O palco e o mundo


Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras. Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem".

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sexta-feira, 21 de junho de 2024

Desarquivando o Brasil CC: Uma nota sobre Chico Buarque e censura na ocasião de seus 80 anos

Tive a ideia de escrever esta nota porque, em 19 de junho de 2024, aniversário de oitenta anos de Chico Buarque, o jornalista Evandro Éboli publicou no Twitter um documento da Censura sobre a peça Roda Viva, em que o censor Mario F. Russomano indagava se "Francisco Buarque de Holanda" seria "débil mental". 

A imbecilidade da questão sobre um dos artistas mais brilhantes da história do Brasil refletia bem  o rebaixado estado mental da ditadura militar.

O documento, explicou Éboli, estava exposto no Arquivo Nacional em um banner que o então ocupante da presidência da república, o militar Jair Bolsonaro (outra "página infeliz de nossa história"), negacionista nos planos da ciência e da história, mandou retirar:



As expressões "de baixo calão" que ofenderam os censores tinham sido contribuições de Zé Celso, o saudoso indisciplinador de mentes e corpos, que dirigia a peça. Exatamente por causa das mudanças no texto, a Censura havia decidido voltar a examinar o espetáculo; neste despacho de 25 de janeiro de 1968, o Censor Federal Augusto da Costa explica que "nas seguintes apresentações para o público, as marcações foram acrescidas de novas ideias que ocorreram ao seu diretor no afã de procurar um aprimoramento para o espetáculo, que deram ao mesmo nova dimensão quanto a restrição de idade", sugerindo o limite de 18 anos:



A peça sofreu ataques dos grupos da extrema-direita (Marília Pêra foi espancada grávida em São Paulo pelos fascistas do CCC, o Comando de Caça aos Comunistas, que invadiram o teatro de Ruth Escobar) e acabou sendo proibida. A peça Calabar: o elogio da traição, de 1973, que escreveu com Ruy Guerra, também seria censurada. Em 2018, meio século depois, Zé Celso remontou Roda viva no Teatro Oficina. 

Chico Buarque foi censurado como compositor e dramaturgo, o que é amplamente conhecido. Sabe-se também do exílio de precaução que ele viveu na Itália de 1969 a 1970. Depois de voltar ao Brasil, ele continuava a ser vigiado, inclusive no exterior. Nesta edição de 1973 do Boletim Comunismo Internacional, um documento reservado do SNI, sua viagem à Argentina foi enquadrada como "campanha contra o Brasil no exterior". Passo agora a reproduzir documentos que estão no Fundo DEOPS/SP do Arquivo Público do Estado de São Paulo:



Ele teria dito que "as circunstâncias atuais fazem com que toda a música seja política [...]; toda a música está cumprindo uma função política, na medida em que é utilizada de acordo com planos bem claros." Era a época do chamado "circuito universitário" de apresentação de artistas:



Ele disse preferir essas apresentações à televisão. No entanto, os estudantes também eram um grupo suspeito para a ditadura. Por isso, os agentes da repressão acompanhavam-no. Vejam como o delegado Romeu Tuma (um dos 377 autores de graves violações de direitos humanos segundo o relatório da Comissão Nacional da Verdade) escrevia em código os nomes de Chico Buarque e do MPB-4, querendo saber se tinha havido agitação estudantil e propaganda subversiva nesta apresentação de outubro de 1972:



Não tinha ocorrido nenhuma agitação desse tipo. No entanto, ele era um artista visado: "você não gosta de mim, mas sua filha gosta", ele escreveria no ano seguinte sob o pseudônimo de Julinho da Adelaide, criado para escapar da marcação cerrada da censura. O Centro de Informações do Exército (CIE) caracterizava o artista em termos de "proselitismo desagregador", "mantendo os estudantes em permanente expectativa política":



Vejam que foram incluídos nessa categoria de artistas incômodos à ditadura Alaíde Costa, Capinan, Edu Lobo, Egberto Gismonti, Gilberto Gil, Gonzaguinha, Jards Macalé, Marília Medalha, Milton Nascimento, MPB-4, Nara Leão, Sérgio Ricardo, Trio Mocotó, Vinicius de Moraes e Ziraldo. Bela lista.

Na soi-disant abertura, ele continuava a ser censurado, claro, assim como outros artistas. Em 1977, ocorreu a censura dessa apresentação dele com Bibi Ferreira, Edu Lobo, Milton Nascimento  e MPB-4, todos considerados pelas autoridades como "artistas tradicionalmente contestadores ao regime". A apresentação teve de ser adiada e o local, mudado. 



Trata-se de um informe de 12 de julho de 1977 da Coordenação de Informações e Operações da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo. Já haviam sido vendidos três mil e trezentos ingressos.

Apesar disso, a ditadura militar chegou a usar sua música sem autorização: "A banda", um de seus primeiros sucessos, com sua letra inofensiva para o regime, foi capturada para incentivar o alistamento militar, o que provocou o protesto do músico. Esta é a notícia que saiu no boletim de março de 1972 do boletim de março de 1972 do "Frente Brasileño de Informaciones", o irônico FBI dos exilados (só no exterior as denúncias deles podiam ser ouvidas, em razão da censura no Brasil), editado no Chile:



Lembro disso porque, meio século depois, na campanha eleitoral de 2022, o membro da família Bolsonaro que os paulistas se acostumaram a eleger como deputado federal se apropriou de "Roda viva", nada menos, para suas redes sociais, em postagem que pretendia que o Brasil estaria sob censura porque bolsonaristas estavam sendo processados!

Chico Buarque, um conhecido apoiador de Lula, processou o político. A magistrada Monica Ribeiro Teixeira inscreveu seu nome na longa história de conflito do Judiciário com os artistas brasileiros indeferindo o pedido sob o insólito pretexto de que não havia prova de que a canção de 1967 era de sua autoria

Vejam o compositor com o MPB-4 defendendo a canção no Festival da Record: https://www.youtube.com/watch?v=3ALZNNUQdYM. Ela ficou em terceiro lugar, depois de "Ponteio", de Edu Lobo e Capinan, a vencedora, e "Domingo no parque", de Gilberto Gil. Em quarto, "Alegria, alegria", de Caetano Veloso. Que ano para a música popular brasileira! Se o Judiciário tivesse memória... O próprio direito à memória encontra dificuldades no campo judicial, problema que já abordei aqui e alhures algumas vezes.

Proposta nova ação contra o deputado federal, o juiz Fernando Rocha Lovisi mandou que a postagem fosse retirada. Era dezembro de 2022, aquele filho do ainda ocupante da presidência já estava reeleito. O estrago que a postagem podia causar, no sentido de ganhos eleitoreiros para o violador dos direitos do compositor, já estava feito, porém.

Curiosamente, em agosto de 2023, o Judiciário reconheceu o abuso mas não determinou indenização para Chico Buarque, embora ele tivesse ganhado indenização em outro processo, contra o Bolsonaro que é senador pelo Rio de Janeiro, que usou sua imagem em postagem em redes sociais.

