Direitos Humanos do elogio ao Curió, tendo em vista que ele implica violação da sentença do caso Gomes Lund. Na Justiça Federal, foi proposto ao menos um processo. Alguns jornais ignoraram o nome das propositoras da ação: Laura Petit da Silva, Tatiana Merlino, Angela Mendes de Almeida, Maria Amélia de Almeida Teles (a Amelinha), Criméia Schmidt de Almeida e Suzana Lisboa (algumas delas, signatárias da carta de apoio a Dilma Rousseff). O pedido foi acolhido em dezembro de 2020.
Causando surpresa em ninguém, a Advocacia-Geral da União resolveu recorrer, afirmando que há "intepretações divergentes" sobre os fatos históricos. Sim, sempre há, mas nenhuma legítima. O Estado brasileiro foi condenado pelo seu próprio Judiciário e pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por causa dos crimes que cometeu no Araguaia. É improvável a boa-fé do condenado que faz o elogio público de seus próprios malfeitos, nunca cumpriu a sentença nacional nem a internacional e já produziu, em tempos muito melhores, um documento oficial, com provas, de que Curió foi um dos agentes de graves violações de direitos humanos. Trata-se do relatório da Comissão Nacional da Verdade.
A Advocacia-Geral da União tem assumido o papel histórico de defender os crimes do Estado brasileiro. Dessa forma, em 2003, no governo Lula, apelou contra a sentença que condenou para não ter que entregar as informações das Forças Armadas sobre a Guerrilha do Araguaia. O acórdão da Corte Interamericana destacou esse fato:
206. Igualmente, na mesma sentença, a Juíza ressaltou que não cabe negar a importância histórica dos fatos do caso e que “tempos como aqueles, de […] violação sistemática de direitos fundamentais, não devem ser esquecidos ou ignorados”.314 Indicou que “a informação prestada pela [União] é o que permitirá o acesso dos [a]utores aos restos mortais de seus familiares” e que, “se o aparato estatal agir de maneira que violações de direitos humanos fiquem impunes e não se restabeleça a vítima (na medida do possível) na plenitude de seus direitos, o Estado viola suas obrigações convencionais no plano internacional”.315 Ressaltou que os fatos citados na Ação Ordinária constituem “gravíssimas violações de direitos humanos” e, aplicando jurisprudência deste Tribunal, determinou que a verdade sobre o ocorrido deveria ser relatada aos familiares de maneira pormenorizada, já que era seu direito saber o que realmente ocorreu.316 Como consequência do anterior, a Juíza Federal de Primeira Instância solicitou à União que suspendesse o sigilo e entregasse todas as informações relativas à totalidade das operações militares relacionadas com a Guerrilha.317
207. Em 27 de agosto de 2003, o Estado Federal, por meio da Advocacia-Geral da União, interpôs uma apelação contra a referida decisão, na qual, inter alia, questionou o levantamento do sigilo dessas informações e reiterou que o pedido dos autores estava sendo atendido mediante a Lei nº 9.140/1995.318 Informou também que a Comissão Especial, no marco de aplicação da referida lei, “requisitou e recolheu documentos e informações provenientes das Forças Armadas e de outros órgãos públicos, além de ter realizado missões na Região do Araguaia para levantamento de informações e busca de restos mortais das pessoas desaparecidas”.319
Registre-se que a brilhante magistrada que falou dos fatos que não devem ser esquecidos ou ignorados chama-se Solange Salgado. Em 2009 o recurso protelatório do Estado brasileiro foi negado. No ano seguinte, viria a condenação pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
A defesa dos crimes de lesa-humanidade e o descumprimento do Direito Internacional dos Direitos Humanos, bem como da Constituição da transição democrática, elegeram em 2018 governos feitos a sua imagem e semelhança, com seus reiterados elogios ao crime e ao massacre. 
O massacre, por sua vez, torna-se dimensão institucional da resposta à pandemia, que não termina em 2020. Essa resposta gerou denúncias ao Tribunal Penal Internacional. 
A propósito, a Procuradoria do TPI aceitou em dezembro de 2020 investigar o governo brasileiro por incitação ao genocídio contra os povos indígenas. Veremos se essa denúncia seguirá o mesmo caminho da que os Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos ofereceram à Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

