A Comissão da Verdade do Estado de São Paulo "Rubens Paiva" divulgará seu relatório final no dia 12 de março de 2015, a partir das 14 horas, na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo.
Seu relatório estrutura-se de forma diferente do da Comissão Nacional da Verdade, que foi entregue em 10 de dezembro de 2014.
Ele possui 26 capítulos temáticos, e, com a longa introdução sobre as graves violações de direitos humanos, tem o mesmo número de divisões que os dois primeiros volumes da CNV. Mas os assuntos não coincidem: há questões específicas de São Paulo, como a Vala de Perus, no cemitério Dom Bosco, construído quando Paulo Maluf era prefeito de São Paulo pela Arena, onde foram escondidos corpos de desaparecidos políticos, de vítimas do esquadrão da morte e crianças mortos pelo surto de meningite cuja divulgação foi proibida pela censura. A Vala foi ignorada pela Nacional; aberta no governo de Erundina em 1990, os corpos estão quase todos sem identificação até hoje. Vejam a matéria do Marcelo Pellegrini sobre o "crime perfeito da ditadura", e as reclamações dos presos políticos em reportagem de Bruno Bocchini.
Temas como a perseguição aos negros e o dos lugares de memória também não receberam capítulos independentes na CNV, que teve como foco as graves violações de direitos humanos, que não incluíram, curiosamente, o crime de genocídio, tampouco o racismo.
Ademais, o Grupo de Trabalho Kubitschek, composto por pesquisadores da USP e da Universidade Mackenzie, concluiu que o presidente cassado foi realmente assassinado. A Comissão Municipal de São Paulo havia chegado a resultado parecido, mas não com o volume de pesquisa que agora ficará disponível ao público pela Comissão "Rubens Paiva". Outro grupo de pesquisadores fez um extenso relatório sobre as violações de direito no campo, que está entre os anexos.
A Comissão "Rubens Paiva" realizou uma pesquisa diferente, pois, fruto de um método diferente - as audiências públicas foram a base de seu trabalho - e de uma estrutura muito menor: sem apoio do Estado, a Comissão de São Paulo só passou a ter pesquisadores a partir de julho de 2014, afora os dois grupos de trabalho mencionados para temas específicos (eu mesmo só integrei a pequena equipe em agosto).
O relatório da Estadual também inclui perfis de mortos e de desaparecidos políticos, porém em número muito menor do que o da CNV, que abrange todo o país. Em compensação, ela apresenta os documentos pesquisados, o que a CNV não fez, e as transcrições das audiências públicas. Foram realizadas 156, e quase todas foram transcritas.
Diferentemente da CNV e de todas as outras Comissões, o relatório da Comissão "Rubens Paiva" está sendo editorado para a internet, e não apenas lançado no ar em um arquivo pdf gigantesco. Dessa forma, os vídeos também ficarão facilmente acessíveis. Ignoro qual será o endereço do relatório.
A entrega também será diferente do que ocorreu com o relatório da CNV, pois ela ocorrerá em uma sessão pública.
Trata-se de mais uma contribuição para as reivindicações de memória, de verdade e justiça no longo processo de justiça de transição no país. Carlos Fico, em mais de uma entrevista, destacou que as pesquisas regionais teriam muito a acrescentar ao que se sabe da ditadura militar. Lembro aqui do relatório da Comissão da Verdade do Paraná, "Teresa Urban", em dois volumes; o segundo, com os documentos, não está disponível ainda.
O relatório da Comissão da Verdade da Bahia é muito menos abrangente do que o do Paraná, e não é tão bem escrito, porém apresenta uma pesquisa interessante sobre a indústria cultural, que São Paulo não fez, tampouco a Nacional.
A Comissão da Verdade do Rio somente apresentou um relatório parcial, que enuncia as pesquisas. Esperemos o final, bem como os documentos finais de outras comissões, inclusive das que foram formadas pelas instituições de ensino, que certamente trarão revelações e novos nomes de vítimas e agentes da repressão, sendo tão grande o número de atingidos ainda anônimos da ditadura militar.
P.S.: O relatório está nesta ligação: http://verdadeaberta.org/
O palco e o mundo
Eu, Pádua Fernandes, dei o título de meu primeiro livro a este blogue porque bem representa os temas sobre que pretendo escrever: assuntos da ordem do palco e da ordem do mundo, bem como aqueles que abrem as fronteiras. Como escreveu Murilo Mendes, de um lado temos "as ruas gritando de luzes e movimentos" e, de outro, "as colunas da ordem e da desordem".
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