A ação judicial deve durar alguns anos e não deixa de mostrar que nem tanto mudou no estado mental de nossas autoridades, o que a volta explícita dos militares ao poder, ensejada pelo golpe de 2016, pareceu tristemente comprovar: eles continuaram os mesmos.

Felizmente, pode-se constatar algo semelhante em Chico Buarque: ao contrário de alguns de seus colegas, ele permaneceu fiel a si mesmo ao longo das décadas e nunca "estancou" ou "deixou de cumprir".


sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Retrospectiva 2019: Ataques oficiais à memória, à verdade e à justiça (Desarquivando o Brasil CLXI)

Houve diversas manifestações públicas contra a administração federal que começou oficialmente no ano de 2019. O tema da ditadura militar apareceu em algumas ou várias delas, pois a eleição de apologistas dos crimes contra a humanidade e do passado autoritário deu uma nova atualidade à questão nunca superada da justiça de transição. Devemos lembrar que a apologia àqueles crimes e à ditadura teve um papel importante no golpe de 2016 e projetou aqueles que se encarregaram de prosseguir a tarefa política, econômica, social, cultural do que se chama de golpe, palavra que é um eufemismo, na verdade, para a corrosão que é o novo status quo do Brasil.
A nova internacional da extrema-direita, a que se reportam representantes do governo, inclui entre suas estratégias de disseminação de notícias falsas as referências distorcidas a regimes autoritários, que são heroicizados. 
Portanto, era de esperar que 2019 se compusesse de ataques à memória política, de manifestações oficiais em prol do autoritarismo, de ataques estatais às instituições democráticas, de impunidade para autores de crimes contra a humanidade passados e presentes. Abaixo, segue uma lista demasiado sumária desses fatos do opróbrio político tornado rotina administrativa. Incluí mortes de alguns militantes históricos.


24 de janeiro: Jean Wyllys, reeleito deputado federal pelo Psol-RJ, torna-se o primeiro exilado político do novo regime, em razão das ameaças dirigidas contra ele e sua família, e não assume o mandato. Continua no exterior até hoje. O ocupante da presidência da república escreve no twitter, simplesmente, "Grande dia!".

8 de março: A Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat cobra explicações a Damares Alves, ministra dos direitos humanos, sobre a paralisação dos colegiados ligados ao ministério, inclusive a Comissão de Anistia.

11 de março: A professora e escritora Márcia Tiburi, que foi candidata ao governo do Estado do Rio de Janeiro em 2018 pelo PT, não eleita, revela que deixou o país em dezembro de 2018 por causa das ameaças de morte recebidas.

26 de março: Os procuradores Deborah Duprat, Domingos Sávio Dresch da Silveira, Marlon Weichert e Eugênia Augusta Gonzaga assinam a declaração "É incompatível com o Estado Democrático de Direito festejar um golpe de Estado e um regime que adotou políticas de violações sistemáticas aos direitos humanos e cometeu crimes internacionais" contra a recomendação de Jair Bolsonaro de comemoração dos 55 anos do golpe de 1964.

27 de março: O Ministério da Defesa publica a "Ordem do Dia Alusiva ao 31 de março de 1964", assinada pelo Ministro Fernando Azevedo e Silva, defendendo o golpe do Primeiro de Abril de 1964, e, em pleno negacionismo histórico, afirmaram que "Cinquenta e cinco anos passados, a Marinha, o Exército e a Aeronáutica reconhecem o papel desempenhado por aqueles que, ao se depararem com os desafios próprios da época, agiram conforme os anseios da Nação Brasileira. Mais que isso, reafirmam o compromisso com a liberdade e a democracia, pelas quais têm lutado ao longo da História."

27 de março: Ernesto Araújo, Ministro das Relações Exteriores, no modo negacionista a todo vapor (que o Itamaraty voltou a assumir, depois de cumprir o papel de espião de exilados, de contrainformação no exterior e de coordenação internacional da repressão política de 1964 a 1985), afirma que não houve golpe em 1964, mas um movimento para que o Brasil não se tornasse uma ditadura.

27 de março: Portaria nº 376 da Ministra de Direitos Humanos, Damares Alves, que modifica a Comissão de Anistia e aumenta o peso governamental no órgão.

28 de março: Portaria nº 378 nomeia os novos membros da Comissão de Anistia para incluir membros contrários à anistia política.

29 de março: O ocupante da presidência da república lê mensagem de justificativa do golpe de 1964 em solenidade diante do Comando Militar. Mais tarde, no mesmo dia, foi prolatada a decisão da juíza Ivani Silva da Luz, da 6ª Vara da Justiça Federal do Distrito Federal,  impediu o governo federal de comemorar o golpe de 1964: "Nesse contexto, sobressai o direito fundamental à memória e à verdade, na sua acepção difusa, com vistas a não repetição de violações contra a integridade da humanidade, preservando a geração presente e as futuras do retrocesso a Estados de exceção". Tratava-se de uma ação civil pública proposta pela Defensoria Pública da União.

30 de março: Decisão da desembargadora Maria do Carmo Cardoso, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), permitiu as comemorações por entendê-las no "âmbito do poder discricionário do administrador".

3 de abril: O então ministro da educação, Ricardo Vélez, firme em sua tarefa deseducativa, afirmou que não houve golpe em 1964. Em falsidade evidente, declarou ao Valor Econômico que Castelo Branco tomou o poder desta forma: "Foi a votação no Congresso, uma instância constitucional, quando há a ausência do presidente. Era a Constituição da época e foi seguida à risca." Anunciou ainda mudança nos livros didáticos para que essas falsidades negacionistas sejam ensinadas nas escolas.

4 de abril: O governo federal enviou ao Relator especial da ONU sobre Promoção da Verdade, Justiça, Reparação e Garantias de Não Repetição, Fabian Salvioli, telegrama no teor de que "não houve um golpe de Estado, mas um movimento político legítimo que contou com o apoio do Congresso e do Judiciário, bem como a maioria da população.", e que as mais de duas décadas de governo militar foram necessárias para evitar o comunismo. A matéria é da BBC News Brasil, que teve acesso à comunicação confidencial. O negacionismo tornou-se política do Estado tanto no campo nacional quanto no internacional.

7 de abril: O músico Evaldo Rosa dos Santos é executado com mais de oitenta tiros por soldados do Exército quando passava com seu carro pela Estrada do Camboatá para ir a um chá de bebê. Seu sogro, Sérgio Araújo, é atingido também. O catador Luciano Macedo, ao tentar ajudá-lo, é alvejado e morre dias depois. No mesmo dia, o Comando Militar do Leste emite nota chamando as vítimas de "assaltantes". No entanto, a execução foi filmada. No dia seguinte, depois da indignação generalizada, ele refaz a nota, explica que foi determinada a prisão em flagrante dos militares envolvidos e informa que "esses militares passam à disposição da Justiça Militar da União".