sábado, 24 de agosto de 2019

Uma nota sobre o fim da Arlequim e os encontros não mediados por algoritmos

Acho que a última vez que escrevi neste blogue sobre o Rio de Janeiro foi por causa do incêndio do Museu Nacional. Normalmente menciono essa cidade, na qual não moro mais, por causa de eventos de terrorismo de Estado ou de lugares que fecharam ou foram destruídos. Isto é, sobre perdas e danos. Desta vez, rascunho esta nota sobre o encerramento da Arlequim, que ocorreu em maio de 2019. Na época, não consegui fazê-lo.
Há alguma importância no encerramento de uma loja? Creio que sim, porque o seu perfil era único naquela cidade; no plano pessoal, para mim, há uma memória afetiva. Nela fiz quase todas minhas compras do Natal de 2018. Lembro quando começou, pois eu trabalhava no Centro do Rio de Janeiro, perto do Paço Imperial. Lembro também quando ela teve uma filial em Ipanema, que acabou fechando anos atrás.
A Blooks, que é uma ótima livraria, passou a ocupar o lugar, ao qual ainda não voltei.
Estas fotos do Guia Cultural do Centro do Rio dão certa ideia do que foi a Arlequim na época em que ela ocupava toda a parte do Paço Imperial, este sítio histórico do Brasil, voltada para a Primeiro de Março. A definição é exata: "Inserida no histórico Paço Imperial, a Arlequim, que na época de sua inauguração, em 1993, era apenas uma conceituada loja de CDs, cresceu e se transformou em um conjunto harmônico de livraria, café e restaurante com ares de bistrô." Além disso, havia as apresentações de música e recitais de literatura.
Tratava-se, principalmente, de um local de encontro. O sítio virtual da livraria apresentava a extensa agenda cultural; poeticamente, nele restou apenas esta interpretação de "Lamento no morro" por Tomas Improta, Fredo Gomes, Ricardo Pontes, José Arimatéia e Rodrigo Villa: https://www.arlequim.com.br/. O canal no youtube ainda traz algumas das apresentações: https://www.youtube.com/user/1Arlequim/videos
Para mim, Arlequim foi principalmente um local de música, para descobrir o Conjunto de Música Antiga da UFF, o Anima, o Diego Schissi Quinteto, o Ensemble Clément Janequin e uma longa série.
Acreditem que era um lugar com música de diversos séculos e estilos. Aqui, alguns dos discos que comprei no fim de 2018, de Steve Reich (por Kristyan Järvi; apesar do grande maestro, não gostei muito) a música de terreiro (Glória Bonfim), mas também Franco Fagioli cantando árias de Rossini e a ópera Serse de Händel. Além destes, faltam o Sidney Miller nas vozes de Joyce Moreno e Alfredo Del-Penho e o disco Puccini de Roberto Alagna e Alexsandra Kurzak, que estão em outro lugar.


Como livraria, havia muitas obras sobre a cidade do Rio de Janeiro, música e cinema, embora não se limitasse a essas áreas. Por exemplo, comprei para sobrinhas no fim do ano Valsa brasileira, da economista Laura Carvalho e A descoberta do mundo, de Clarice Lispector.
O que o livreiro Márcio Pinheiro, um dos sócios da loja, disse em 2018 para a Associação Estadual das Livrarias do Rio de Janeiro parece-me importante:
Houve os 130 anos da Abolição da Escravatura e fora o dicionário da Lilia Schwarcz pouca coisa foi  reeditada. Montamos uma seção grande sobre a Abolição, até porque a Lei Áurea foi assinada no Paço Imperial. Estou em contato com a editora Escrituras para montar uma seção sobre cangaço; esse ano há a efeméride de nascimento e morte de Lampião. Vamos dar destaque às obras já lançadas, não são novas edições. Mas o cangaço é um tema importantíssimo na nossa história. Montamos a livraria pelo interesse e pela importância do assunto. Se me pautasse pelos números colocaria o Augusto Cury na frente, mas para nós é muito mais importante ter o dicionário da Lilia Schwarcz, a biografia que saiu do Rafael Rabelo [Raphael Rabello]. É um comércio de fato; nossa questão aqui é a venda, mas tem uma questão cultural; o papel cultural que as livrarias acabam desempenhando.
Ele achava que a livraria se adaptaria ao mercado digital se a economia brasileira melhorasse, o que não pôde ocorrer. O eleitorado brasileiro escolheu em 2018 não só a idolatria aos crimes de lesa-humanidade, mas a recessão e o desmantelamento do Estado.
O mencionado papel cultural desempenhado pelas livrarias físicas dessa natureza, com eventos culturais, inclui propiciar encontros que não são determinados por algoritmos. Trata-se não só de encontrar mercadorias sem essa mediação automática, mas de ver pessoas. A insociabilidade das redes sociais, fomentada pelas bolhas ideológicas, não é de forma alguma contrabalançada pelas lojas virtuais. Pois o algoritmo não serve apenas para reduzir as relações interpessoais (considerando ainda que boa parte das pessoas são robôs) a transações e valores de troca, mas para transformar as pessoas (que alegremente, docilmente apresentam e oferecem seu preço) em bens avaliados em termos financeiros.
Escrever sobre o Rio de Janeiro, falar sobre a perda. Desta lista de 2016 (não faz tanto tempo assim, embora já fosse a derrocada do país) de cinco livrarias do centro do Rio, vejam que oitenta por cento já fechou: https://diariodorio.com/as-5-melhores-livrarias-do-centro-do-rio/. Não cliquem na ligação indicada da Folha Seca, que parece estar caindo em um sítio malicioso. Esta livraria, porém, continua a existir.