9 de abril: O ex-juiz e ainda ministro da justiça, antes de ser apontado pela série de reportagens do jornal The Intercept como violador do sistema acusatório na Lava-[a-]Jato, chama, em um programa televisivo de entrevistas, a execução de Evaldo Rosa dos Santos de “um incidente bastante trágico”, acrescentando “lamentavelmente esses fatos podem acontecer”. O eufemismo é uma das figuras de linguagem preferidas dos poderosos.

11 de abril: Jair Bolsonaro assina mais um decreto de ataque à democracia participativa, de número 9759, com a ementa eufêmica "Extingue e estabelece diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal.", que acaba com colegiados, o Grupo de Trabalho Araguaia e o Grupo de Trabalho de Perus, que busca identificar ossadas de desaparecidos políticos ocultadas no Cemitério de Perus, em São Paulo. No entanto, esse Grupo existe por determinação judicial e acabou sendo mantido, apesar do Executivo federal.

12 de abril: Depois de toda a campanha negacionista do governo federal acerca das graves violações de direitos humanos do passado, o ocupante da presidência da república afirmou, em resposta à indignação pela execução sumária de Evaldo Rosa dos Santos, uma morte do presente, que "O Exército não matou ninguém não, o Exército é do povo. A gente não pode acusar o povo de ser assassino não". Uma metonímia completamente abusiva, com a finalidade de ocultar o contrário: para os autoritários, o povo pertence ao Exército e por este deve ser governado.

18 de abril: Morte de Luciano Macedo, depois de descumprida a ordem judicial de que fosse transferido para um hospital com mais recursos.

22 de abril: O Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro publica nota de repúdio à extinção dos Grupos de Trabalho Araguaia e de Perus.

22 de abril: A ministra Damares Alves anuncia a continuidade do Grupo de Trabalho de Perus.

3 de maio: O Ministério Público Federal propõe ação para a nulidade da Portaria do Ministério de Direitos Humanos que descaracterizou a Comissão de Anistia, nomeando membros contrários à anistia política: "vê-se que 07 membros nomeados para a nova composição do Conselho da Comissão de Anistia são agentes de carreiras ou têm histórico e postura públicos que são INCOMPATÍVEIS com a função do órgão, seja por manifesta contrariedade à política pública de reparação das vítimas de Estado ou devido à atuação judicial contrária à política de reparação, ou ainda por se posicionarem contrários à instauração da Comissão Nacional da Verdade, seja porque integram as forças coercitivas do Estado". 

5 de maio: A procuradora Deborah Duprat critica a tentativa da ministra de direitos humanos, Damares Alves, de indicar o procurador Aílton Benedito de Souza, apoiador de Bolsonaro e defensor da ditadura militar, à vaga do Ministério Público Federal da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos.

23 de maio: O Superior Tribunal Militar liberta os militares presos preventivamente no caso de Evaldo Rosa dos Santos.

1º de junho: Inesperadamente, Jair Bolsonaro assume a existência da Operação Condor para a imprensa argentina, o jornal La Nación, mas em tom de elogio.

19 de junho: Morre Lúcio Bellentani, operário preso em 1972 na Volkswagen em São Bernardo e nela torturado, e depois entregue ao DEOPS/SP, onde sofreu mais sevícias. Em programa da TVT do início de junho, ele ainda pôde dar seu depoimento sobre a colaboração da empresa alemã com a repressão aos trabalhadores; é triste vê-lo contar que procurara colegas que forem presos, porém muitos já haviam morrido: https://youtu.be/Z8nitaNtEw0?t=1466

19 de junho: O senador Flávio Bolsonaro, (senador do Rio de Janeiro pelo PSL e acusado de lavagem de dinheiro pelo Ministério Público) filho do ocupante da presidência da república, indaga a Sergio Moro, em audiência público, sobre um possível uso da lei de segurança nacional contra Glenn Greenwald e seu marido, o deputado federal David Miranda, que assumiu o mandato no lugar de Jean Wyllys, por causa das reportagens do The Intercept que desmascararam o óbvio (embora ainda negado por vários), o caráter político da Lava-[a-]Jato e o lawfare.

25 de junho: Morte de Elzita Santa Cruz, aos 105 anos, que ainda buscava notícias sobre seu filho Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, um dos desaparecidos pela ditadura militar.

11 de julho: Matéria do The Guardian, "New generation of political exiles leave Bolsonaro's Brazil 'to stay alive'', sobre a nova geração de exilados políticos do Brasil, com Jean Wyllys, Marcia Tiburi, Anderson FrançaDebora Diniz, que teve de deixar o país ainda antes das eleições de 2018.

24 de julho: É expedida a certidão de óbito retificada de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, que foi vítima de desaparecimento forçado pela ditadura militar em 1974. Incluiu-se que se tratou de morte "não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro". O documento foi assinado pela presidenta da Comissão especial sobre mortos e desaparecidos políticos (Cemdp), Eugênia Augusta Gonzaga.

27 de julho: Jair Bolsonaro, em mais um momento de ditadura reloaded, ameaça o jornalista Glenn Greenwald de prisão, depois das matérias do The Intercept e veículos parceiros (como a Folha de S.Paulo e a Veja), com base em mensagens interceptadas, que mostram que o atual ministro da justiça agia não como juiz, mas como parte acusadora no processo contra o ex-presidente Lula, junto com o procurador Deltan Dallagnol, e que a condenação ocorreu por perseguição política. Sabe-se também que Moro havia sido convidado a deixar o Judiciário e a participar do governo de Bolsonaro ainda durante as eleições. A evidente nulidade da condenação de Lula e, em um estado de direito (que não há mais no Brasil), a exigência de investigação dos membros do Judiciário e do Ministério Público envolvidos são explicadas pelo próprio Moro neste vídeo, feito antes de ele ser desmascarado: https://twitter.com/davidmirandario/status/1138073779035344896

29 de julho: Jair Bolsonaro, sobre Felipe Santa Cruz, filho do desaparecido Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, afirma:  "Um dia, se o presidente da OAB quiser saber como é que o pai dele desapareceu no período militar, conto pra ele. Ele não vai querer ouvir a verdade. Conto pra ele. [...] O pai dele integrou a Ação Popular, o grupo mais sanguinário e violento da guerrilha lá de Pernambuco e veio desaparecer no Rio de Janeiro". A OAB e a Associação Juízes para a Democracia publicaram repúdios ao insulto no mesmo dia.

30 de julho: Como na ditadura militar, a sede da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) serve de palco para ato em desagravo a jornalista ameaçado politicamente pelo governo: Glenn Greenwald.

1º de agosto: A procuradora Eugênia Augusta Gonzaga é exonerada da presidência da Cemdp, entre outras alterações da Comissão, que incluíram nomes sem relação com o tema, admiradores da ditadura, subordinados ao governo federal, e até com a interferência de Bolsonaro no Ministério Público Federal (na indicação por ele do procurador Ailton Benedito de Souza para a vaga do MPF), ferindo, segundo explicou Gonzaga, o princípio constitucional da moralidade administrativa. 
Em palestra que filmei no seminário dos 40 anos da Lei de Anistia, que ajudei a organizar, a procuradora afirma que o que Bolsonaro afirmou publicamente parecia ser "plantar contrainformação", como Curió fazia. Em outro trecho, ela conta das pressões, por conta das certidões de óbito retificadas, que sofreu por parte do novo presidente da Cemdp, Marco Vinicius Pereira de Carvalho.

6 de agosto: O Conselho do MPF não aprovou a indicação do procurador apoiador de Bolsonaro, solicitada pelo próprio ocupante da presidência da república, para a Cemdp. 

6 de agosto: O Ministério Público Federal pede explicações à Ministra de Direitos Humanos sobre as alterações na composição da Cemdp.

8 de agosto: O ocupante da presidência da república chama Brilhante Ustra, falecido em 2015 de causas naturais, antigo chefe do DOI-Codi/SP, um dos autores de graves violações de direitos humanos listado pela Comissão Nacional da Verdade, e declarado torturador ainda em vida pelo Judiciário brasileiro, de "herói nacional". Ele fez a declaração no dia em que se encontraria com a viúva. 

13 de agosto: A ONU (cito matéria de Jamil Chade) exige esclarecimentos sobre as informações que Jair Bolsonaro teria sobre o desaparecimento forçado de Fernando Augusto de Santa Cruz Oliveira, crime ocorrido durante a ditadura militar. 

13 de agosto: A ministra dos direitos humanos, Damares Alves, anuncia o cancelamento da construção do Memorial da Anistia Política do Brasil, em Belo Horizonte. A decisão viola compromisso internacional assumido pelo Estado brasileiro no caso Gomes Lund e outros vs. Brasil, sobre a Guerrilha do Araguaia.

15 de agosto: Nota pública de protesto do Comitê Assessoramento da Sociedade Civil para Anistia em razão do cancelamento da construção do Memorial da Anistia Política do Brasil.

19 de agosto: O Ministério Público Federal pede esclarecimentos à ministra Damares Alves sobre o cancelamento da construção do referido Memorial.

4 de setembro: O ocupante da presidência da república, diante da crítica ao Estado brasileiro feita pela Alta Comissária da ONU para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, em razão da "redução do espaço democrático" e dos ataues aos defensores da natureza e dos direitos humanos, faz ataques pessoais a Bachelet: "Diz ainda que o Brasil perde espaço democrático, mas se esquece que seu país só não é uma Cuba graças aos que tiveram a coragem de dar um basta à esquerda em 1973, entre esses comunistas o seu pai brigadeiro à época”. O General Alberto Bachelet, o pai, foi assassinado pela ditadura de Pinochet.

10 de setembro: O Estado brasileiro nega à ONU que tenha ocorrido um golpe de Estado em 1964.

12 de setembro: A estreia do filme Marighella, dirigido por Wagner Moura, sobre o revolucionário comunista morto pela ditadura militar, é impedida pela Ancine (Agência Nacional do Cinema).

25 de setembro: O Superior Tribunal de Justiça mantém o trancamento da ação penal do Riocentro (a tentativa de atentado terrorista do Exército em uma festividade do Primeiro de Maio durante o governo de Figueiredo, que seria atribuída à esquerda e justificaria o fim da abertura política). O relator, Ministro Rogerio Schietti Cruz, votou pela reabertura, mas sua posição, e do Ministério Público Federal, foi derrotada.

27 de setembro: Vladimir Aras decide escolher Aílton Benedito de Souza para a Secretaria de Direitos Humanos da Procuradoria-Geral da República.

29 de setembro: O Ministério Público Federal propõe ação para a retomada da construção do Memorial da Anistia Política do Brasil. 

30 de setembro: O Ministério Público Federal, diante das diversas ilegalidades e do aparelhamento ideológico realizado pelo governo Bolsonaro, propõe ação pedindo anulação do decreto que alterou a composição da Cemdp.

10 de outubro: A 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, de São Paulo, mantém a impunidade no caso do jornalista Luiz Eduardo Merlino, torturado e assassinado no DOI-Codi. Pode-se ler a matéria do El País, que deixa de identificar Adriano Diogo, Amelinha Teles e Criméia Schmidt de Almeida; escrevi uma nota sobre o caso em 2018: https://opalcoeomundo.blogspot.com/2018/10/desarquivando-o-brasil-cxlvii-merlino.html

25 de outubro: Publicada a lei nº 10.018, de 7 de outubro de 2019, de São José dos Campos (no Estado de São Paulo) que "Denomina o viaduto da Via Cambuí, que passa sobre a Rodovia Presidente Dutra, de Viaduto Romeu Tuma." A homenagem ao ex-diretor do DEOPS/SP foi aprovada por unanimidade. Sua autoria foi compartilhada por dois vereadores do PSDB, Juvenil Silvério e José Dimas.
Escreverei um pouco mais sobre a questão, em vez de apenas indicar uma ligação na internet para o caso, porque a imprensa não a cobriu bem, como se os autoritarismos locais não fossem importantes para a formação de uma cultura política infensa aos direitos humanos, ou não servissem de base local para os desmandos nacionais. 
A discussão legislativa foi pífia. Na Comissão de Justiça, Redação e Direitos Humanos da Câmara, o parecerista deixou de realizar seu trabalho e o prazo se esgotou em 3 de setembro; tampouco foram apresentadas emendas. Em 21 de janeiro de 2019 certificou-se o "Decurso de prazo sem que tenham sido apresentadas emendas e encaminhamento do processo às Comissões Permanentes para parecer."
Em 2019, verificando-se a falta do parecer, reencaminhou-se à Comissão, agora com uma nova composição. Presidida pelo vereador Juvenil Severo (PSDB), com o relator Dilermando Dié de Alvarenga, do mesmo partido, e o membro Juliana Fraga, do PT. O suplente do relator, Marcão da Academia, do PT, foi designado para elaborar o parecer, que pode ser considerar um exemplo típico da atividade dos Legislativos municipais no Brasil:


As características, a saber, a ausência de análise do mérito da proposta, a omissão de manifestação a respeito da concordância com os direitos humanos, ou seja, o próprio objetivo da Comissão (para não dizer do Estado brasileiro), e, enfim, a atribuição de um caráter pueril à atividade legislativa na própria dimensão material no parecer, cujo texto se estende, descontando título e assinatura, por duas linhas e uma palavra.
Romeu Tuma não está entre os autores de graves violações de direitos humanos listados pela Comissão Nacional da Verdade. No volume I do relatório da CNV, afirma-se que ele estava envolvido com a repressão política:
213. Com a perda de poder e influência do DOPS/SP, assumiu sua diretoria-geral uma figura mais palatável (apesar de envolvido com a repressão), o ex-chefe do Serviço Secreto, Romeu Tuma. Investigador, delegado de polícia concursado, bacharel em direito pela PUC-SP, foi diretorgeral do DOPS paulista de 1977 até 1982. Embora não haja provas de que Tuma tenha participado de sessões de tortura no DOPS/SP, é fato que trabalhou por anos em edifício onde isso ocorria, chefiando seu Serviço Secreto. Durante a gestão de Tuma, o DOPS/SP acabou e, em 1982, foi eleito governador o senador Franco Montoro, quando sua equipe de governo anunciou que extinguiria o órgão. No governo Figueiredo, Tuma foi superintendente da Polícia Federal (PF) em São Paulo, e vários delegados e agentes que trabalharam na repressão o acompanharam.
A Comissão da Verdade Michal Gartenkraut, de São José dos Campos, foi uma iniciativa do legislativo municipal. Por isso, é escandaloso que os vereadores tenham-na ignorado no trâmite do projeto de lei. O documento (que não consegui encontrar no portal da Câmara, e está entre os documentos não digitalizados do acervo da CNV no Arquivo Nacional, mas pode ser lido no sítio da vereadora Amélia Naomi, do PT, que a presidiu) menciona Romeu Tuma no caso da repressão política ao metalúrgico João Batista dos Santos, ex-militante do MEP – Movimento pela
Emancipação do Proletariado e do PT.
Romeu Tuma também foi incluído entre os suspeitos dessas violações pela Comissão da Verdade do Estado de São Paulo "Rubens Paiva". Essa Comissão, entre suas recomendações, em 2015, previu a revisão das homenagens àqueles violadores, bem como a proibição de novas homenagens:
Repressão política: origens e consequências do Esquadrão da Morte
3. Proibição de homenagens a agentes públicos que são autores de graves violações dos direitos humanos, incluindo reformulação de leis que nomeiam ruas, alamedas, avenidas e rodovias com nomes de agentes acusados de autoria de assassinatos e torturas; 
Lugares da Memória, Arqueologia da Repressão e da Resistência e Locais de Tortura
12. Que o Estado de São Paulo e as municipalidades promovam um levantamento dos nomes de logradouros que homenageiam torturadores ou militares que atuaram durante a ditadura com a legitimação das violações aos direitos humanos no período, que tal medida seja tomada em até doze (12) meses a partir da publicação deste relatório;
13. Que sejam alterados os nomes de logradouros públicos que homenageiam ditadores, torturadores e similares que atuaram durante a ditadura com a legitimação das violações aos direitos humanos no período, evidenciando nesse processo suas diferentes nomenclaturas e os motivos que justificam as escolhas, alterando por seus nomes anteriores, toponímicos, ou em homenagem a lideranças comunitárias de destaque ou pessoas que atuaram para a consolidação da democracia no país; que tal medida seja tomada em até doze (12) meses a partir da publicação deste relatório. 
A Comissão "Rubens Paiva" menciona Romeu Tuma nos casos de Antônio Gulherme Ribeiro Ribas e Jaime Petit da Silva.

28 de outubro: O novo Procurador-Geral da República, Augusto Aras, escolhido por Jair Bolsonaro fora da lista tríplice da instituição, decide desistir da ação proposta pela antecessora, Raquel Dodge, nos estertores de seu mandato, que pedia indenização ao povo Guarani em razão dos diversos crimes cometidos para a construção da Usina de Itaipu.

31 de outubro: O Ministro Alexandre de Moraes defere o pedido do Procurador-Geral da República e arquiva a ação que pedia indenização ao povo Guarani. Note-se que as violações de direitos humanos provocadas para a construção de Itaipu estão documentadíssimas e há um farto material que foi coligido para o relatório da Comissão Nacional da Verdade.

31 de outubro: O deputado federal Eduardo Bolsonaro defende, em entrevista a um canal do youtube de um dos jornalistas apoiadores do governo do pai dele, Leda Nagle, a edição de um novo AI-5 contra a esquerda, se ela agir como a do Chile de hoje (isto é, indo às ruas e sendo baleada e torturada).

4 de novembro: O ENEM, pela primeira vez em dez anos, expurga o assunto da ditadura militar em sua prova, e o ministro da educação, Abraham Weintraub, justifica afirmando que não participou da escolha das questões e que o objetivo da prova "não é dividir, nem polemizar, nem doutrinar", e ainda minimizou o assunto: ""A gente já pode começar falando em regime militar, ditadura militar. Essa é uma discussão que eu acho que a gente não vai caminhar para nenhum lugar". O pai do ministro, Mauro Weintraub, que eele e o irmão Arthur tentaram interditar, foi perseguido pela ditadura.

18 de novembro: A nova Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos propôs a transferência das ossadas de Perus para Brasília, tirando o trabalho de identificação dos desaparecidos das mãos do Centro de Antropologia e Arqueologia Forense (CAAF), da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), entregando-o para a Polícia Civil. Os Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos protestam contra a decisão de entregar essa função a uma das instituições responsáveis pelos crimes, e interromper os trabalhos bem-sucedidos do CAAF.

20 de novembro: A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP) aprova a realização no dia 10 de dezembro de 2019 de ato solene em homenagem ao falecido ditador chileno Augusto Pinochet, que, além de genocida e corrupto, também foi acusado de tráfico de drogas. A iniciativa partiu de ex-assessor especial do governo de Geraldo Alckmin e deputado estadual de primeiro mandato, eleito na onda bolsonarista, que participou da elaboração do plano de governo de Bolsonaro para o agronegócio, Frederico D'Ávila (PSL). A data do 10 de dezembro corresponde ao Dia Internacional dos Direitos Humanos.

21 de novembro: Diante da indignação generalizada, o presidente da ALESP, Caue Macris (PSDB), decide cancelar o evento de homenagem a Pinochet.

22 de novembro: Morre, de câncer, aos 75 anos, Henry Sobel, que representou a comunidade judaica no ato interreligioso na Catedral da Sé, em resposta à tortura e ao assassinato de Vladimir Herzog pela ditadura militar. O ato confrontou a versão oficial de suicídio no DOI-Codi de São Paulo. No início de 2019, ele visitara Jair Bolsonaro no Hospital Albert Einstein e afirmara que "Se depender da comunidade judaica, ele vencerá todos os pensamentos negativos."

2 de dezembro: Augusto Aras destitui Deborah Duprat do Conselho Nacional dos Direitos Humanos e se autonomeia no lugar, com a suplência de Aílton Benedito de Souza.

11 de dezembroA Justiça Federal rejeita a proposta do governo federal de transferência das ossadas de Perus, que estão sob a guarda do CAAF, para a Polícia Civil. Os estudos invocados pelo presidente da Cemdp, Marco Vinícius Pereira de Carvalho, para justificar a transferência jamais foram apresentados.