terça-feira, 1 de janeiro de 2019

Retrospectiva 2018: A tuitosfera bolsonarista e o fake news ontológico

No fim de 2017 escrevi aquela nota, "Filosofia política e robôs na internet: uma nota sobre democracia, notícias falsas, ilusões e políticas grosseiras", e infelizmente 2018 confirmou o que escrevi sobre a reação do Judiciário e o uso desses instrumentos na campanha eleitoral. As eleições deram também a resposta para o final da nota, em que perguntei, retoricamente, que tipo de político se beneficiaria disso.
Pensei em dizer que minha retrospectiva de 2018 já estava escrita lá, mas fazê-lo seria preguiçoso e pretensioso. Não repetirei nada do que escrevi antes, apenas compartilho o que eu, entre vários outros, observei na tuitosfera bolsonarista. Não pretendo que ela seja homogênea, porém, nos seus grandes momentos de atuação coletiva, ela age como um só; ademais, seu repertório de memes e lemas é muito pouco variado, o que achei que justificaria essa forma de tratamento.
Aconteceram muitos incidentes em outros espaços da internet; em julho de 2018 ocorreu uma das retiradas de páginas que violavam os termos do facebook; por alguma razão que me escapa, elas eram em grande parte da direita e apoiavam Bolsonaro, o que fez a campanha desse pré-candidato reclamar já nessa vez de "censura"; em outubro, falou-se muito do whatsapp, em razão do envio automático e maciço de mensagens, e da matéria da Folha de S.Paulo sobre as empresas que estariam financiando "por fora" a campanha de J. Bolsonaro na internet: "Empresários bancam campanha contra o PT pelo whatsapp".
Sei que há esses outros espaços. Não falarei deles por falta de fôlego. Contudo, eles foram refletidos pelo twitter; por exemplo, em 18 de outubro, os tópicos #caixa2dobolsonaro e #bolsolão, em razão do escândalo do whatsapp,  conseguiram ficar entre os dez mais discutidos do twitter no mundo; o primeiro deles chegou a liderar no Brasil e no mundo.


A tuitosfera de apoio a Bolsonaro reagiu com tópicos do tipo "sou caixa 2 do bolsonaro", e alguns deixaram fotografar-se dentro de caixas com o número 2 escrito. Nesses momento, via-se uma massa agindo como uma unidade. Não afirmo, obviamente, que essa tuitosfera seja controlada e/ou criada pelo presidente eleito, pois isso teria sido criminoso. Apenas observo as características comuns de pessoas e perfis com grau maior ou menor de automatismo quando estes agem como um só ator.
Não faço uma análise científica de nada disto, pois me faltam os instrumentos, tampouco repasso os acontecimentos mais marcantes, o que várias retrospectivas jornalísticas fizeram tão bem. Tendo em vista que o twitter foi importante antes, durante e depois da campanha, quando se tornou "canal oficial" de comunicação (o bloqueio que o presidente eleito fez de jornalistas do Intercept, escolhidos como inimigos do novo governo, comprova-o), creio que indicar algumas das características dos tuítes dos perfis engajados, e exemplificá-los durante o ano, poderia ser relevante.
Afora a família do presidente eleito, não citarei outros políticos eleitos. Eles demandariam notas próprias porque suas pautas não se resumem, em geral, a reproduzir o "programa" de J. Bolsonaro e, ademais, não sabemos por quanto tempo permanecerão aliados. Estavam realmente a apoiar, ou apenas pegaram carona na onda que acabou vitoriosa? Este ano de 2019 poderá revelar falsos aliados.

Um dos traços interessantes de 2018 foi o da internacionalização da direita e da extrema-direita. O apelo à união dos proletários de todo mundo foi copiada por este polo oposto do espectro político e deu alguns passos neste ano: o "Movement" de Steve Bannon na Europa ganhou adesão de Matteo Salvini em setembro de 2018. Perguntei sobre o assunto a Antonio Luiz M. C. Costa, que era o melhor especialista desses assuntos na Carta Capital, até que foi lamentavelmente despedido neste ano, e ele respondeu: "O fascismo atual é menos sobre nacionalismo, que é peculiar a cada nação, do que sobre racismo e xenofobia comuns a todos os países brancos e ricos". Daí fazer sentido uma "internacional" dessa corrente política entre esses países.
No entanto, ela faria sentido na América Latina? Imagino que apenas faria se representasse um movimento subordinado, creio, àqueles países "brancos e ricos"; no continente, a figura mais óbvia que tutelaria essa movimentação seria Trump. A realização da Cúpula Conservadora das Américas em dezembro de 2018, com participação de E. Bolsonaro, foi um sinal desse tipo de internacionalização que, de fato, não tem nada que ver com a ONU. Não há nada de incoerente em manifestar-se contra o Conselho de Direitos Humanos da ONU (neste tuíte de agosto, ele foi atacado por causa da decisão em prol da candidatura de Lula) e participar de uma mobilização internacional contra os direitos humanos sob a bandeira ou pretexto de combate à esquerda:


Esta é a agenda de Trump também, em que J. Bolsonaro assumidamente se espelha. Na tuitosfera bolsonarista, houve diversos gestos de genuflexão diante dos Estados Unidos. No ano em que esse país criou campos de concentração para crianças imigrantes, e houve quem morresse em custódia, tivemos, em junho, algo deste tipo: "Passei pela imigração hoje. Documentação toda correta. Trump "malvadão" não me separou dos meus filhos."
Já falei, naquela nota de 2017, sobre a aproximação com Trump e o Partido Republicano dos EUA. Aqui faço algo mais simples, quero lembrar das redes que os perfis bolsonaristas do twitter construíram entre si. Não tenho os instrumentos científicos para medi-las, porém posso notar sua variedade linguística. Os seguidores das arrobas de apoio a Bolsonaro incluem perfis que escrevem em árabe:


E outros idiomas orientais:




Vejam, já em maio, a diversidade linguística dos seguidores deste perfil de apoio a Bolsonaro que, no entanto, tuitava em português:


Apesar de todos os gritos contra o cosmopolitismo, o globalismo etc., inclusive oriundos da pena do futuro ministro das relações exteriores, vejam que a direita e a extrema-direita internacionalizaram-se tanto que até teriam aprendido português!
Infelizmente, o mesmo não se pode afirmar de grande parte dos tuiteiros brasileiros pró-bolsonaro, que tantas vezes demonstraram um fraco domínio do idioma, às vezes mesmo em tuítes que duvidavam da capacidade de leitura de Lula ou de Haddad... O antigo perfil de Queiroz, braço direito e depoistante de cheques da família Bolsonaro, já apagado (quem o quiser procurar nos arquivos da internet: @fjcqueiroz), era um exemplo disso, pródigo em grafias alternativas como "corrupito" e "concurço". Não dou exemplos porque ele só o alimentou até 2013 e foge ao escopo temporal desta nota.
Também perfis em outras línguas manifestaram apoio a Bolsonaro e suas promessas contra as minorias. Por exemplo, este, em francês, da extrema-direita:


Em espanhol, este com a promessa de erradicação da esquerda latino-americana:


Trata-se de tuítes de outubro. Não são mensagens do centro político, que, por sinal, esvaziou-se no Congresso Nacional com as eleições de 2018. O trabalho da grande imprensa de normalização dos discursos da extrema-direita contribuiu para este resultado, e figuras mais obviamente armadas tomaram o espaço da direita moderada.

A internacionalização dessa tuitosfera acompanhou-se de uma grande dinamização da direita e da extrema-direita em termos de militância virtual. Há diversos perfis capazes de tuitar 60 vezes por minuto, o que é de um engajamento formidável.



No minuto seguinte:


Em janeiro já se observava o fenômeno:


Um minuto depois, mais 60 tweets:


Mas não começou aí. Isso já ocorria pelo menos desde o ano passado, como eu escrevi naquela nota de 2017. Dou outros exemplos:


Um minuto depois:


Eu indaguei, pouco mais de anos atrás, se alguns desses perfis podiam ser automatizados. No entanto, mais interessante do que isso é notar que cada vez mais perfis humanos são parecidos com os autômatos, não exatamente por causa da melhor tecnologia de bots (o que inclui a criação digital de fotos e imagens), mas por causa do estreitamento do repertório linguístico dos humanos.
Aquela pergunta, no entanto, mantém atualidade especialmente em um ano eleitoral, tendo em vista as suspeitas de fraude e manipulação da opinião pública.

Essa tuitosfera foi tão dinâmica que até mesmo instituições oficiais seguiram perfis que fizeram campanha para Bolsonaro, como o Tribunal Regional Federal da 4a. Região, que, noto, condenou o primeiro candidato do PT à presidência da república - uma decisão que, sem dúvida, foi importante para os resultados das eleições de 2018:



Houve diversas denúncias de empresas, como a Havan, coagindo os empregados a votarem no presidente eleito. Muitas empresas, de fato, participaram dessa tuitosfera. Destaco aqui apenas este caso, por pitoresco, de este curso oferecer desconto de acordo com o número do candidato: https://twitter.com/ALuizCosta/status/1048598539893399552. O número do candidato do PSL daria um desconto do que o do PT...

Lamentável que uma tuitosfera tão grande, dinâmica e cheia de apoios se marcasse pelo rebaixamento intelectual e infantilização do debate público, como se a inteligência tivesse sido expulsa pela direita. Em janeiro, por exemplo, foi criado este, entre os incontáveis perfis pró-Bolsonaro que o apresentavam como super-herói:


Se a iconografia da direita foi diversas vezes lamentável, o texto, em geral, foi pior, com a repetição dos mesmos chavões para não importa que situação: "chola mais", "Lula está preso, babaca" (este, meramente copiado de manifestação de Cid Gomes), "e o PT?", "aceita que dói menos", "vai para Cuba Venezuela", "esquerdopata" e "quem mandou matar Bolsonaro?" etc.
Nisso, sua rede espelhava exatamente o candidato, com sua evidente dificuldade de leitura de discursos e a incapacidade de encadear ideias e, por vezes, de entender perguntas de entrevistadores. Nesse sentido, o atentado que lamentavelmente sofreu foi mesmo providencial, pois lhe deu o pretexto para não comparecer a debates, embora não se furtasse a falar com os meios de comunicação amigos (a Record, principalmente).
Como passou três décadas fazendo política sem ter conseguido aprender muita coisas, não creio que isso mudará no exercício do mandato. É claro que furtar-se ao debate público é antidemocrático, e que as redes sociais atendem a essa estratégia antidemocrática, pois se tornam principalmente bolhas. No whatsapp, em que se resume a itnernet para tantos no Brasil, a experiência pode ser simplesmente familiar ou doméstica. Sugiro a leitura do texto de Letícia Cesarino sobre populismo digital, que lembra que, segundo a simplificação do mundo nessas bolhas, "basta votar no presidente certo e esperar sossegadamente para que todos os problemas do país sejam resolvidos dentro de quatro anos". A decepção promete ser grande.
Vários perfis aparentemente não tinham nada a fazer senão reproduzir as mensagens de campanha. Este, aparentemente, começou a tuitar em janeiro de 2018, simplesmente encaminhando as mensagens do pré-candidato Jair Bolsonaro:


Quando ele começa finalmente a escrever, saíram balbucios e hashtags, tão só:


Talvez sejam códigos, fórmulas mágicas ou falhas de programação. De qualquer forma, escapa-se do debate público. Esse perfil não mais funcionou depois de 20 de outubro.
Se a pobreza lexical e a aridez da retórica denunciam claramente o rebaixamento do debate, as comparações descabidas, as falsas simetrias e os "argumentos" completamente impertinentes também tiveram seu lugar nos discursos da direita. Vejam que um deputado federal, decerto por completo desconhecimento da situação da segurança pública no Rio de Janeiro, acha que traficantes, quando matam negros, é por racismo, da mesma forma quando policiais tratam como suspeitos atletas que andam de táxi simplesmente por serem negras. Um tuíte de fevereiro:

No caso, esse político equivocado e, ainda por cima, reeleito em 2018, tentou diminuir o protesto da grande judoca brasileira, campeã olímpica e campeã mundial, Rafaela Silva. Trata-se de uma experiência de discriminação que vários negros no Brasil podem contar, ademais.
Não se podia esperar, de fato, nada a não ser nonsense quando um intelecto desse porte, em junho, tentou não naufragar nas águas tempestuosas da Teoria do Direito.


Não sei se Luigi Ferrajoli soube desse novo exegeta de sua obra, ou que ganhou o epíteto de "pai dos direitos humanos". Ele está muito bem conservado, faço notar, para alguém que deveria ter séculos de idade!
Este rebaixamento intelectual é a forma que restou para "fundamentar" as pautas da direita. O negacionismo climático, se não gerasse lucros para ninguém, certamente não existiria nem encontraria defensores na política defendendo-o a base do menosprezo a 99% da comunidade científica:


O ataque ao saber científico atinge diversas áreas, como a Antropologia, que se opõe aos interesses do agrobanditismo e da mineração no tocante às terras indígenas, a Ecologia, certamente, em razão desses mesmos interesses, e a Psicologia, especialmente no tocante à ideologia de gênero, homofóbica, transfóbica e machista, que é defendida pelos setores teocráticos. O absurdo deste tweet de fevereiro nasce da falsa simetria:


Imagino que o Conselho Federal de Psicologia, assim como a Associação Brasileira de Antropologia, sofrerão ataques do Executivo e do Legislativo. Mas a comunidade científica, como um todo, não será bem servida por esse governo, ao que parece.
O rebaixamento do debate também foi realizado pela direita por meio da estratégia de trocar os argumentos por xingamentos. Como esta referência ao cu por F. Bolsonaro, na época da denúncia ao Supremo Tribunal Federal do J. Bolsonaro por declarações racistas na Hebraica do Rio de Janeiro:


O STF rejeitou a denúncia, considerando que J. Bolsonaro estava protegido pela imunidade parlamentar. Na esfera cível, no entanto, ele foi condenado. O ano de 2018 acabou por trazer-nos mais uma prova irrefutável do racismo da cultura brasileira: alguém condenado judicialmente por declarações racistas encontrou votos em quantidade suficiente para vencer uma eleição nacional em segundo turno.
Não cito os candidatos da direita que fizeram da injúria uma grande arma eleitoral e que, agora, eleitos, estão fazendo o mesmo com seus eleitores, alguns dos quais já meio arrependidos (que ingênuos, no mínimo). Vejam que beleza já ficou esta busca no twitter: https://twitter.com/search?l=&q=cu%20from%3Aalefrotabrasil&src=typd [Ver nota abaixo]
Trata-se de outra modalidade de infantilização, mas, desta vez, por crianças mal educadas.
Lembro deste momento tão irônico, lembrando do que apareceria depois sobre Queiroz e outros assessores, de chamar o PT de "criminoso" por supostamente usar Fernando Haddad de "laranja":



Nesse campo, talvez o exemplo mais indigno tenha sido este, que reverberou por toda tuitosfera bolsonarista. O candidato referia-se a seu adversário fazendo uso da homofobia:


Até compreendo, tendo em vista um comum desprezo ao Brasil, que haja pessoas que sonhem que o país seja governado por pessoas desse tipo. O que me é incompreensível é pretender que o PT deveria ter aparecido nessa posse (ou "possession", segundo o inglês alternativo dos bolsonaristas).
Momento semelhante de indignidade, com a variação de chamar o candidato do PT de "prostituta", gerou uma discussão que leva a outra característica da tuitosfera bolsonarista:


Diversos vídeos e mensagens falsos ou equivocados (no caso dos distraídos e/ou analfabetos que tentaram votar em Bolsonaro no momento do voto em governador, por exemplo) de "fraude eleitoral" foram divulgados pelos bolsonaristas para tentar justificar por que a eleição não foi vencida no primeiro turno. Neste caso, um perfil de boa-fé tenta alertar outro de que está a divulgar um boletim de urna adulterado. O outro retruca que não vê problema nenhum em passar adiante a adulteração... O que nos leva a um dos pontos mais discutidos do ano, até porque se trata de uma das causas previstas em lei para anulação das eleições.

propagação de notícias falsas, ou uso estratégico de fake news, aconteceu em incontáveis momentos. Um dos mais absurdos aconteceu em março, quando milhares de notícias falsas foram veiculadas para caluniar Marielle Franco, recém-assassinada, no mais clássico estilo de culpabilizar as vítimas e de enlamear quem não pode mais se defender.
Alguns perfis de apoio a Bolsonaro (que não quis comentar o assassinato; aparentemente pensa que atentados políticos apenas são graves quando ele é a vítima) colheram a ocasião como estratégia eleitoral de combate à esquerda:


As notícias falsas da direita, além de difamar os mortos da esquerda, marcaram-se pela criminalização de movimentos sociais (tentando, por exemplo, igualar terroristas e pessoas em situação de rua) e de partidos políticos de esquerda. Vejam este deputado federal em maio, fazendo campanha a partir de desastres:


Em agosto, a fantasia infantil da URSAL, divulgada por Daciolo em um dos momentos de insanidade política que caracterizou 2018, acabou sendo também divulgada pela família B, talvez para não ficar atrás do outro candidato, como "plano de poder do PT":


Lembro agora da reação de Ciro Gomes ao candidato Daciolo quando este mencionou tal alucinação geopolítica, fantasma usado para atiçar a militância da direita. Depois, veio esta resposta da campanha de Ciro.
O assunto chegou em primeiro lugar no Brasil e chegou à lista dos dez mais discutidos no mundo pelos usuários do twitter em 10 de agosto:


Fernando Haddad foi alvo de diversas notícias falsas, a mais constante a do inexistente "kit-gay", jamais visto em escola alguma e presente quase que em todas as manifestações da campanha vitoriosa. Parece-me que algo tão absurdo somente pareceu crível porque se trata de uma fantasia alimentada pelo machismo e pela homofobia estruturais da sociedade brasileira. Para vários, o combate às minorias (uma promessa reiterada de J. Bolsonaro) misturou-se às promessas de linha dura no campo da segurança pública (mas delegando ao cidadão a própria proteção com o rearmamento...) no mesmo horizonte da promessa do extermínio.
Esses eleitores foram assim inspirados a realizar discursos e atos de ódio; vejam esta matéria da Pública sobre atentados cometidos por bolsonaristas, "Apoiadores de Bolsonaro realizaram ao menos 50 ataques por todo o país". Era o começo do segundo turno, mas a tendência não acabou nesse momento, pois a promessa da execução não deixa de ser reiterada, nem mesmo no ato simbólico da posse.
Voltando às notícias: as mulheres da esquerda que participaram das eleições foram vítimas preferenciais, como Manuela d'Ávila, naquele momento pré-candidata do PCdoB à presidência da república. Várias notícias falsas e montagens infames foram feitas com ela e sua filha, uma criança, que não reproduzirei aqui. Quero lembrar apenas de um dos momentos baixos do jornalismo nessas eleições, o programa "Roda Viva", na ocasião em que a sabatinou. Ela foi interrompida diversas vezes, e o programa decidiu chamar um colaborador da campanha de J. Bolsonaro como se fosse um entrevistador neutro. A pré-candidata manteve a calma todo o tempo, o que me impressionou. Um ponto que me pareceu particularmente baixo, e que se relaciona com esta nota, foi o da acusação feita por um jovem colunista de que ela fazia discursos de ódio nas redes (evidente caso de fake news). Ela lhe pede para ele apontar um exemplo de ela ter praticado "ódio nas redes". Obviamente ele não sabe dizer nenhum (tal é a qualidade desse jornalismo) e passa a interrompê-la para tentar impedir que ela responda (a ética jornalística também impressiona).
Entre as notícias falsas misóginas e machistas, vimos os tuítes com fotos absurdas para denegrir a campanha #EleNão, mobilizada especialmente pelas mulheres. Também não os reproduzirei; tampouco os da "mamadeira com piroca".
As notícias falsas não terminaram com a campanha. A tuitosfera bolsonarista parece ter percebido que sua mobilização terá que se manter. O método de campanha tentará tornar-se o método de governo, ao menos é o que o presidente eleito indicou em seus discursos de posse. Sua "fala foi um resumo de todos os tuítes postados por Jair Messias Bolsonaro (PSL)", como bem escreveu Igor Gielow na Folha de S.Paulo, "Discursos de Bolsonaro são coleção de tuítes temperada com messianismo".
Em dezembro, depois de Marco Aurélio ter decidido monocraticamente sobre a questão da prisão em segunda instância (teve a decisão revista pelo atual presidente do STF), esta foi uma das notícias falsas sobre ele divulgada:


A foto é de Ricardo Noblat, como se sabe. Esse é mais um dos perfis que nasceram em 2018. Este outro também teve uma intensa militância pró-Bolsonaro, por exemplo:


Ele foi um dos divulgadores de notícias falsas contra Miriam Leitão em outubro, depois de ela ter criticado, com razão, a ignorância econômica de Bolsonaro, que ela julgou impressionante (como presidente, deverá impressionar mais):



Em outubro, pulularam notícias falsas contra Amelinha Teles, que havia dado um testemunho da tortura que sofreu com o marido e os filhos, nas mãos daquele militar declarado torturador pelo Judiciário brasileiro, e autor preferido do presidente eleito. Aqui, fake news de um perfil que nasceu em setembro:




Nesses dois casos, vemos uma outra característica da tuitosfera bolsonarista, que é o de culto à ditadura militar, o negacionismo histórico e, certas vezes, a apologia de crimes contra a humanidade.
Isso gerou muitos perfis que adotaram o lema da ditadura militar, "Brasil, ame-o ou deixe-o", ressuscitado pelo SBT pouco depois do segundo turno das eleições, em 6 de novembro. A rede de televisão recuou nessa divulgação, mas seu esforço pró-ditadura rendeu frutos nas redes sociais até hoje: vários adotaram o lema, que foi criado em prol do banimento de opositores políticos, que havia sido "legalizado" por meio de ato institucional. O lema vem sendo empregado ao lado desta fórmula mágica que os bolsonaristas usam em debates: "Ustra neles", "Ustra vive" e variações, às vezes escritas desta forma: "Ulstra".
Como exemplo, um dos seguidores deste perfil que, para ilustrar o nacionalismo de ocasião da tuitosfera bolsonarista, faz parte de uma rede formada por arrobas em diversas línguas:


Alguns são perfis recentes, seguidos por arrobas semelhantes:


Ustra, o autor preferido de Bolsonaro, um dos maiores torturadores da ditadura militar, chegou a ser comparado, surpreendentemente por um membro da família B., com o ex-juiz que condenou o candidato original do PT, o presidente Lula. A condenação, todos lembramos, facilitou a campanha de seus adversários, especialmente a do antipetista Bolsonaro. Não adotando os critérios para ser cônjuge de César, o ex-juiz aceitou o convite, feito durante a campanha mas só revelado depois das eleições, de ser ministro da justiça do governo eleito com ajuda daquela decisão. O tuíte:


Trata-se de uma advertência do deputado federal reeleito? O futuro dirá. No presente, a alguns ele parece já estar desmorolizado, como antecipara em 2017 o próprio deputado reeleito, escrevendo o óbvio: se o então juiz abraçasse Bolsonaro seriam confirmadas as suspeitas da imprensa de que "agia com cunho político" e não jurídico:


O culto àquele torturador declarado pelo Judiciário brasileiro norteou diversos perfis:


A apologia aos crimes contra a humanidade é acompanhada, neste caso, do deboche sobre Marielle Franco, a falecida vereadora do Rio de Janeiro, eleita pelo PSOL, vítima de um dos assassinatos políticos mais chocantes da década. Os candidatos nas eleições de 2018 no ato da direita de quebra da placa com o nome dela, retratado pelo perfil, foram eleitos, entre eles o governador do Estado do Rio de Janeiro, que simultaneamente escarnece de vítimas de assassinato e promete ser linha-dura com criminosos. Não faz sentido, mas rendeu votos.
Há alguma coerência, no entanto, se se desejar que essa linha-dura atue de forma criminosa, violando garantias individuais, e, dessa forma, ela necessitaria de algo que poderia talvez ser chamado de "excludente de ilicitude", quase como se se presumisse a má-fé dos agentes públicos, temerosos de uma eventual comissão da verdade que os investigasse. Em um país em que tantos crimes são cometidos por agentes públicos, certamente essa ideia destina-se a criar mais conflitos e mortes.
No Rio de Janeiro, onde houve algo diferente, intervenção militar, e os militares temeram algo como esse tipo de comissão (pelo menos até o assassinato de Marielle Franco, que fez mudar ordem do dia), os crimes contra a vida aumentaram.