Este simples rol nada exaustivo (trata-se apenas do que consegui mais ou menos observar) não foi recebido com indiferença pela sociedade. Houve reações, claro. No campo das artes foram várias, incluindo a Mangueira, que venceu em 6 de março o Carnaval no Rio de Janeiro com enredo que homenageou a tradição da revolta: "Brasil, chegou a vez/ De ouvir as Marias, Mahins, Marielles, malês". carnavalesco Leandro Vieira. Na Academia também; pude ver mais eventos desse tipo nas Letras e na História, por exemplo, do que em áreas historicamente mais comprometidas com o autoritarismo, como o Direito. Em 30 de maio, a Comissão Especial sobre  Mortos e Desaparecidos Políticos, ainda sob a presidência de Eugênia Gonzaga, pôde entregar certidões de óbito retificadas com a expressão:
MORTE NÃO NATURAL, VIOLENTA, CAUSADA PELO ESTADO BRASILEIRO, NO CONTEXTO DA PERSEGUIÇÃO SISTÊMICA E GENERALIZADA A POPULAÇÃO IDENTIFICADA COMO OPOSITORA POLÍTICA AO REGIME DITATORIAL DE 1964 A 1985.
O Grupo de Justiça de Transição continuou a realizar seu trabalho (visitem o portal, consultem a linha de tempo e baixem os relatório dos Grupo; algumas ações, como a denúncia contra Audir Santos Maciel e Carlos Setembrino da Silveira em razão da morte de Jayme Amorim de Miranda, militante do PCB, ou contra Manoel dos Santos Pinheiro por genocídio contra o povo Krenak, ainda não foram incluídas na linha). 
Até mesmo o Judiciário proporcionou algumas notícias boas, como a condenação da FUNAI e da União Federal, em 30 de agosto, por causa dos crimes cometidos contra os povos Tenharim e Jihaui durante a abertura da Transamazônica. em ação proposta pelo Ministério Público Federal no Amazonas; ou a aceitação pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, em 14 de agosto, da denúncia contra Antônio Waneir Pinheiro de Lima por sequestro e estupro de Inês Etienne Romeu, a única sobrevivente da Casa da Morte em Petrópolis.

Nas passeatas e atos públicos de protesto contra o governo, questões de justiça de transição fizeram-se presentes. Por exemplo, no "Tsumani 13 de agosto" em São Paulo (também ocorreu em outras cidades), que fechou naquela data a Avenida Paulista e a Avenida Consolação no sentido centro, ao lado dos protestos contra as usurpações de direitos sociais promovidas pelo governo federal e seus aliados na legislatura e na imprensa (vejam abaixo a simpática caricatura na foto que fiz na ocasião),


havia também questões relativas à memória, como este cartaz com o nome de Fernando Santa Cruz:


E quem está a colocar essas questões de memória, verdade e justiça todas na mais explícita atualidade? Responde bem claro Amelinha Teles, militante dos Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos, em seminário sobre os 40 anos da lei de anistia que ajudamos a organizar em agosto: o próprio Bolsonaro, que repete as mentiras da ditadura militar.
Em 31 de março, ocorreu esta I Caminhada do Silêncio.


Houve diversos apoiadores para I Caminhada do Silêncio em prol das vítimas da violência de Estado, em São Paulo, inclusive o Ministério Público Federal. Quando cheguei, já ocorriam as atrações musicais, organizadas por Renato Braz, que precederam a caminhada propriamente dita. Vejam as atrações artísticas por meio desta ligação: https://www.youtube.com/watch?v=m44bJw9FVeQ&t=5699s
A primeira canção interpretada, por Renato Braz, foi "Coração civil", de Milton Nascimento e Fernando Brant, com os versos "Sem polícia/ Nem a milícia", que ficaram mais atuais. Ney Matogrosso voltou a interpretá-la no show que estreou em 2019, "Bloco na rua".
Muita gente se apresentou, mas ouçam Jean Garfunkel rimar Cecília Meireles com Marielle. Achei interessante, pois fiz uma nota sobre a execução de Marielle Franco com uma referência a essa poeta: https://opalcoeomundo.blogspot.com/2018/03/marielle-franco-e-memoria-das-execucoes.html
Curiosamente, o último número foi "Sentinela", de Milton Nascimento e Fernando Brant, gravada por Milton pela primeira vez em 1969 e, pela segunda vez, no álbum de mesmo título, com uma cantora agora bolsonarista.
Enquanto eu caminhava para o ato com a imagem de Olavo Hanssen, operário da indústria química e militante do PORT (Partido Operário Revolucionário Trotskista) torturado e morto depois de ter distribuído panfletos numa comemoração do Primeiro de Maio de 1970, um vendedor no parque perguntou-me de quem era a imagem. Respondi, e ele indagou quem eu queria para presidente. Uma pergunta aparentemente absurda, mas não em um contexto autoritário. É significativo que opor-se à tortura e às execuções extrajudiciais implique, hoje, como na ditadura, opor-se politicamente ao governo.
De 1970 para 2019 trata-se de um grande salto, mas há certa razão. Vejam como a questão continua atual, seja porque o atual presidente ordenou a celebração do golpe, que chamou depois de rememoração, seja porque divulgou infame vídeo negacionista: https://www.valor.com.br/politica/6190573/planalto-e-eduardo-bolsonaro-divulgam-video-que-celebra-golpe-de-64
No vídeo, pode-se ver Ângela Almeida, viúva de Luiz Eduardo Merlino, assassinado no DOI-Codi de São Paulo, falar da ação proposta pelos Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos no Supremo Tribunal Federal contra a comemoração, e que não logrou resultado favorável: https://youtu.be/m44bJw9FVeQ?t=5534
A legitimação desse grupo necessita do elogio à chacina e à tortura, condutas criminosas que eram instrumentos necessários à doutrina de segurança nacional da ditadura militar, e que continuam a acontecer sob a vista grossa do Estado brasileiro. Por isso, esse grupo que está no poder precisa evocar o período, porém tentando negar o caráter criminoso do regime.
Ao fazer esse recalque, não deixa de (re)politizar a memória da ditadura, o que gerou uma série de atos pelo país.
Nessa época, em que se podem ler na imprensa reportagens romantizando relações imaginárias entre torturador e vítima, é sempre bom relembrar os mortos e desaparecidos. Muitos caminharam com o retratos. No final da caminhada, eles foram deixados ao pé do Monumento em Homenagem aos Mortos e Desaparecidos Políticos, projeto de Ricardo Ohtake que o então prefeito Fernando Haddad inaugurou em 2014, quando a Comissão Nacional da Verdade ainda funcionava:


O terceiro e último volume da Comissão Nacional da Verdade (CNV), o que não estava ainda pronto (faltava diagramá-lo) quando o Relatório foi entregue à presidenta Dilma Rousseff em dezembro de 2014, é todo dedicado aos perfis dos mortos e desaparecidos políticos. Houve muita polêmica sobre os nomes que a CNV deixou de lado.


Esta foto, tirei-a durante as apresentações musicais e os discursos, antes da caminhada propriamente dita. No vídeo, vocês viram que as pessoas com os retratos sentaram-se mais à frente. No entanto, à direita, pode-se ver uma placa da Rua Marielle Franco - uma morta política que incomoda os bolsonaristas.


Ísis Dias de Oliveira, militante da Ação Libertadora Nacional (ALN) e desaparecida em 1971.


Edson Luiz Lima Souto, estudante secundarista morto em 1968 pela polícia do Rio de Janeiro.


Ruy Carlos Vieira Berbert, militante do Movimento de Libertação Popular (Molipo) e desaparecido em 1972.


Ana Maria Nacinovic Corrêa, militante da ALN, desaparecida em 1972.


Miguel Pereira dos Santos, militante no Partido Comunista do Brasil (PCdoB), desaparecido na Guerrilha do Araguaia em 1972.


Manoel Aleixo da Silva, militante do Partido Comunista Revolucionário, executado em 1973.


Presentes em grande número estavam os familiares dos desaparecidos da democracia, vítimas dos Crimes de Maio, da Chacina da Sé e de outros eventos criminosos:



A permanecer a atual orientação política, o número dessas vítimas só fará aumentar, bem como os assassinados no campo, camponeses e apoiadores, e nas florestas, como indígenas e ambientalistas. Por isso, 2020 tem que ser diferente.

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

30 dias de canções: Milton Nascimento e Fernando Brant desarquivando o Beco

30 dias de canções

Dia 4: Uma canção da memória reprimida

"Beco do Mota", de Milton Nascimento e Fernando Brant. Milton, este patrimônio vivo do país, a gravou no seu segundo disco no Brasil, e o terceiro de sua carreira. O segundo, Courage, gravou-o nos Estados Unidos com apoio de Eumir Deodato, quando as portas estavam fechadas para o jovem músico no Brasil.
O disco Milton Nascimento de 1969 era aberto com sua primeira gravação de "Sentinela" (no disco Sentinela, regravá-la-ia em ouras proporções, contando com o Coro de Beneditinos e Nana Caymmi), suficiente para provar que ele era um grande compositor, e que "Travessia", sucesso no II Festival Internacional da Canção, em 1967, não era um acidente de percurso.
Havia mais provas da excelência de Milton, evidentemente, e "Beco do Mota" era uma das canções novas. 
A música não atraiu a atenção da censura, leio no texto de Luiz Maciel no encarte do relançamento do disco, apesar do tema. Milton Nascimento e Fernando Brant falam da memória da antiga zona boêmia de Diamantina, próxima da igreja matriz e, por isso, arrasada no fim daquela década por iniciativa do arcebispo.
Milton, nesta apresentação em 2009, explicou para o público que o Beco do Mota "era o lugar onde viviam as senhoras de vida fácil, e dez metros do Beco do Mota tinha a porta da catedral de Diamantina" e contou que a interpretou para Juscelino Kubitschek, já cassado pela ditadura militar; JK entendeu, naturalmente, a canção e teria rido dizendo "Vocês são de morte, muito bem": https://www.youtube.com/watch?v=4vJzv32qMo8
JK seria morto pela ditadura (a despeito da Comissão Nacional da Verdade, que não investigou o crime, leiam o relatório do Grupo de Trabalho JK para Comissão da Verdade do Estado de São Paulo "Rubens Paiva": http://verdadeaberta.org/relatorio/tomo-iv/downloads/IV_Tomo_Relatorio-sobre-a-morte-de-juscelino-kubitschek.pdf). Milton, que teve nessa época sua fase mais engajada politicamente, teria diversos problemas, inclusive censura de canções inteiras.
A obra de Milton Nascimento apresenta várias exemplos dessa memória resistente, que toma como objeto a ser cantado o que outros quiseram reprimir, ou destruir pela segunda vez por meio do esquecimento. Neste caso, o Beco, tomado como espaço dos marginalizados - os "homens e mulheres na noite desse meu país".
Outro exemplo célebre da memória resistente de Milton Nascimento e Fernando Brant é "Saudades dos aviões da Panair" ou "Conversando no bar". Essa canção, a partir do episódio do fechamento forçado dessa empresa de aviação pela ditadura militar, faz uma bela evocação de outras memórias, inclusive da infância. Quase a escolhi para esta nota dos 30 dias de canções.
Trata-se mesmo de uma postura ética de Milton Nascimento, penso, que pode ser constatada tanto nas composições próprias (em relação à memória da luta dos negros no Brasil, o exemplo maior talvez seja a "Missa dos Quilombos", escrita com outros resistentes: Dom Pedro Casaldáliga e Pedro Tierra), quanto na gravação de cantigas da tradição oral e na escolha de parceiros como Clementina de Jesus.


Milton, como se sabe, foi classificado entre os "artistas contestadores" pelos próprios órgãos de vigilância e repressão da ditadura. Ao lado, pode-se ver um documento que o classifica assim, de 12 de julho de 1977, que achei no Arquivo Público do Estado de São Paulo.
A informação vinha da Polícia Militar de São Paulo e trata da censura a um espetáculo promovido pelo jornal Versus (periódico de esquerda, foi um dos mais combatidos pela ditadura) e da distribuição de exemplares do periódico nos arredores do Anhembi, onde as apresentações teriam ocorrido. Os outros artistas, também contestadores, eram Chico Buarque, Edu Lobo, MPB-4 e Bibi Ferreira.
Muitos anos depois, Milton, no belo disco que Leandro Braga dedicou à sua obra, Fé cegaregravou o "Beco do Mota" de forma serena, como lembrança distante; ouçam o que Leandro Braga inventa ao piano para encerrar liricamente a canção.
No entanto, a melhor interpretação, segundo Milton, é a de Selma Reis, grande cantora que morreu em dezembro de 2015 (meses depois de Fernando Brant, que faleceu em junho daquele ano). Eu a vi cantando ao vivo essa canção; ela o fez exatamente como nesta apresentação de 1990, que leva mais de seis minutos. Ela não estava preocupada em ser deglutida no fast food musical das rádios FM...
A tevê, no especial, cortou a introdução instrumental, trocando-a pelos comentários de Milton Nascimento sobre a cantora. Antes, mostrava-se Selma Reis interpretando "Meu veneno" com Milton ao violão, uma das parcerias do compositor com Ferreira Gullar, que ela havia gravado em um de seus primeiros discos, há muito fora de catálogo.
De "Beco do Mota", ela retirou a breve ladainha inicial da primeira gravação de Milton (e que ele mesmo dispensaria depois), mas o tempo largo adotado substituiu-a, penso, na evocação da religiosidade. Um tempo desses, que só pode ser encarado por cantores com uma técnica respiratória exemplar, é favorável também para a declamação e para os detalhes; ouçam a delicadeza dos agudos em "arquidiocese" e "noite"; a indignação com que ela diz da noite "colonial vazia".
O que ela faz com a estrutura da música parece-me atender com mais exatidão a letra de Fernando Brant do que o arranjo original. Ela acentua o contraste entre as estrofes que evocam "os homens e as mulheres na noite", mais lentas, e a que trata do fim do Beco: "Nesta praça não me esqueço"; "Acabaram com o beco/ Mas ninguém vai lá morar/ Cheio de lembranças vem o povo/ Do fundo escuro beco/ Nesta clara praça se dissolver". 
Com a intensidade da voz deste contralto, o final da música, uma gradação em que Diamantina, Minas Gerais e, por fim, o Brasil, são identificados ao Beco do Mota, é levado a proporções épicas. Na última vez, "Mota" fica à beira do grito (ela sempre fazia assim, não foi um acidente dessa apresentação), e "viva o meu país" é dito com uma indignação que cala qualquer ufanismo e joga na cara da plateia a denúncia.
No disco O preço de uma vida, foi cortada uma das repetições que ela fazia, e o arranjo datado atrapalha a interpretação; prefiro a regravação de Selma Reis no disco "Todo o sentimento".
Como a obsolescência programada da indústria cultural faz apagar a memória da música brasileira, lembro aqui dos dois melhores discos, para mim, da cantora: A minha homenagem ao Poeta da Voz, dedicado a Paulo César Pinheiro, em que ela vai da mandinga à canção romântica e ao samba (com os parceiros Robertinho Silva, Diogo Nogueira em música de João Nogueira, e Beth Carvalho em um dos maiores sucessos de Clara Nunes), e o disco que fez para Gonzaguinha (Achados e perdidos), em que a variedade vocal da cantora está à altura da riqueza da obra do compositor: paródia de opereta, canções românticas, canções sociais, samba, ritmos do Nordeste (com uma intensa gravação de "Galope"), ela podia cantar tudo, inclusive imitar a voz masculina na sátira social "A cidade contra o crime".