Daí segue uma característica que se cruza com diversas outras: boa parte da tuitosfera bolsonarista funciona com fundamento na violência, buscando intimidar os adversários políticos. Vejam o que este nostálgico da ditadura respondeu à Mídia Ninja:


São exemplos em número incalculável, à imagem de fungos brotando em madeira carcomida após a inundação. Instituições brasileiras também foram alvo dessa prática. Antes do episódio do cabo e do soldado, tivemos isto em junho a respeito do Supremo Tribunal Federal:

Os ataques à imprensa foram diversos, com hashtags chamando a Folha de papel higiênico, por exemplo, depois da matéria sobre o caixa 2 de empresas que financiaram o envio de mensagens pró-Bolsonaro pelo whatsapp. O perfil provinciano e não muito cultivado dessa direita, no entanto, às vezes fez com que ela errasse de alvo:



O Tribune de Genève é realmente de Genebra, ou seja, da Suíça. Ter uma seção dedicada ao "mundo", como fazem todos os grandes jornais, mesmo no Brasil, não o torna parte do jornal francês Le Monde (que é de direita aliás; nessa ocasião, ele foi chamado de esquerdista por seguidores do candidato).
No curioso evento da posse, jornalistas não só tiveram de sentar no mármore sem acesso a água e banheiro. Conta Monica Bergamo que eles foram ameaçados de morte: "Fotógrafos não deveriam erguer suas máquinas. Qualquer movimento suspeito poderia levar um sniper [atirador de elite] a abater o 'alvo'.". Evidentemente, não se trata de mero acaso ou ameaça, trata-se de um traço definidor deste modo antidemocrático de fazer política, que nega a esfera pública.

Outro forma de sabotar a esfera pública, como escrevi lá em 2017, e acho que todo mundo também, dá-se na presença de perfis falsos (uma espécie de fake news ontológico, talvez). Daquela vez, mencionei o significativo o fenômeno de uma petição pela candidatura de Bolsonaro cujo número de signatários superava o de eleitores do Brasil:


As condições do anonimato nas redes sociais tornam a situação mais difícil de discernir. Vejam este perfil criado em janeiro deste ano eleitoral; a quem se refere?



Este perfil que pretendia passar que Alvaro Dias fazia campanha para o Bolsonaro. Neste caso, usou-se o truque de trocar o "l" do nome por um "I". Continua no ar, mas não logrou muito entusiasmo:



Os perfis e notícias falsos terão importância para a "governabilidade" de uma chapa para cuja eleição eles foram tão relevantes? Não sei. Muitos bots foram silenciados depois das eleições: https://twitter.com/Lu_Marandes/status/1079334538751459328
No entanto, já em novembro nasceram perfis cujo objeto de atuação na rede é o elogio às escolhas ministeriais e aos demais atos do futuro governo, alguns deles tentando se fazer passar pelo presidente eleito:


Era previsível, de acordo com a internacionalização da direita, que um perfil desse tipo fosse seguido por perfis que tuítam em outras línguas, inclusive trumpistas:


Talvez, em alguns casos, já que tantos houve, tenha havido ilegalidades no campo do direito eleitoral. O PT está tentando cassar a chapa de Bolsonaro. Se conjecturarmos, pelo singelo amor à especulação, de que houve crime eleitoral e caixas de diversos números, e que isso fosse fartamente provado, apesar de a Justiça Eleitoral ter-se mantido inerme nesse campo durante a campanha, nada nos permitiria concluir qual seria a decisão do Judiciário. Lembremos que a chapa Rousseff/Temer não foi cassada pelo TSE em 2017 apesar de todas as provas, com votos dos Ministros indicados por Temer e de Gilmar Mendes, que venceram a posição do Ministro Herman Benjamin. Na situação minoritária de querer aplicar a lei, ele celebremente afirmou:"eu, como juiz, recuso o papel de coveiro de prova viva. Posso até participar do velório, mas não carrego o caixão".

Seria crível que um governo tentasse funcionar da mesma forma como a eleição foi vencida? A retrospectiva de 2019, portanto, será parecida com a da campanha de 2018?  A mobilização que logrou despertar se manterá no apoio ao presidente, ou se dissipará com as decepções que virão?
Questões difíceis. Mas algo inquieta: o fato de o discurso de posse ter escolhido problemas imaginários (combate ao socialismo, impedir que a bandeira se torne vermelha etc., estratégia eleitoral que encontrou êxito), talvez seja final de que não se pode, ou não se quer, enfrentar as questões reais.


P.S. em 2 de janeiro de 2019: Leiam esta fascinante história que Mari Messias conta sobre fake news e explica por que o perfil do deputado desapareceu (tal como o antigo do Queiroz). Por essa razão, a busca que indiquei não dá mais resultado. No entanto, salvei as diversas mensagens da nova retórica política antes de essa exclusão ocorrer. Esta foi só a primeira página daquela busca:



Depois da retórica da extrema-direita, o que dizer de igual grandeza e elevação? Completamente falto de palavras próprias, que sempre seriam demasiado pequenas, só me resta encerrar esta nota com a Bíblia cristã: Evangelho segundo São Mateus, capítulo 12, versículo 34: "[...] a boca fala do que está cheio o coração."