Dia 1: Um retrato à beira da razão, de Tom e Chico
Dia 2: Números do trabalho, não da riqueza
Dia 3: O céu, o mar, a umbanda

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Desarquivando o Brasil XXXI: mais do Cordão da Mentira

Na nota que escrevi às pressas para participar da blogagem coletiva, "Desarquivando o Brasil XXX: Comissão da Inverdade, Cordão da Mentira e os juristas", incluí um panfleto de 1979, apreendido pela polícia em São Paulo, da campanha pela Anistia.
No ano passado, usei esse panfleto numa atividade na disciplina Filosofia jurídica. O poeta, cientista político, diplomata e especialista em Milton Nascimento (entre outros talentos) Ricardo Rizzo, meu amigo, perguntou por que não lembrei de que o título vinha de canção de Milton e Ronaldo Bastos, "Menino", escrita em resposta ao assassinato do estudante Édson Luís pela polícia no Rio de Janeiro em 1968. "Quem cala sobre o teu corpo consente na tua morte", na voz do compositor.
Eu sempre tinha de lembrar da canção com os alunos, que em geral não tinham conhecimento nem interesse por música brasileira e não identificavam a referência, que continuava atual na época.
Nesse ano de 1979, Elis Regina interpetava a canção no espetáculo Saudades do Brasil, com arranjo de Cesar Camargo Mariano. Ela chegou a combiná-la com uma canção de Fátima Guedes, "Onze fitas". http://www.blogger.com/img/blank.gif
Elis lançou tanto Milton quanto Fátima Guedes. Aqui, se pode ouvir a compositora. A combinação que a poderosa cantora fez foi lançada em disco e pode ser ouvida nesta ligação, com a intuição da cantora em ver o liame entre os dois assassinatos, entre as duas violências.
Talvez algo de correlato estivesse presente no Cordão da Mentira; ou na carta que as Mães de Maio brasileiras escreveram para as Mães da Praça de Maio argentinas.



Ainda na concentração da passeata, podem-se ver duas formas de representação dos desaparecidos da ditadura: o cartaz com diversos rostos de desaparecidos, que pode ser visto também na nota anterior que fiz sobre o Cordão da Mentira, e as lindas efígies coloridas, que permitiam a visão dos dois lados. Os que sofreram a mesma violência na democracia estavam igualmente representados.
Os desaparecidos e mortos da ditadura foram homenageados também nas placas que foram afixadas em locais estratégicos. Mostrei algumas na nota anterior.



Ativistas dos direitos indígenas estavam presentes na manifestação - ao lado, camiseta com mensagem contra o genocídio dos índios Guaranis, em marcha judiciosa e executiva no Mato Grosso do Sul. Participaram do Cordão também os membros das bicicletadas, que por vezes caem vítimas do desastre urbanístico e administrativo que São Paulo continua a ser.



Escritores na passeata: Fabio Weintraub, em foto tirada ainda na concentração do evento, em frente ao Cemitério da Consolação. Logo abaixo, Julián Fuks na Rua Fortunato, com a camiseta azul dos 33 anos das Mães da Praça de Maio.





Na Rua Maria Antônia, vemos novamente a comissão de frente da passeata, composta pelas Mães de Maio. Desta vez deste ângulo, para se ver a mensagem da camiseta: "Um mundo melhor é possível: Quando o Estado não mais discriminar, não excluir o pobre e negros. Exigimos dignidade, igualdade, justiça e liberdade!".
A mensagem pressupõe outro valor: a diversidade, que se manifestou na passeata.

Ainda na mesma rua, de verde, Raphael Tsavkko, the angry Brazilian, jornalista que escreveu no seu blogue sobre o Cordão, incluindo fotos bem melhores do que as minhas e vídeos. Pode-se vê-lo com uma camiseta de apoio aos bascos.




Presente na manifestação, estavam setores da Academia. Os estudantes de Psicologia apareceram, sem divã, para afirmar que nem Freud entende a impunidade dos torturadores. De fato, o fundamento teórico deve ser outro, precisa ser buscado no lugar onde se encontram certas derivas de uma criminologia que se pretende crítica com a extrema direita menos disfarçada. Na foto seguinte, não conheço os outros, mas, no centro, com a camiseta branca inscrita com "Juicio y castigo", estava o mestre em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo Renan Quinalha, orientando de Deisy Ventura. Sua dissertação tinha como tema a justiça de transição.


Caminhando para o Minhocão, ainda passando pelo Largo de Santa Cecília. Apesar da faixa da Companhia de Teatro Kiwi sobre a impossibilidade da felicidade, creio que ela foi desmentida, pois a manifestação tinha um sentido de júbilo.



Em frente ao Teatro do Folias d'Arte, foi realizada nova pausa. Soltaram-se balões vermelhos, imagem simples de júbilo.




Na nota anterior, incluí foto de Lino Bocchini, jornalista da Falha de S.Paulo, censurado judicialmente pelo jornal quase homônimo. Ele escreveu também sobre o Cordão da Mentira. Agora, insiro outra foto. Na árvore em frente ao prédio da Folha de S.Paulo, vejam, que foi amarrada uma placa em homenagem às vítimas do urbanismo higienista de São Paulo. Essas placas foram ignoradas na modesta cobertura da passeata feito pelo Estado de S.Paulo, e na modestíssima pela Folha, e tal silêncio ecoa o silêncio dessas vítimas.

Na última foto,http://www.blogger.com/img/blank.gif vê-se o pouso final da passeata. É possível ver a Universidade Livre de Música, enquanto músicos sobre o caminhão de som reclamavam que se ensinasse música popular. Não fazia sentido a queixa (que tinha um fundo de intolerância, repetido em outra fala, contra a música "clássica", e desafinava a ideia de diversidade), pois lá também se ensina esse tipo de música. Ela não silencia: "Quem grita vive contigo".

P.S.: Contei, em outra nota, que o professor Ítalo Moriconi falou do manifestante no Rio de Janeiro que teve o braço quebrado pela polícia na recente manifestação contra a comemoração do golpe militar. Eis aqui a história dele.